O crime organizado é algo quase sempre fascinante- e ao mesmo tempo repulsivo. O fato é facilmente perceptível pela quantidade de filmes e livros a respeito das máfias, especialmente as italianas.

Existem, porém, outras organizações criminosas ainda mais poderosas e, ao meu ver, interessantes. A principal delas talvez seja a máfia Russa, ou melhor, as máfias Russas, com seu complexo sistema de castas e de famílias- separadas, na verdade, por nacionalidade e por estritos códigos de ética e de comportamento.

Nicolai Lílin, siberiano moldavo, nasceu em 1980 e cresceu em meio a uma comunidade de criminosos siberianos exilados durante o período da URSS. Assim como muitas comunidades criminais, os urcas foram transportados da Sibéria para a região do rio Dniestra- a Transinístria, ainda hoje palco de disputas militares entre a Rússia e a Moldávia.

‘Educação Siberiana’, além do nome de seu livro, é o modo como eram conhecidos os menores pertencentes à comunidade siberiana de criminosos. Lílin hoje vive na Itália, onde o livro foi lançado inicialmente, e abandonou a carreira de crimes. Recorda, porém, de modo bastante vívido sua infância e adolescência no mundo do crime- e a derrocada deste.

Talvez se deva ao autor não escrever em sua língua nativa ou à tradução, mas não se pode dizer que o livro seja bem escrito. Tampouco é um grande mérito literário. Mas é interessante como testemunho- quiçá por vezes exagerado e fantasioso- de um tempo que morreu para não mais voltar, de um tempo em que criminosos possuíam um código de honra que, muitas vezes, os tornava melhores do que seus adversários- que nunca foram as pessoas comuns e honestas mas, segundo Lílin, o governo e toda a forma de poder e opressão.

Outro aspecto bastante interessante (e que, confesso, foi uma das coisas que me atraiu no livro quando o vi pela primeira vez)- mas infelizmente pouco explorado- da tradição criminal Russa são as famosas tatuagens, que Nicolai afirma terem sido criadas pelos seus compatriotas e depois copiadas pelas outras facções. Elas são símbolos de poder, mas também contam a vida da pessoa, a quem souber lê-las.

Inclusive existem algumas ilustrações no livro, que nada mais são que desenho que Lílin fez para que fossem tatuados depois- ele é tatuador, tendo começado na prisão.

Enfim, não existe nada de espetacular aqui. O assunto é interessante e existe potencial- mas o moldavo-siberiano ainda é apenas uma promessa, como escritor. Ele prepara seu segundo livro, sobre sua experiência na Tchechênia, onde foi forçado a lutar pelo lado Russo. Espero que a promessa se cumpra- porque se um terço do que ele narra em ‘Educação Siberiana’ for verdade, ele sem dúvida tem muito para contar.

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