Vampiros sempre foram criaturas que despertaram um grande interesse (ou, no mínimo, curiosidade) entre nós. Representados, sobretudo, através da literatura e do cinema, a temática vampiresca retornou de forma intensa nesta década – reforçando a idéia de que nenhum mito ou lenda caem em eterno esquecimento. E foi justamente o que Sarah Jane Stratford resgatou, ao publicar seu primeiro livro “A Guardiã da Meia-Noite”, retomando a essência destes personagens da noite.

Mestre em História Medieval, a autora uniu útil ao agradável: seu conhecimento acadêmico com sua paixão em contar histórias. O enredo possui um contexto histórico embasado – passando-se durante meses antecedentes à Segunda Guerra Mundial, o qual os vampiros do Tribunal de Londres buscam interferir. Embora a história possua certos mistérios em torno da real missão do grupo, o que acaba até confundindo de início, se prender à narrativa é fatal. A protagonista, Brigit, é uma vampira milenar que não se conforma com as atrocidades cometidas pelos nazistas e tem uma missão especial a ser cumprida: ser guardiã de duas crianças que lhe foram confiadas.

Mas, ela não está desamparada: além dos companheiros do Tribunal, ela ultrapassa a barreira do tempo e espaço para manter contato com Eamon, seu amado, que teve que deixar para poder levar adiante o plano contra a suástica.

Mas o que torna o livro ainda mais peculiar, é o modo como a autora e explora a mente de Brigit: a bela vampira, para o leitor, torna-se uma janela entre o mundo dos seres humanos e dos mortos, levando a reflexões em meio à época mais desumana da história.
Suas personagens têm fortes características, enriquecendo ainda mais a narrativa que é deliciosa de ler. Com grande sensualidade em torno das mais clássicas lendas sobre vampiros, Stratford encanta em sua estreia.

O vampiro de Sarah

Diante da flexibilidade que os autores possuem para manipular os personagens – até mesmo os mitológicos -, cabem algumas ressalvas a respeito do vampiro, na concepção de Sarah Jane Stratford. Algumas coisas não mudam! O instinto aguçado e a sedução fazem parte de todo o universo vampiresco. Mas, antes de adquirirem tais habilidades, eles devem renascer. E para que o ritual seja completo, a nova criatura passa por um teste de dificuldade – representado por um túmulo: o corpo morto é enterrado, e a prova da força do novo vampiro dá-se quando ele consegue sair da vala. A renascença, assim, torna-se um triunfo por meio do rito de passagem para a nova vida (ou sobrevida).

Do mesmo modo que um recém-nascido recebe um nome da mãe, o novo vampiro também deve ser nomeado. A escolha do nome representa a ruptura com a vida humana, e comumente não é imediata à transformação. Mais que isso, significa deixar de lado os vínculos com as pessoas, sobretudo a família, de modo que somente restem as lembranças, caso seja necessário retornar aos dias de mortal.

Consequentemente, a transformação de um vampiro acarreta na busca pela sobrevivência. Como Sarah descreve, por meio de sua fabulosa protagonista, um demônio divide o espaço de um corpo humano, com a existência de Brigit. Sua própria existência, assim, é uma ideia, pois se alterna entre a manifestação do demônio, que possibilita a alimentação – obviamente, através de sangue humano. E cada vampiro possui um dom presenteado por este demônio.

Mas, o diferencial de Stratford não é enfatizar as proezas dos dons dos vampiros – velocidade, força ou qualquer outro poder sobre-humano. A nova forma de existência possibilita uma nova visão, afastada do mundo dos seres humanos, mas ainda inserido no mesmo. As fraquezas e medo de ambas as partes são exploradas, e dentro do contexto de pré-guerra, isso se torna mais evidente, pois a missão do Tribunal passa a ser secundária, diante das reflexões pessoais de cada personagem – que, por mais que neguem, ainda têm um pouco de humano dentro de si.

Sobre a autora: Elis é estudante de Jornalismo e pode ser encontrada como Brigit no Fórum Meia Palavra. Além da literatura, sua outra paixão é o cinema.

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