Entrei em contato com a obra de Lewis Carroll, mais precisamente com Alice no País das Maravilhas, através da versão em animação da Disney, quando criança. Anos depois, ganhei o livro e me tornei mais uma das fãs dessa narrativa tão cheia de divagações, questionamentos e personagens diferentes. A curiosidade me levou a também buscar autores, artistas e músicos que foram inspirados por Carroll, além de outras adaptações para o teatro, games e cinema. Dessa forma, quando me deparei com o livro de Alberto Manguel intitulado À mesa com o Chapeleiro Maluco, o mínimo que eu senti foi uma vontade de reencontro com o País das Maravilhas, dessa vez, seguindo a proposta de Manguel, que era uma análise na forma de ensaios, em que o autor depararia atitudes de personagens de Alice com comportamentos da sociedade atual.

Sentados à mesa para o chá das cinco, Manguel compara, por exemplo, as atitudes de egoísmo do Chapeleiro Maluco, que insistia em trocar de lugar para se beneficiar, pouco se importando com os outros. A mesma atitude se revela em muitas pessoas da realidade. Além disso, o autor mostra as preferências e mudanças sociais que vêm acontecendo, que consistem, por exemplo, na velocidade de informação ao invés de qualidade, na exaltação da publicidade e no valor mercadológico acima do valor estético e artístico das obras de arte.

Nesse início de livro, senti que Manguel tinha um grande potencial de argumentação e criatividade, no entanto, prevalecia a minha impressão de que ele estava falando “mais do mesmo”. Digo, o autor apresentava suas teorias de forma consistente e interessante, mas a informação passada não era exatamente uma novidade. Mas é importante ressaltar que, como disse anteriormente, essa impressão prevaleceu em mim somente no início do livro. No decorrer dos ensaios, Manguel consegue expor seus ideais de forma cativante e envolvente. O autor, que no início se prende somente à loucura do País das Maravilhas como ferramenta de comparação para nossa sociedade, acaba por desenvolver um trabalho que levanta outros níveis de loucura na literatura e história mundial, além de expor a importante e fundamental relação entre o leitor e a leitura, e as primordiais ferramentas e recursos de um livro, desde o ponto até a estruturação de uma página.

O texto que melhor define  À mesa com o Chapeleiro Maluco é o intitulado “Notas para a definição do leitor ideal”, em que o autor explora a versatilidade e diferentes tipos de obra para diferentes tipos de leitor. Em um texto simples e rápido, Alberto Manguel desenvolve o que é basico para o entendimento de seus ensaios: Não um leitor ideal, talvez, mas sim um leitor suficientemente bom. Outro texto muito interessante e que merece destaque é o “Como Pinóquio aprendeu a ler”, em que o autor fala sobre o sistema de educação, comparando-o aos personagens que aconselham Pinoquio, e, além disso, questiona o leitor sobre o que realmente é “ser um menino de verdade”  para o boneco de madeira, e o que é a leitura que ele precisa aprender para pensar.

Sendo assim, À mesa com o Chapeleiro Maluco é muito mais do que o apontamento da loucura, é um livro sobre leitores, sobre gente que se inspira e recria universos através da literatura (assim como Alice fez com sua imaginação ao ingressar no País das Maravilhas) e sobre a busca da cultura e comportamento em uma sociedade movida a regras e condutas que muitas vezes não fazem sentido. Alberto Manguel contesta e instiga o leitor a procurar pela criatividade e fantasia, ao invés de receber respostas automáticas.

Saiba mais sobre essa e outras obras no site da Companhia das Letras

Título Original: Nuevo elogio de la Locura

Valor: R$50,00

Páginas: 248

Tradução: Josely Vianna Baptista

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