Recentemente houve uma explosão de publicações de autores de língua espanhola, tanto europeus quanto latino-americanos. O começo dessa onda certamente se deu graças à nomes como Roberto Bolaño, Javier Cercas e Enrique Vila-Matas. E são esses autores, ao menos parcialmente, os culpados pela onda metaliterária que inunda a atual literatura ocidental – em especial se pensamos no que é lido e estudado no Brasil.São bons autores (apesar de suas consequências nefastas), mas não são os únicos autores que escrevem em castelhano e que pertencem à esta leva (depois do realismo mágico e antes das gerações mais atuais, à qual pertence, por exemplo, Zambra). Outros – que, na minha opinião, são tão bons quanto, se não melhores – também existem e, infelizmente, acabam recebendo muito menos atenção por essas bandas. Dois, em especial, que conheço um tanto melhor e que me são mais caros: Rodrigo Fresán e Mario Bellatin.

De Fresán o público de língua portuguesa só teve acesso à Jardins de Kesington, lançado e meio negligenciado pela Conrad. De Bellatin, porém, mais coisas foram lançadas – apesar de eu não ter certeza de quais, já que só o li no original. Recentemente, aliás, li seu Damas chinas – e pude lembrar o porque ele me agrada tanto.

Uma das coisas é a fuga da metaliteratura. Não que eu não goste disso, mas parece que desde Bolaño e Vila-Matas todo escritor de língua espanhola tem de escrever sobre escritores ou leitores (mesmo que o chileno e o catalão não o façam o tempo todo). Existe uma grande parcela da obra de Bellatin que ainda não li, mas não me lembro de escritores em seus livros. Não me lembro, na verdade, nem de citações literárias demasiado claras.

Eis o caso em Damas chinas. A história é dupla, focando-se em um ginecologista que sente um desejo irrefreável de visitar bordeis depois de sair do consultório e na história bizarra que um garoto cabeçudo, filho de uma das pacientes, lhe conta na sala de espera.

É claro que essa história pode suscitar inúmeras reflexões a respeito da literatura, de seu estado no mundo contemporâneo e por aí afora. Mas, do mesmo modo, pode-se pensar em inúmeras outras coisas: nas relações de gênero, na constituição moral da sociedade tradicional ou, pura e simplesmente, na narrativa um tanto esquisita que Bellatin apresenta.

Tudo é contado do ponto de vista do médico, que, tem uma relação um tanto conturbada com a esposa e os filhos. Mesmo a narrativa do menino passa pelo filtro desse ginecologista sem nome e de poucos escrúpulos. O que deve, certamente, servir como uma espécie de alerta para o leitor, que talvez não deva acreditar em tudo o que está lendo (mesmo que, no fim das contas, tudo se trate de ficção).

Não acho que seja o melhor dos livros de Bellatin – existe alguns que ainda nem li, mas que minha esperança é de que sejam ainda melhores. Mas é um livro curto, simples e que já mostra algumas das principais características do autor de Perros heroes. Uma boa porta de entrada para a literatura do fundador da “Escuela Dinámica de Escritores” – e que, creio, deveria entrar nas listas de coisas a serem traduzidas por aqui.