A década de 60 foi marcada por uma série de movimentos revoltosos, de luta, contestação e reivindicação, tanto nos Estados Unidos quanto nos demais países. Basta lembrar de hippies e beatniks cruzando os Estados Unidos, usando drogas, ouvindo Rock n’roll e questionando-se e insurgindo-se contra o american way of life. Isso sem contar os inúmeros protestos pelos direitos civis, os movimentos feministas, as críticas à Guerra do Vietnã, o Maio de 68 em Paris, as convulsões revolucionárias ou revoltosas na América Latina etc.

Diante dessa riqueza histórica a ser trabalhada, John Updike resolve situar sua história, As bruxas de Eastwick, na provinciana cidade que dá título ao romance. Lá conhecemos Jane, Alexandra e Sukie, três bruxas de meia-idade curiosas por conhecer o novo proprietário da antiga mansão Lenox, Darryl Van Horne.

Ao escolher essa “locação”, Updike acaba somente tangenciando levemente, sutilmente demais, todo esse fértil terreno histórico sobre o qual sua trama poderia ter se assentado. Tudo bem, não posso querer aqui cobrar do autor algo que ele não “se propôs” a fazer, contudo, em diversos momentos do livro aparecem trechos que subentendem a convulsão pela qual passava a História da humanidade (a nível de Estados Unidos ou além dele) só que o autor usa mal esse pano de fundo histórico, o uso que ele faz é meramente informativo: localiza a trama no tempo mas não a integra à história das bruxas.

Updike transporta as bruxas dos típicos cenários lúgubres da Idade Média ou do século XIX (típicas locações das histórias de terror e bruxaria) para a década de 60, sem, contudo, aproveitar as potencialidades dessa transposição de modo mais amplo, restringindo demais o alcance da obra e os possíveis caminhos a serem tomados.

Do raro uso que as bruxas fazem da magia é que venha talvez o acerto do livro: criar o clima de monotonia e de simples inércia em que as três bruxas se encontram, indo, inevitável e angustiadamente para a velhice. A chamada crise da meia idade é o ponto central da história, e, se formos analisar a partir desse prisma, Updike conseguiu sim traduzir alguns dos dilemas desse processo.

Porém, o livro peca por ser morno demais, e não captar a atenção do leitor com eventos pujantes, seja com adrenalina ou com reflexão. Talvez seja exatamente esse o objetivo do autor: trilhar o caminho árido que separa a vida adulta da velhice, mostrando como ele é áduo pela inevitabilidade.

Jane, Alexandra e Sukie se encontram tão apáticas quanto a mesmice  modorrenta e cheia de mexericos de Eastwick que rapidamente se ligam a Van Horne, que representa um acorde diferente (e talvez dissonante demais) da monótona “sinfonia” da pequena cidade. Na mansão, as três vivem aventuras sexuais e prazeres hedonistas de contemplação artística e a experimentação baseada na maturidade de sua condição, não obstante um tanto melancólica, com um certo quê de nostalgia dos tempos passados.

Embora as memórias de tempos idos não tenham sido diretamente abordadas no livro através de rememorações das bruxas, elas perpassam a trama na medida em que as três, vendo-se às voltas com suas realidades amorosas difusas, filhos e casas para manter; as contrapõem à “vidinha” rotineira pouco atrativa de que desfrutam, vendo em Van Horne a chance de se desprenderem por alguns momentos da constância exacerbada da cidadezinha.

O romance de Updike pode talvez ser definido como melancólico e semi-conformado com o fantasma da meia idade, sendo triste e ao mesmo tempo sedento de alguma perspectiva acalentadora de inquietação com a rotina. Desse ponto de vista As bruxas de Eastwick representam uma tentativa (muito tímida) de compreender e de tolerar o fato de que o tempo é inexorável.