Uma pergunta, mesmo que velada, sempre é feita por quem trabalha no mercado editorial: o que faz com que um livro encontre milhares ou milhões de leitores e outros encalhem nas prateleiras? Existem leitores para todos os livros produzidos? É uma questão de sorte, ou fórmula secreta, ou poção mágica, ou pacto com o 666?

Difícil, nesta questão, entrar no mérito da qualidade literária. Isso é subjetivo. Eu posso gostar de Altair Martins e meu vizinho de banco no ônibus adorar Sidney Sheldon. Sheldon vende muito mais do que Martins. Não porque seja melhor. Mas porque, eu imagino, encontra eco nos anseios de leitura de muitas pessoas (um grupo muito, muito grande de pessoas).

Há pouco tempo, uma escritora conhecida reclamou no twitter que isso é uma imposição do mercado. Que livros como 50 tons de cinza vendem muito porque estão na lista dos mais vendidos e bem expostos nas livrarias. Como um círculo vicioso: vende mais porque aparece mais e aparece mais porque vende mais. Muitas editoras investem pesado em marketing e publicidade para garantir isso. Outros, em contrapartida, desenvolvem métodos, no mínimo criativos, para assegurar que o livro esteja nas listas oficiais. Foi o Pips (gracias, editor!) que me mandou um link para um texto do Sérgio Rodrigues, que conta uma história peculiar, ocorrida nos Estados Unidos no final da década de 1960 (leia aqui)

Sobre as grandes vendas, penso um pouco diferente: se leio um livro e gosto, vou indicá-lo a outras pessoas. Maior o grupo de indicados, maior a repercussão. Essa semana, numa reportagem da televisão local, uma manicure explicava à repórter sua verdadeira adoração por 50 tons de cinza. Ela não tinha o hábito de ler, mas o texto a prendeu (seduziu, para fazer uma analogia apropriada). Não conseguia largar à noite em casa e aproveitava qualquer intervalo no trabalho para ler mais algumas linhas. É daqui que vem minha visão pollyannesca sobre leitura: não importa o livro. Precioso é que exista o leitor. E, se for um novo leitor, é preciso comemorar.

Qual bestseller me arrebatou dessa forma? Sou muito velha para ter acompanhado de perto (como público-alvo) a onda do bruxinho de J. K. Rowling. Mas, há alguns anos, fui desafiada por um amigo do meu marido. Ele disse: “Tu és leitora de livros-cabeça. Esse aqui é um bestseller, tem muitas páginas, é muito bom e duvido que o livro saia das tuas mãos sem que leias em um ou dois dias”. Foi um milagre editorial: eu virei duas madrugadas e enfrentei um sábado e um domingo querendo ler e precisando fazer outras tarefas até que terminei o livro. Sim: aconteceu com o primeiro volume da trilogia Millenium. A citação final da coluna desse mês é dedicada a Stieg Larsson.

O sueco é um caso à parte. Para toda a grande massa de lançamentos, a fala parece ser comum: faltam leitores, faltam vendas. Muitos livros são impressos todos os anos. Há muita produção, e dos mais variados tipos, para pouca demanda. Mas como explicar fenômenos editoriais que encontram milhões ou bilhões de leitores (se formos contar todas as traduções e edições estrangeiras)?

A verdade é que não existe segredo. Há livros que não encontram e nunca encontrarão leitores. É uma ilusão acreditar que o simples processo de publicar um livro fará com que leitores se encantem pelo texto. O que falta? Descobrir (com a ajuda de pesquisas, oráculos ou sorte) qual é o tipo de livro que ainda não existe no mercado e que pode agradar esses leitores ávidos.

Muita gente torce o nariz para isso. Uma vez, durante uma palestra, um espectador se retirou da plateia, indignado com a minha colocação. Dizia ele: “Onde já se viu?! Isso é ridículo! Eu vou escrever o livro que eu quero! O leitor que lide com isso!”. Será mesmo? O que você faria? Ou que você faz?

Outra pergunta também tem impulsionado minhas reflexões: qual será o próximo bestseller mundial? Só digo uma coisa: se eu descobrir, só vou contar para vocês depois que fechar um contrato com o autor.

Na Página 28 de Os homens que não amavam as mulheres, de Stieg Larsson:

“Mikael tornou a encher seu copo com aquavita Reimersholms e inclinou-se para trás na cadeira, refletindo sobre o que sabia a respeito de Wennerström. Era magro. Nascido na região do Norrland, onde criou uma empresa de investimentos nos anos de 1970, juntou algum dinheiro e se transferiu para Estocolmo, fazendo ali uma carreira fulgurante nos gloriosos anos 1980. Criou o Wennerströmgruppen, rebatizado de Wennerström Group quando foram abertos os escritórios de Londres e Nova York, e quando nos jornais a empresa começou a ser mencionada no mesmo nível que a Beijer. Negociando ações, participações e operações rápidas, passou a figurar na imprensa VIP como um dos novos bilionários suecos, proprietário de um loft em Strandwägen, de uma suntuosa residência de verão em Värmdö e de um iate de vinte e três metros, comprado de uma ex-estrela do tênis em decadência.”