A Cosac Naify, fundada em 1997 por Charles Cosac e Michel Naify, começou sua produção com livros de fotografia, artes plásticas e cinema. Pouco depois, partiu para a publicação de ficção e edições definitivas, o que fez muitos leitores amarem todo o cuidado conferido às obras, mas odiarem os preços praticados. Talvez por isso a editora tenha realizado nos últimos tempos diversas promoções – entre elas, uma que oferecia 50% de desconto para quem comprasse nas livrarias credenciadas ou do site da editora. Os bibliófilos de plantão correram atrás de seus autores favoritos em coleções caprichadas, títulos exclusivos, edições cobiçadas há tempos. Encerrado o saldão, a editora ascendeu à vice-liderança no ranking de mais vendidos, o que reacendeu a discussão no fórum Meia Palavra sobre os preços dos livros no Brasil.
Vamos por partes.
A começar pela compra de direitos para publicação dos livros, que é um parto por si só. Pense que você é um escritor renomado e quer receber adiantado para ceder os direitos de seu mais novo trabalho. Ou que duas, três e até quatro editoras disputam a publicação e, quiçá, exclusividade. É um risco como qualquer outro investimento. Agora, considerando que você é um autor estrangeiro, é preciso contratar um tradutor de inglês. Fácil e dá para pechinchar. Alemão, hebraico, iídiche, sueco, tcheco, polonês, japonês e tantas outras, não é tão simples. A situação se agrava e o cheque engorda se a editora quiser um especialista – sim, existem tradutores peritos em determinado autor. Sem contar que, para uma edição colecionável, há também a questão das notas de introdução, posfácio, etc., feitas por estudiosos do autor, ou do livro específico, sendo necessário pagar esse pessoal também. E os leitores ainda ousam esquecer que as livrarias também precisam ter lucro – cerca de metade do preço de capa. Outro agravante para o encarecimento é a baixa tiragem: os valores seriam mais em conta com 10 mil livros impressos e disponibilizados ao consumidor; porém, o número de exemplares costuma variar entre 2 e 3 mil. Alguns mil exemplares, muitas vezes, ficam em estoque – longe das prateleiras – e viram catálogo.
A marca registrada da editora do Sr. Charles e do Sr. Michel é o primor pelo trabalho gráfico, desde sua fundação. Não há dúvida. Quando passo por uma livraria, consigo distinguir os livros deles – poucas vezes erro. Mas o que todos precisam perceber é que o preço das obras publicadas pela Cosac Naify não está apenas na capa – de quase nenhuma editora, aliás – e sim em todo o conjunto. Ficção Completa, de Bruno Schulz, por exemplo, tem tradução direta do polonês, ilustrações do próprio autor e um prefácio elucidativo. Imagine quantas reuniões criativas com departamento de direitos, editores, tradutores e professores não foram feitas para criar uma concepção? Isso sem contar os exemplares mais elaborados, em que se pensa o livro como um objeto a ser tocado, que brinca com o leitor – tal como um livro infantil que pode ser montado e desmontado.
Escuto raramente reclamações sobre tradução ou revisão dos livros dessas editoras bem conceituadas. O irônico é notar que grande parte dos leitores e compradores ataca apenas o valor final do produto. O preço é sempre o vilão. Uso a Cosac Naify como exemplo por justamente ser a que mais sofre esses ataques. Creio que todos reclamam – e com razão – quando encontram erros gramaticais gritantes ou partes suprimidas no livro que acabaram de comprar.
Há editoras, livrarias, sebos e títulos para cada perfil de leitor, incluindo aqueles como eu, que compram várias edições do mesmo livro (e olha que é nacional e nem precisa de nova tradução), que querem pocket, edição de luxo, edição simplificada, edição comentada de Guerra e Paz, Crime e Castigo, Poemas de Drummond, ou [insira aqui a sua].
Tudo isso apenas para te perguntar: que tipo de leitor você é? Aquele que compra livros para a vida toda, um colecionador de raridades ou um leitor único, que mais tarde doará sua última, penúltima e antepenúltima compra? Se for para a vida toda, vale a pena esperar e economizar para aquela edição mais parruda. Se não for, bem, você aceitaria qualquer coisa? O quanto vale a pechincha pelo custo-benefício? Livro também é um bem de consumo: você pode querer a melhor edição, com a melhor apresentação, ou pode querer economizar e comprar algo mais barato – e ter de aturar a voz da consciência dizendo “é o preço que se paga…”..
Felippe, veja esse vídeo interessantíssimo:
http://www.youtube.com/watch?v=44NAr3KExsc
A reportagem explica como que uma editora calcula o preço de um livro.
Abraço,
Daniel
Oi Daniel! Obrigado pelo lembrete, já conhecia o video!
Um abraço.
“Livro também é um bem de consumo: você pode querer a melhor edição, com a melhor apresentação, ou pode querer economizar e comprar algo mais barato – e ter de aturar a voz da consciência dizendo ‘é o preço que se paga…'”
Como eu disse no fórum, o problema da Cosac/Naify vem justamente do monopólio de títulos. Infelizmente, o mercado editorial muitas vezes não tem o menor interesse em publicar alguns autores que já entraram em domínio público – quem sobra? A Cosac/Naify. Peguemos um exemplo: “O Duelo”, de Tchékov. Posso muito bem comprar um exemplar da Amarilys, que tá R$ 40. Ou posso comprar pela Veredas, um pouco abaixo desse preço. E ambas são boas traduções. Contudo, se eu quiser, por exemplo, ler “Ressurreição” traduzido do russo, pra quem me volto? Cosac/Naify. Rubens Figueiredo é um ótimo tradutor, mas me pergunto porque o preço de capa não pode ser menor. Na verdade, se quiser continuar com o trabalho esmerado, ótimo, mas tornem a coisa mais popular. Não duvido nada que tenha tanta gente querendo estudar literatura russa e não tem grana pra bancar as publicações da Cosac/Naify ou Editora 34 – que, aliás, vive tendo problemas pra se livrar do estoque. Apesar de ser um “bem de consumo”, é preciso que ele seja acessível, do contrário vamos permanecer na ideia de que uma obra assim visa apenas consumidores elitistas. Assim como no fórum, podem me dizer “mas essa é a orientação da Cosac/Naify”, e eu vou repetir “então que aguentem a reclamação”.
Pensando em obras de domínio público, você parte para outro nível. Como todos podem “comercializar”, cada um escolhe seu público. Vender mais porque é uma obra “obrigatória”, exige pouco preocupação com todo o resto do trabalho, só a tradução – e sabemos que tem lugares que cometem plágio. Ou seja, não vejo como um mau caso a Cosac lucrar com isso. Ela faz uma edição parruda para colecionadores, aqueles que só querem conhecer a obra vão para a mais barata. Se a Cosac investe mais, ela tem direito de querer lucrar em cima disso. É a vida. O mesmo vale para a edição de Ulysses da Companhia das Letras, publicada depois que a obra foi para domínio público, mas mesmo com outras duas traduções, a Companhia preferiu colocar mais coisas e tirar, por exemplo, o guia que vinha nas outras edições.
Questão de escolhas. A Editora 34, apesar do ótimo trabalho, não sabe se vender muito.
Mas Felipe, se brincarmos, 2/3 de literatura que a Cosac/Naify vende está em domínio público. Nem a Jorge Zahar publicando edições de colecionador de Alexandre Dumas, Carroll ou Conan Doyle tem preços tão caros, e vide que são obras bem traduzidas e com conteúdo adicional – notas, prefácio, introdução, etc. Achar que as pessoas querem uma edição estilo Martin Claret/Rideel é – me desculpe – besteira. Até quem quer pagar mais barato por uma obra procura adquirir algo com qualidade. Um argumento do tipo me lembra a desonestidade de vender pão pela metade do preço sem avisar o consumidor de que está estragado.
Como você errou a grafia do meu nome, me recuso a te responder.
Ah, ele é sensível.
(Brincadeira, FeliPPe). 😀
Mas se existe todas essas outras edições, eu ainda não entendi seu ponto. Juro. Não é bem de consumo? Se você escolhe comprar uma roupa Zara ou C&A sendo que as duas são feitas por escravos bolivianos, é você quem decide qual tem a melhor costura, qual não encolhe quando você seca, qual fica melhor em você por causa do corte. As duas tem qualidade, mas uma tem uma etiqueta mais chique que a outra certo? Se você pensa exatamente isso, que não existe parâmetros para achar a edição de uma editora melhor que a outra, bom você está sendo ingênuo.
Mesmo que tenham notas, posfácio, introdução, quem garante que é de um grande especialista? Não se esqueça que a parte mais cara de um livro é a impressão, o papel e a tinta gasta. Tudo isso conta. Ou você prefere ler numa folha branca quando tem a opção da folha polen? Esses pequenos detalhes é que encarecem os livros e quando a tiragem é pequena, torna o curto mais alto.
Como eu disse, depende o tipo que leitor que você é e o que aquele livro que você vai comprar representa para você: leitura para toda vida, colecionador ou passatempo de ônibus que depois você mandará para um sebo, emprestar ou trocar?
1) A frase final dá a entender que o leitor não sabe diferenciar uma edição melhor que a outra. Um leitor de verdade vai atrás desse tipo de informação, Felippe. Se ele quer o melhor, dentro das condições financeiras dele, ele vai atrás. (Aliás, depois que a Martin Claret resolveu entrar “nos eixos”, as traduções lançadas e comentadas não são “pouca porcaria”, não. )
2) Esperemos que um leitor de verdade saiba disso.
3) Há quem queira guardar pockets pra vida toda, eu não vejo mal nenhum nisso. Ou edições da Penguin, mesmo as de capa preta. Esteticamente falando, não é bonito. Mas é útil e é bom ter a mão. Aliás, por conta da confusão que deu entre a Cosac/Naify e a Denise Bottmann, troquei minha edição de “Como funciona a ficção” pela nova, em versão de bolso. Acompanhei o debate entre ambas as partes e vi que, sim, a Denise estava com a razão. Acontece.
1) O que a frase final dá a entender fica a cargo da interpretação de cada um, mas posso garantir que a sua não condiz com o que eu quis dizer.
1.1) Um leitor de verdade? O que seria um leitor de verdade, Bruce? Estudiosos, viciados, etc? Não pode ser um leitor que apenas achou a edição bonita e tinha o poder aquisitivo de comprar e ler? Uma pessoa que lê muito, achou uma edição da Cosac incrível (capa, tradução, whatever) e resolveu comprar? É exatamente isso que quero dizer com a frase final, cada um vai atrás do que pode arcar. “O preço que se paga” não quer dizer do valor, se um é melhor que o outro, é o preço que se paga para ter aquele obra, se o preço é justo dado o que você quer dela. Eu mesmo não quero muitas obras com tantos floreios, logo não sou um leitor de verdade?
2) Eu não espero.
3) A primeira frase sua desse item resume tudo que eu quis dizer no post. A decisão é do leitor. Só não acho coerente acusar apenas o preço e não avaliar a qualidade – e eu sei que qualidade não tem nada a ver com preço, boas traduções podem ser baratas, mas o processo do livro e tudo mais pode não ser.
1) Felippe (viu? agora acertei), infelizmente esse é o problema da linguagem: dá margem a interpretações. Ao mesmo tempo que enriquece, pode causar problemas. Fico feliz que não seja a minha interpretação. Se o fosse, ficaria desapontado mas respeitaria sua opinião mesmo assim.
1.1) Um “leitor de verdade” (deveria ter colocado aspas) está disposto a saber o que gira em torno daquela obra, porque ela é tão significativa. Vide que o termo – agora melhor posto – abrange qualquer um que goste de ler, independente do gênero. Você acha justo o preço cobrado pela Cosac/Naify. Eu também, que coisa, não? Mas acho injusto que a pessoa não tenha acesso a uma obra por conta dos “floreios” (novamente, deveria ter colocado aspas). Agora, por favor, não entenda como se eu estivesse atacando você ou te acusando de alguma coisa.
2) Eu espero. Gostaria de depositar a confiança no leitor como a parte que decide o valor de determinada obra e se vale quanto custa.
3) O problema é que você foi atacar traduções, referiu-se no texto ao custo do espólio do autor, etc. Acho interessante mostrar como funciona o processo de confecção e como ele encarece o produto final, mas isso não vai mudar a percepção de que sim, o preço é alto. Decisão editorial? Beleza, infelizmente há de se conviver com isso. Só não desce. Que se há de fazer? É como pedir a um doente que tenha paciência porque o Governo não liberou a verba para que ele – e mais uma centena de pessoas – sejam atendidos. A gente vai espumar, vai reclamar. Se der certo, vira-se o jogo. Se não, empurramos com a barriga e vamos fazer parte da história dos subúrbios.
Aquela impressão que estamos justificando um parceiro nosso para continuarmos ganhando livros.
Oi Thales, não sei se você reparou, mas eu falei que usei a Cosac como exemplo porque ela é a mais atacada de todas no quesito preço – inclusive, se você entrar no fórum, vai notar que usei os mesmos argumentos e outros mais que não vieram ao caso nessa coluna. Segundo, você não faz parte do Meia Palavra, então creio que falar na primeira pessoa do plural é uma ofensa a mim e a minha equipe, afinal não nos vendemos (graças a YHWH), somos criteriosos nas escolhas dos títulos que vamos resenhar. Se você conhece algum blog que defende parceiros e só fala bem deles para ganhar livros, denuncie, mas com a certeza do que está falando. Agora, vamos a alguns exemplos. Há quanto tempo você visita o Meia Palavra? Já viu eu falando mal de Solar, da parceira Companhia das Letras? Ou falando mal de A Passagem Tensa dos Corpos (também de parceria)? Eu não sei como anda seus bookmarks tampouco seu reader, mas se neles apenas existem chapas branca, meus pêsames.
Aliás, eu só dei exemplos meus certos? Que tal dar uma olhada nas críticas da Anica, Taize, Luciano, etc.
Meia Palavra existe há quase cinco anos e nunca entramos nessas polêmicas sobre “blogs vendidos” justamente porque, pelos nossos textos, dá para notar que lemos os livros de verdade e não fazemos quarta capa, muito menos orelha e tampouco review.
Ainda bem que, na Flip desse ano, notei o quanto dessa transparência no nosso conteúdo vale a pena. Fomos elogiados e geramos discussões entre as leituras, mas não falavam: “conheço”. E sim, eu posso falar na primeira pessoa do plural.
Foi mal, Thales, mas “data non venia”. E olha que eu fico aqui no pé desses caras o tempo todo. 😀
Muito legal o artigo!
Primeiramente, me encaixo nessa turma que via deixar livros para doação após a morte…rsrs
Depois, fiquei pensando no preço do livro. Como baratear? Aumentando tiragens, reduzindo impostos, colocando patrocínio nas capas, contra-capas…..sei lá. Mas, e se isso fosse possível: reduzir o preço dos livros em 50%, por exemplo. Mudaria alguma coisa? Aumentaria o número de leitores? Sinceramente não acredito que teria um aumento significativo. Em minha modesta opinião deve haver ações para mudança de hábito e todo mudança de hábito/cultura leva tempo. Quais seriam então essas ações? Fica a pergunta….
É mais ou menos assim que eu penso, Odair. Não há tiragens maiores porque não há leitores (e não há falta de leitores porque os preços são altos demais, mesmo com muito livro barato, eles não são prioridade para muitas pessoas). Óbvio que muita gente se mobiliza e compram mais livros quando estão em promoção (tipo Harry Potter por 10 pilas no Submarino, ou a própria promoção de 50% da Cosac), mas é mais um impulso do consumidor que adooooora promoção e corre pra aproveitar. Mesmo com um preço menor, o pessoal só se mobilizaria desse jeito com um PROMOÇÃO ou DESCONTO bem grande no site.
Sobre o comentário do Bruce, entendo bem essa reclamação, e até concordo, mas eis o capitalismo, esse lindo: não há tanta procura por esse tipo de livro, e se você não tem dinheiro pra se jogar nesses livros lindões, você simplesmente não é o público dessa editora. É a triste realidade. Por mais que seja um produto necessário para você, é preciso ter condições de comprá-lo.
Maaaas nos últimos meses a gente tá vendo as editoras indo pra um lado mais ~popular~, não? A própria coleção portátil da Cosac é uma forma de oferecer esses livros por um preço mais acessível (mas também não é agitando a varinha mágica que todo o catálogo vai virar pocket), e a Companhia das Letras anunciando redução no preço dos livros, etc etc etc. Agora é o tempo em que o mercado editorial tá crescendo mais, publicando mais, tá correndo mais grana e que torna essas coisas possíveis.
Não tenho nada contras os clássicos, gosto muito deles e estou lendo cada vez mais….mas, lembro me que na escola me pediram para ler “O alienista” e foi um parto. Acho que se tivessem me pedido algo mais moderno para aquela época, exemplo: Clarice Lispector, Ignácio de Loyola Brandão, Marcelo Rubens Paiva ou Dalton Trevisan, seria diferente…o estímulo seria outro. Penso que incentivar a leitura nos primeiros anos da escola com obras mais modernas seria um bom começo mas, como disse em meu comentário anterior, essa é uma ação a longo prazo.
Infelizmente existe uma cultura de ensino engessada nas escolas hoje em dia que prepara para o vestibular, não para a vida. Me pergunto hoje se se eu tivesse seguido as instruções da minha professora da 6ª série – ler “Iracema”, “Brás Cubas”, etc. – gostaria de ler tanto assim?
Infelizmente creio que ainda o maior vilão pelos preços altos seja a baixa tiragem.
Não discuto a qualidade dos livros da Cosac, mas como comparação com uma editora que também gosto bastante que é a Editora 34, os livros da Cosac continuam um absurdo e ambos tem traduções diretas e notas. A única diferença fica por conta da capa que nas edições da cosac geralmente vem em capa dura e que são muito belas.
Por outro lado a cosac tem alguns títulos mais baratos, como é o caso do Ganhando meu pão do Gorki. que é facilmente achado a R$9,90 na internet para compra. Essa edição mesmo é em capa mole. Mas é um livro normal mais barato que um pocket.