Ou quase.

Passeando pelos blogs literários esses dias, cheguei até a Biblioteca de Raquel com um post muito interessante sobre os novos livros curtos e sobre o famoso “fingir que leu” catataus ou livros famosos. É divertido pensar porque muitas pessoas podem chegar a querer ler um determinado clássico: passam pela livraria, olham as novidades, nada os agrada a não ser aquela nova edição de um livro famoso – não um best-seller de menos de duas décadas – e acabam comprando o clássico para entender o porquê de tantas pessoas o indicarem. Com o tempo desistem de tentar se aventurar na leitura dele e quando alguém chega em suas casas pedindo uma opinião, acabam falando algo bom ou ruim, só que não entregam a não-leitura. Há casos em que o fingidor nunca teve o livro, contudo diz que leu ao ser questionado por alguém curioso pela leitura.Vamos por partes, não é tão fácil descobrir um fingidor. Mas podemos arriscar umas pistas: à priori, quando questionado, esse tipo litero-social não saberá detalhes da história. No entanto, conheço muitas pessoas, inclusive resenhistas, que não lembram de grande parte do que leem – sobretudo se for “mais um livro”. Creio que se um romance, novela ou coletânea não absorve o leitor para si acaba se perdendo nalgum canto do cérebro que é pouco acessado. Ou seja, no lugar de descobrir um verdadeiro fingidor, talvez apenas um esquecido tenha sido encontrado. Não só de citações vive um grande leitor. Para se aprofundar em uma obra requer tempo, muito tempo e muitos querem apenas encontrar um passatempo nas letras.

Sei que muitos questionam: qual a razão para tal falsário agir entre nós? Formular uma defesa para esses criminosos baixos é bem complicado, eles não falam que leram livros gigantescos, aqueles que provocam tendinite nos pulsos menos exercitados, mas sim sobre livros famosos. De A Metamorfose passando por O Príncipe, Dom Quixote, Clarice Lispector e até, pasmem!, O Pequeno Príncipe. Talvez, e um gigante talvez, seja que fingir é patológico, uma condição inconsciente que o criminoso não perceba até ser desmascarado por amigos-traças.

Nessa caça às bruxas há um agravante reincidente: aquele que leu e fingiu que gostou ou não gostou. Como se não apreciar Anna Karenina fosse um crime inafiançável porque todos o consideram um cânone como muitos outros – nesse caso, eu seria preso. E isso não é mérito somente de clássicos e imortais, muitos desses trapaceiros ardilosos adoram sustentar a máscara de que “só leio coisas boas e não gosto dos mais vendidos”, quando na verdade guardam sob o travesseiro O Código Da Vinci, livro que vendem em suas conversas de cela como “um insulto à literatura”, mas não resistem a uma relida de tempos em tempos.

Antes de engolir Ulysses – citado lá no blog da Raquel Cozer -, pensei sobre como eu, com certeza, o abandonaria e falaria a todos que li. De acordo com uma colega, esse era um daqueles livros que todo mundo gostaria de ler, nunca leria, mas se um dia surgisse a oportunidade, mentiria sobre ter lido. Quando peguei para ler Ulysses a primeira vez, eu estava em um vício frenético por James Joyce, consumindo-o na veia – dos livros de contos a terrível adaptação Bloom, com Stephen Rea – e nada me faria desistir daquilo. Ao término daquele calhamaço, senti-me muito bem. Não era tão difícil. Na verdade, era incrivelmente fluído e interessante, divertido e intenso. Com certeza lerei a nova tradução do irrepreensível Caetano W. Galindo.

Eu fingi sobre livros menores. Confesso. Não citarei a(s) obra(s) – mesmo porque quem vai me julgar? -, mas saibam que pelo menos cheguei a abrir os dito cujos para ler. Um desinteresse, muitas vezes, é a causa para abandonar o livro, e não seu tamanho ou sua importância histórica. Isso é o mais curioso. Se um sujeito pergunta se li o livro que abandonei, respondo: “- Claro”. Pensem comigo: ele nunca perguntou se terminei o livro, somente se o li. Sim, distorcer a verdade e omitir (primo rico do fingir) certos detalhes é uma das manobras mais sujas que um ser humano faz, e muitos devem ter feito isso com coisas mais sérias do que um livro ou outro.

Em minha (e nossa) defesa, arguo: Que atire o primeiro catatau quem nunca fingiu (e isso vale para orgasmos)!