Possuo um jargão só meu: “Jamais!”. Não é bem um jargão, e também não é só meu, é quase uma interjeição para qualquer situação cotidiana. Às vezes respondo questões complexas, como “bom dia” ou “tudo bem”, usando-a, mesmo querendo dizer o oposto. Isso, talvez, deve-se ao meu arquétipo de Pícaro – aquele que tira o peso do drama, o alívio cômico, ou seja, o Fonzie. Na minha própria sitcom (como relatei ano passado durante minha passagem por NY), solto frases desconexas em momentos de silêncio ou deixo pessoas desconfortáveis e constrangidas sem perceber. Quando percebo, todos os atingidos viraram tartarugas dentro de seus cascos.

Além do “jamais”, tenho a pachorra de copiar as falas mais marcantes de meus personagens favoritos. Por muito tempo peguei a mania do “ou algo que o valha”, tirado do travessão de Holden Caulfield, e de inverter as frases como mestre Yoda. Há um mito em torno de certas expressões como “Rosebud”, “Tá falando comigo?” ou “I’ll be back”,  amplamente dissecadas e reutilizadas, de quinze em quinze dias, pela cultura pop, que nem sobra espaço para nós, pobres mortais, utilizarmos diariamente. Personagens amados de sitcoms geralmente têm seus próprios bordões, como Barney Stinson, de HIMYM, “It’s going to be LEGEN… wait for it… DARY”; Michael Kelso, de That’s 70’s Show, gritava em alto e bom som “Burn”, quando um de seus amigos era detonado pelos outros; e Joey, de Friends – “How you doin’?”; todos repetidos exaustivamente por seus fãs.

Porém, quero falar sobre os personagens reais que estão à minha volta, mais interessantes, cujas frases e expressões são tão típicas quanto um gaúcho generalizado ou um carioca marrento.

O grande trunfo desses exclusivos bordões, interjeições e afins cotidianos é a de saírem espontaneamente no meio da conversa. Não tem graça ouvir um paulista falando “tchê”, ou um acreano falando “oxente”. Uma das maiores provas é que, há pouco tempo, tentei incorporar no meu dia-a-dia a palavra “bandida” como adjetivo, copiando um querido amigo que apresentou essa expressão durante uma análise da música S&M, da Rihanna. Logo no primeiro dia, desisti. O primor dessa palavra ser tão gostosa de ouvir vinha da aglutinação: sotaque + assunto + sorriso-matreiro. Um outro amigo expressa seu espanto com a frase “Que jeito!”, que, novamente, só tem efeito devido ao seu olhar curioso e ao tom de surpresa empregado ao proferir tais palavras.

Aliás, o charme que impregna essas expressões marcantes, além dos trejeitos do interlocutor, é o seu significado dúbio, como o “Mi!” da admirável Dindii.

Ou eu assim pensava até um dia prosear com Vanessa Barbara, a itinerante de Mandaqui, sobre suas desventuras em série com a arguta Diana Passy, e ler o dito “É marisco!”. No instante que li, a imagem de Bob Esponja brotou à minha frente falando algo tão absurdo e nonsense seguido de sua gargalhada estridente. Dei risada e ela prosseguiu com a explicação: “(…) você olha e é nojento/trabalhoso/difícil de encarar. Mas todo mundo diz que é delicioso e deve valer a pena. Aí você come o marisco e tem gosto de… água salgada.” Ou seja, qualquer coisa que as pessoas dizem que é demais, apesar de trabalhoso, e que vale a pena (“não se engane pelas aparências”), pode ser, simplesmente, marisco.

Não é somente pelas caras e bocas, ou mesmo pelo charme e significado, que as expressões ganham seu tom único e natural. A dose de sagacidade e humor – coloque aí uma pitada de ironia, a gosto – criam o diferencial e revelam sempre um pouco mais sobre o emissor, ou não (essa roubei do filósofo Caê). Só não venha roubar meu jamais.