A semana entre o Natal e o Réveillon é a única que não faz sentido em todo o ano. Remotamente aparentados com o período entre o ano novo e o carnaval, estes cinco dias que vivemos agora são a síntese da inércia humana, e atravessá-los é tão incômodo quanto andar em um corredor estreito de parede chapiscada.

São dias em suspenso – nada começa, nada termina. A sensação de que tudo já passou faz com que as pessoas se sintam exaustas. Algumas contentes, outras cabisbaixas, mas todas invariavelmente melancólicas. Melancólicas como se estivessem passando certa madrugada em claro, insones e solitárias, a observar a imensidão de janelas apagadas da cidade. Um clima desconcertante que não admite muito balanço de corpo nem agitação de espírito.

Uma das poucas coisas que fazem sentido neste longo amanhecer nublado é uma canção de Luiz Tatit e Arrigo Barnabé, “Ano bom”, do disco “De nada mais a algo além”: “Pois do Natal ao Réveillon/ tem um vão ali/ é um vazio em mim/ que você notou/ logo ocupou/ e cantou:/ boas festas/ e um ano bom”.

Barnabé descobriu a melodia trabalhando em um arranjo do samba “Luz negra”, de Amâncio Cardoso e Nelson Cavaquinho – o mais melancólico de todos os nossos compositores. “Ano bom”, portanto, não poderia se dedicar a outro assunto que não fosse o intervalo de incomparável tristeza doce entre uma festa e outra.

Só há três maneiras de atravessar este vão do calendário que, aliás, não tem nome: esperando pelo 31, apegando-se ao 25 ou, para os mais abastados, transformando-se em almofada do sofá a digerir a infindável ceia natalina que se desdobra em mais algumas refeições e petiscadas fora de hora.

Os mais pendentes para o lado do 31 tendem a esboçar sua otimista lista de desejos e promessas que é inútil, pois a modesta canoa de 2015, que alguns pensam ser um cruzeiro do Roberto Carlos, não acomodará todos os seus ensejos e muito se perderá no mar bravio que atravessaremos. Os partidários do 25 fazem balanços do ano que passou, encaram o espelho da autocrítica como quem avalia a harmonia de um rosto maquiado e tentam compreender tudo pelo que passaram, achando graça em descobrir que algumas coisas estão mais conectadas do que aparentam. Sentem-se mais sábios, embora às vezes se pareçam com uma criança que força a junção de peças do quebra-cabeça que não se encaixam.

De um jeito ou de outro, todos somos acometidos pela melancolia do vão, uma parada obrigatória para aprendermos a conviver com o tédio da vida, um Engov na jornada etílica, um dia longo em que apenas se observa, calado, do alvorecer ao pôr do sol.