No metrô de São Paulo existe uma televisão “interna”, chamada TV Minuto, que passa programetes de 15 ou 30 segundos sobre assuntos gerais como: lugares para visitar na cidade, monumentos, eventos culturais e notícias. Contudo, outro dia passou algo bem curioso, algumas imagens e do nada uma citação, não só uma frase célebre, mas o primeiro excerto de uma obra da literatura brasileira – prosa ou poética. Achei aquela uma sacada muito boa, afinal, quantas vezes somos pegos de surpresa por uma frase dita aos sete ventos sem que o emissor saiba da sua origem?

Como todo bom leitor, também tenho citações favoritas anotadas em um caderno, uma coleção intensa de paragráfos e diálogos que me marcaram de muitas formas, entre os favoritos tenho “Há ausências que representam um verdadeiro triunfo”, de O Jogo da Amarelinha, “A gente nunca devia contar nada a ninguém. Mal acaba de contar, a gente começa a sentir saudade de todo mundo”, de O Apanhador no Campo de Centeio, e, claro, “Mas quem é que sabe como? Viver… o senhor já sabe: viver é etcétera…”, de Grande Sertão: Veredas e de onde eu tirei o sobrenickname virtual Etcétera. Fora de contexto para quem não conhece as obras deve parecer simples frases de efeito, sentenças poéticas com pouco significado, mas que são queridas desde a primeira leitura e até hoje lembro delas com o mesmo carinho que lembro das obras. Algumas citações tornaram-se isoladas e muitas pessoas conhecem sem ao menos saber de onde vem como “Ao vencedor, as batatas” ou “Os fins justificam os meios”, essa última nem ao menos existe realmente, é uma síntese de pensamento da obra de Maquíavel. Não poderia deixar de lado Clarice Lispector que constantemente é citada em Twitter, Facebook e outras redes sociais e nem sempre a citação é dela mesma (e nem precisa mais falar do tal “Elementar, meu caro Watson”). Outra coisa que virou mania nas mídias sociais é frases que surgiram como erros de português e que tornaram-se, por algum tempo, uma referência pop como aquele episódio do “Puta Falta de Sacanagem”, da fã de Restart, no começo foi por chacote depois virou automático soltar a sentença quando se foi passado para trás. A nova mania é “Todos chora” e “Fica, vai ter bolo”. Aliás, existe um nome específico para isso: meme.

Uma obra que não consigo exprimir em simples frases é O Velho e o Mar, de Ernest Hemingway. Toda sua história emociona e deixa marcas invisíveis em seus leitores, toda a trajetória do velho Santiago é um dos grandes marcos da literatura mundial (mesmo eu sendo suspeito de falar de Hemingway) e destacar trechos está fora de cogitação.

Por outro lado quando resenhei o livro Coração tão branco, de Javier Marías, aqui para o Meia Palavra, não mencionei sobre como o primeiro parágrafo do livro me tomou de maneira muito forte, muito mesmo, como não sentia há algum tempo. Antes desse exemplar, apenas Germinal, de Émile Zole, e A Invenção de Morel, de Adolfo Bioy Casares, me espantaram, cativaram, deixaram-me sem reação, logo nas primeiras linhas. Cada um desses paragráfos de abertura tem a sua particularidade, enquanto Marías choca com um suícidio descrito de maneira muito bela – detalhando cada parte do corpo da personagem até o estouro de polvora direto no peito -, Adolfo Bioy Casares em uma linha (“Hoje, nesta ilha, aconteceu um milagre: o verão se adiantou.”) já envolve o leitor para o suspense que irá acompanhar o personagem principal e Émile Zole descreve uma paisagem sem mácula que servirá de contraponto para todo espectro “industrial”, revoluções do mundo moderno: questões trabalhistas, as visões políticas que afetam o mundo através dos marxistas e dos anarquistas.

E os títulos? Sempre dizem para não julgar um livro pela capa, mas também não devemos julgá-los pelos seus títulos e muitos deles acabam tornando-se, no meu caso, uma das partes mais compensadoras para gostar de uma obra. Foi assim quando decidi conhecer André Sant’Anna e escolhi pelo título (e pela indicação do Antônio Xerxenesky): O paraíso é bem bacana. Pode parecer simplista só que esse título palpitou na minha mente tanto quanto suas passagens memoráveis, assim como Os detetives selvagens, de Roberto Bolaño, Na Colônia Penal, de Franz Kafka, Suicidios Exemplares, de Enrique Vila-Matas, Areia nos Dentes, de Antônio Xerxenesky e os simples Só Garotos, de Patti Smith, e Uma certa paz, de Amós Oz. Reza a lenda que João Ubaldo Ribeiro começa a escrever seus livros logo após pensar num título. E nem preciso dizer que alguns livros não tem uma explicação direta para seus títulos.

Como um bom citador, sempre penso na frase que me marcou no livro (ou mesmo seu título) para começar a escrever uma resenha e, um pouco diferente do Ubaldão, só começo a escrever um texto autoral (crônica ou conto) quando uma frase não para de me incomodar, como aquela música chiclete!, que para tirá-la da cabeça só cantando inteira dentro do banheiro para ninguém saber que você anda ouvindo certas coisas.