(Emma Stone, piscina e livro)

Todo final de ano pipocam listas e mais listas de melhores do ano, mais vendidos e mais recomendados. No Meia Palavra, criamos uma lista de melhor leitura do ano com jornalistas, editores, blogueiros, colaboradores, escritores e tradutores (tentei chamar a Emma Stone [foto], mas ela não responde os meus e-mails) convidados e com os membros da nossa equipe. Para criar uma lista mais democrática, a única regra é: não é necessário ser um livro lançado no ano vigente. Esse post será dividido em três partes e a primeira você confere agora! Boas festas e não esqueça da sua toalha!

Antônio Xerxenesky (escritor): Diário da Queda (Michel Laub)

Li muita coisa boa lançada em 2011, obras que ainda continuam ardendo em minha memória, como Retrato de um viciado quando jovem, livro de memórias de Bill Clegg, Guerra aérea e literatura, ensaios e conferências de W.G. Sebald, Amor e obstáculos, livro de contos do bósnio Aleksandar Hemon. Mas o que realmente me pegou de surpresa foi Diário da queda, de Michel Laub, no qual o autor finalmente alcançou o ponto mais alto do estilo que vinha desenvolvendo ao longo de sua carreira. Um dos melhores romances brasileiros dos últimos anos, e dizer que foi a melhor coisa que li em 2011 não é condescendência com a literatura brasileira. Diário da queda é grande literatura e ponto.

Jório Dauster (tradutor):  Liberdade (Jonathan Franzen)

Num ano em que li pouco porque traduzi três livros do Philip Roth, o ponto alto foi Freedom, de Jonathan Franzen (recentemente publicado pela Companhia das Letras em tradução de Sergio Flaksman). Uma família de classe média, de inclinações liberais, serve para compor um rico painel da sociedade americana ao longo de várias décadas, mas também representa uma reflexão por vezes tragicômica sobre o que significa atingir a meia-idade. Acho que Freedom ganhou lugar naquela famosa parada das “great American novels”.

Bráulio Tavares (tradutor e escritor): A Estrada (Cormac MacCarthy)

Uma história pós-apocalipse onde temos a sensação, cada vez mais rara na literatura, de que qualquer coisa pode acontecer (e coisas que nunca imaginei acontecem). Personagens que somos forçados a deduzir pela ação e pelos diálogos telegráficos, o que os enriquece. Uma experiência-limite num estilo reduzido ao osso, ao essencial. Uma ficção científica adulta e premonitória.

Rafael Bán Jacobsen (escritor): O homem despedaçado (Gustavo Melo Czekster)

Difícil apontar o melhor livro lido em um ano de muitas leituras fabulosas. Uma das obras que me impactou profundamente em 2011 foi O homem despedaçado, de Gustavo Melo Czekster. Os contos reunidos nesse volume são um emaranhado de temas e influxos que passam pela matemática, pela ciência, pela filosofia, por mitologias orientais e ocidentais, tudo isso urdido com habilidade narrativa, competência de linguagem e profundidade na abordagem das questões humanas. Em seus textos, o autor orquestra real e irreal, histórico e lendário, corriqueiro e fantástico, trágico e cômico, entre outras dualidades, em um jogo de ressonâncias e espelhamentos que faz com que cada conto adquira proporções inesperadas, universais.

Diego Sartorato (jornalista): Extremamente alto & incrivelmente perto (Jonathan Safran Foer)

O lançamento é antigo (2005), mas tem sua relevância porque tem adaptação cinematográfica a ser lançada no ano que vem. A segunda obra de Jonathan Safran Foer é, na verdade, extremamente inteligente e incrivelmente triste: um garoto de nove anos (que pensa e age como uma versão infantilizada do jornalista-judeu-novaiorquino Foer, de 28) busca por pistas sobre a vida do seu pai, que morreu dois anos antes no atentado contra o World Trade Center; ao mesmo tempo, cartas antigas narram o relacionamento de sua avó e seu avô na Alemanha em guerra. Poderia ser insuportavelmente piegas. E é, até certo ponto. Mas o talento de Foer para os silogismos ao limite do absurdo, a narrativa fluente e os saltos temporais que marcam o estilo do autor desde “Tudo se Ilumina (que também virou filme, estrelado por Elijah Wood) fazem de EA&IP uma leitura fascinante. Um pedaço de ficção que, certamente, cumpre o papel de vinte historiadores no que diz respeito a marcar o impacto cultural do 11/09.

Benjamin Moser (Escritor): Livros de Edith Wharton

A maior descoberta literária para mim do ano foi uma coisa que, na verdade, deveria ter descoberto há anos. Edith Wharton é uma das romancistas clássicas nossas (dos Estados Unidos). Escreveu, mais que nada, sobre a alta sociedade de Nova York nos anos em que a nova burguesia estava se erguendo – no final do século 19 e o início do século vinte – e, como ela era expatriada na França durante a segunda metade de sua vida, sobre o americano na Europa.  É o mesmo território mais ou menos que seu amigo e rival Henry James, mas Edith Wharton tem uma leveza, uma graça, uma maldade, e uma visão aterrizadora das paixões humanas que raramente encontrei em outro autor. Seus livros são viciantes e li um atrás outro. Comprei mais alguns para o Natal e vou ficar com ela durante o feriado, não vejo a hora! Pelo que vejo, ela é pouco traduzida no Brasil. Um rápido Google revela que A era da inocência é a mais comum. Alguém (quem sabe minha própria editora, Cosac Naify!) deveria reeditá-la já.

Caetano Galindo (Tradutor): Petersburgo (Andrei Biéli)

Bom, como eu sou meio lerdo mesmo, a minha melhor leitura de 2011 foi Petersburgo, de Andrei Biéli, publicado em 1913. Nabokov colocava o livro entre os três maiores do século XX, junto de Kafka e Joyce. E, meu povo, não é exagero nenhum. Eu, que nunca fui muito de Kafka (porque eu sou lerdo…?), na verdade botei o bichinho bem lá no alto, do lado do Ulysses. Aliás, chega a ser impressionante a “sintonia” entre a experiência de Biéli e a de Joyce, ainda mais se a gente leva em conta que o Ulysses, em 1913, ainda era pouco mais que o esboço de um conto na cabeça de Joyce. O livro é meio surreal, profundamente político-alegórico (e eu tendo a odiar livros político-alegóricos), muuuito inventivo e insanamente russo. A melhor descoberta desde Margarida e o Mestre, outro livro incrível que na minha memória ficou até menorzinho agora. Li na edição Penguin, mas existe uma tradução brasileira, pela Ars Poetica. Parabéns pra eles, aliás.

DW Ribatski (Quadrinista): KA (Roberto Calasso)

Este livro eu não li inteiro (quem sabe um dia). Mas foi inspirador porque é uma remontagem da mitologia indiana, porém não “traduzida” para uma linguagem mais contemporânea, e sim colocada em seu formato quase abstrato e etéreo original. Isso tem muito a ver com minhas pesquisas. A sociedade contemporânea tem uma chata pretensão de achar que entende e domina o mundo. Por isso achei essa proposta ousada da parte do autor. Uma ideia do livro: Nas palavras de um antigo texto indiano, “o mundo é como a impressão que deixa uma história contada”.

Beth Goulart (Atriz): A eternidade e o desejo (Inês Pedrosa)

A minha escolha vai para A eternidade e o desejo, de Inês Pedrosa, uma escritora portuguesa talentosíssima que mistura neste romance sermões de Padre Antonio Vieira, uma turista portuguesa cega refazendo numa excursão os caminhos dele na Bahia, seu guia apaixonado e um baiano arretado que modificou o destino dela por uma fatalidade. Vale a pena acompanhar a beleza da escrita de Inês que consegue dar voz a cada um desses olhares e analisar com sua prosa poética a relação entre Brasil e Portugal.

Carol Bensimon (Escritora): 1919 (John dos Passos)

Não me lembro exatamente como cheguei a este livro. Mas acho que, quando o comprei num sebo, eu já tinha uma leve suspeita de que livros escritos no Entre-Guerras me atraíam demais. Algo a ver com a linguagem e com o espírito da época. Com John dos Passos não foi diferente. O painel que ele cria é incrível, gosto até dos experimentalismos, trechos de canções de guerra misturado a notíciais de jornais, e só o último capítulo, sobre um soldado desconhecido, já valeria toda a obra. Isso sem contar os trechos sobre Woodrow Wilson e Henry Ford. 1919 é o segundo volume da trilogia U.S.A. Pois é, ingenuamente comecei pelo segundo. Depois dele, no entanto, comprei a trilogia inteira, em inglês.

Samir Mesquita (Escritor): O homem sem qualidades (Robert Musil)

Um livro que certamente está na minha leitura do ano e, não dificilmente, entrará para uma das leituras da minha vida é o livro O homem sem qualidades, de Robert Musil (Ed. Dom Quixote, 2011 – tradução de João Barrento). Digo isso porque, composta de três volumes e quase três mil páginas, ainda não terminei de ler e sei que levarei anos para absorver apenas parte do tanto que ali está dito. Obra-prima de Musil (um dos nomes do “quarteto revolucionário” na prosa das primeiras décadas do século XX – Proust, Joyce, Kafka e Musil), este livro nos conta a história de Ulrich, mas na verdade é uma profunda investigação da alma de todos nós.