Dia 2: Quem com ferro fere tanto bate até que fura.

OK, a minha mandíbula está doendo de tanto rir. Eu já sabia mais ou menos o que esperar de Relatos Selvagens (Damián Szifrón, 2014) graças à nossa amiga Isadora, que o definiu como “uma versão irônica de Um Toque de Pecado,” mas não estava preparado para um constante malabarismo entre tensão, violência e diversos momentos que beiram a comédia pastelão. Se humor negro é o seu rolê, tem muita coisa para apreciar aqui.

Antes mais nada, vamos tirar as más notícias do caminho: trata-se de um longa composto por várias histórias conectadas apenas tematicamente e, por uma questão pessoal, esse tipo de coisa nunca acaba me envolvendo o suficiente. Estamos basicamente assistindo a uma série de curtas, afinal; a jornada de nenhum personagem é muito desenvolvida e os finais frequentemente se resumem a momentos de ironia um tanto vazios.

Com créditos de abertura sobrepostos a fotos de animais selvagens, não é muito difícil entender o que Szifrón está dizendo sobre A Sociedade. Em geral, personagens precisam de pouco estímulo para começarem a agir como animais, e esses estímulos são ilustrados de diversas formas (disputa de classes, corrupção, burocracia, humilhação, traições amorosas, etc etc etc). A vingança é o único elemento recorrente, o que funciona para dar alguma unidade aos procedimentos, mas também acaba tornando as coisas ocasionalmente previsíveis.

Embora o filme em geral mantenha uma consistência estética e tonal, um segmento em particular, intitulado nos créditos finais como “La propuesta”, é consideravelmente mais sério que o resto, e talvez devesse ter sido deixado de fora e expandido em um longa, especialmente porque sua premissa envolve um dilema interessante que não é suficientemente desenvolvido.

Se parecer que eu estou procurando pelo em ovo, é porque eu estou. Nenhum desses problemas chega a realmente prejudicar a experiência; apesar de inconsistente, Relatos Selvagens é um filme competentemente produzido, dirigido e atuado que, em termos de entretenimento, é basicamente impecável. E eu mencionei que ele é hilário? Ele é muito hilário, e vai ser difícil outra sessão da Mostra ter uma reação tão positiva da plateia.

***1/2