Sempre que vemos um grande desastre natural sendo noticiado extensivamente na mídia, é comum ouvirmos debates em torno do mal que o homem faz ao meio ambiente e de como a Terra reage a isso. Pensando no planeta como um ser vivo que se livra de uma doença, assim como nós nos livramos de uma gripe ao tomar uma aspirina, furacões, terremotos e tsunamis poderiam ser justificados como uma defesa.
Esse é um dos subtemas abordados no romance Tremor, de Jonathan Franzen, mostrado no livro através de terremotos no estado de Massachusetts. A narrativa tem como foco principal o personagem Louis Holland, que aos 23 anos se muda para Somerville a fim de trabalhar em uma emissora de rádio prestes a falir. Louis é o tipo de rapaz reservado e dotado de sarcasmo. O livro acompanha os relacionamentos desse personagem com sua família conflituosa, além de Renée Seitcheck, uma jovem estudante de Harvard que estuda os tremores no local e que, com Louis, investiga a Sweeting-Aldren, uma empresa que pode ser a responsável por causar os danos na região. Além da abordagem sobre geofísica e agressão à natureza, o autor também trabalha e critica a mídia e organizações políticas e sociais.
A primeira coisa que me chamou atenção no livro foram os diálogos muito bem construídos. No primeiro capítulo, Louis faz uma visita à casa de sua irmã, Eileen, em Cambridge, onde ela prepara um jantar para o irmão e o namorado, Peter. Eileen e Louis nunca tiveram uma boa relação, inclusive ficando alguns anos sem mal se falarem, apesar de viverem na mesma casa. Enquanto a irmã era a menina popular da escola, além de mimada pelos pais, Louis tinha um espírito mais independente e antissocial. No entanto, ao mesmo tempo em que eram opostos, eles se conheciam muito bem, o que fica claro nos diálogos iniciais, cheios de farpas.
Farpas essas que, aliás, só aumentam com o decorrer da história. A família de Louis não faz exatamente o tipo próxima e amigável. Depois que sua “avó”, uma escritora de New Age, morre em um irônico acidente decorrido de um tremor, deixando, de um lado U$22 milhões e, de outro, uma fraude bancária, os conflitos e fragilidades de cada personagem são ainda mais expostos. ” ‘Eu também conhecia Rita Kernaghan’ disse ela. ‘E queria dizer a vocês que acredito com toda a convicção que ela já reencarnou! Eu acredito que ela agora é… um periquito! Não é maravilhoso?’ ” . Esse depoimento, proferido pela mãe de Louis no enterro de sua avó, mostra bem o clima da situação.
Por sinal, os personagens são outro grande motivo para ler esse livro. Louis Holland dificilmente, a meu ver, passa sem criar uma empatia com o leitor. Além disso, a leitura é incrivelmente simples e dinâmica, o que não torna a história mais fraca, mas sim ainda mais interessante. O narrador-onisciente não deixa escapar observações perspicazes ou detalhes à narrativa. Jonathan Franzen faz ficção do mundo real, onde as fragilidades da vida, família e instituições sociais são expostas. No mais, o meu favorito: entre um drama e outro, existe espaço para uma certa comicidade. É difícil acreditar que existe espaço pra tantas ações exteriores, conflitos interiores das personagens e o despertar de reflexões profundas sobre o indivíduo e a sociedade no mesmo lugar que existe simplicidade.
Jonathan Franzen é consagrado pelos romances Correções e Liberdade lançados, respectivamente, em 2001 e 2010. Além disso, A Zona do Desconforto e Como Ficar Sozinho (a ser lançado na Flip 2012, onde ele participa da mesa “Encontro com Jonathan Franzen” às 19h30, no dia 6) são trabalhos não-ficcionais do autor, ambos publicados pela Companhia das Letras aqui no Brasil. Tremor é o segundo romance de Franzen, escrito originalmente em 1992 e que, passado 20 anos, ganha tradução inédita para o português. O autor é conhecido por resgatar o gênero “twisted relationships“, com personagens mantendo relações conflituosas, e o romance social, que marcam o pensamento e comportamento de uma época.
Saiba mais sobre essa e outras obras no site da Companhia das Letras