Um dos meus maiores problemas é (e sempre foi) começar alguma coisa. Talvez soe meio pesado e direto demais lançar essa frase assim, logo no início da coluna, mas acredite, passei muito tempo apagando e reescrevendo, até que me dei por vencida e resolvi deixar assim mesmo e dar continuidade ao texto. Pronto. Acabou o primeiro parágrafo e eu já posso respirar aliviada. Não foi tão difícil assim. (Na verdade, foi.)

Imagine que essa dificuldade se aplica a quase tudo na minha vida, desde levantar de manhã até resolver entrar em algum curso ou atividade física. Tudo é cautelosamente analisado e, em alguns casos, preguiçalizado mesmo, antes de acontecer. Outras muitas vezes não é a preguiça, mas sim um misto de insegurança, incertezas e pressões, que fazem tudo parecer um tanto mais difícil de se iniciar. Agradeçam muito ao fato de eu não ser essa coisa-doida Criadora do Universo, porque se algo tão grandioso como o surgimento do Mundo dependesse de mim, ele ainda estaria na forma de uma vaga e divagante ideia no epicentro da minha cabeça, dessas sem muito sentido que a gente tem antes de dormir.

Nas aulas de redação da escola, por exemplo, escrever qualquer coisa parecia uma verdadeira tortura. Eu cheguei, em alguns casos (e até vestibulares), a deixar umas linhas em branco e começar a escrever pelo meio e depois o fim, para então voltar à introdução, ou seja, escrevia o início sem que ele fosse um início e isso era extremamente aliviador. Além disso, pra mim sempre foi muito mais difícil pensar em como as coisas, no geral, começam, do que quando acabam.

São vários os resultados práticos, ou efeitos colaterais, que isso gera na minha vida: tenho muitas ideias anotadas sem serem colocadas em prática, uns tantos cadernos em branco, uma to do list eterna, tarefas entregues com o prazo apertado e algumas roupas com etiqueta no armário, mas são dos livros que eu vou falar. Nesse caso bem específico, a regra muda um tanto. São raras as vezes que um livro passa muito tempo em minha posse sem que eu o leia, mas é o início deles que me contagia.

Já disse em outra coluna que eu não sinto mais culpa em largar um livro pela metade: se o primeiro 1/3 não é bom, eu dificilmente continuo a ler. Os melhores livros que eu li me conquistaram logo nas primeiras páginas. Títulos, subtítulos, aberturas de capítulo, capas e um prefácio também podem ser apaixonantes. E são com os meus inícios favoritos que eu termino a minha coluna.

“Lolita, light of my life, fire of my loins. My sin, my soul. Lo-lee-ta: the tip of the tongue taking a trip of three steps down the palate to tap, at three, on the teeth. Lo. Lee. Ta” (Lolita)

“It was a bright cold day in April, and the clocks were striking thirteen.” (1984)

“Uma noite destas, vindo da cidade para o Engenho Novo, encontrei num trem da Central um rapaz aqui do bairro, que eu conheço de vista e de chapéu. Cumprimentou-me, sentou-se ao pé de mim, falou da lua e dos ministros, e acabou recitando-me versos.” (Dom Casmurro)