É fato consumado nos contos de Julio Cortázar o estilo provocador empregado. Por mais que existam invenções linguistícas e o famoso estilo fantástico, os contos que compõem Octaedro, lançado agora em versão de bolso, servem como instigador para o leitor tentar desvendar seus significados. Não somente os existenciais, mas se a presença de espírito e de tempo se chocam para um significado além da palavra. Devemos lembrar que o escritor não deixa dúvidas sobre suas intenções e histórias e, contudo, ainda fomenta diversas questões de como o leitor deve encarar a solidão, a saudade, as perdas e a vida.

As surpresas de cada história e suas conectividades criam jogos de ansiedade em cada leitor: qual rumo será tomado no próximo parágrafo? Há algo mais ou entendi completamente? O imaginário se choca com o realismo dos sentimentos empregados pelo escritor argentino falecido nos anos de 1980. Peguemos Lilian Chorando como exemplo, o narrador apresenta como seria o antes e depois de cada personagem após sua morte para em seguida falar do presente que é tão poético quanto o imaginário. Devaneando como seria o seu próprio leito de morte (por estar com uma doença terminal) e o sofrimento de cada personagem que passou por sua vida tentando encarnar dentro dessas pessoas nos instantes finais que ainda consegue respirar.

Nessa coletânea de oito contos, o irreal, ou fantástico, de Cortázar habita na transformação do abstrato em concreto através dos anseios de cada personagem. O tal Octaedro sugerido pelo escritor é uma brincadeira sobre os ângulos de uma mesma situação nas oito narrativas. Representando os medos de qualquer pessoa dentro de uma rotina ordinária totalmente realista. No conto Verão, as pequenas ligações estão no subconsciente que acredita, por exemplo, em ouvir vozes na calada da noite ou mesmo enxergar vultos passarem à porta enquanto o sono não vem, algo impalpável causadora da impotência de seus personagens com o desconhecido.

O cotidiano é visto quase como que pelos olhos de uma criança e a percepção de um adulto em Manuscrito achado num bolso, o escritor explora os pequenos detalhes de se ver refletido em uma janela de metrô, uma brincadeira com trocas e interpretações de imagens, durante uma simples viagem. As reflexões que brotam entre uma estação e outra junto com os personagens que revivem memórias longinquamente tateáveis, referenciado pela arte.

Em Ai, mas onde, como a narrativa de duas vozes em uma única é o grande atrativo, como se uma homenagem a morte do conto ou uma negação ao formato. A citação de Magritte denuncia essa intenção logo ao começo dessa história ambivalente e fadada ao fim prematuro. Já no conto As fases de Severo vemos quase uma repetição temática do conto que abre o livro, no entanto, temos diversas visões sobre um mesmo assunto: a doença. Essa enfermidade é tomada com um tema principal totalmente dramático que ruma para situações cheias de humor.

Quebrando a alienidade de textos e do formato de conto, Cortázar entrega aos leitores desafios a mente e a leitura – longe do labirinto habitual, mas em seu ápice criativo como contista e instigador da palavra no pequeno universo que existe em cada um de seus personagens, exploradores do infinito que é ser humano.