“Bond, James Bond”. Em 2002 Pierce Brosnan perdeu sua licença para matar, a MGM encontrou um 007 muito melhor e desde então ele vaga pelo Cinema, já que bom ator nunca foi, entre Ladrão de Diamantes (2004), Encurralados (2007) e até Mamma Mia! (2008). Vez ou outra assume um papel mais interessante num filme mais respeitável, como O Escritor Fantasma (2010), de Roman Polanski, mas às vezes entra em enrascadas como Percy Jackson (2010) e Não Sei Como Ela Consegue (2011), com Sarah Jessica Parker.
Ainda assim, há algo sobre Pierce Brosnan que nos interessa. Talvez o charme de ex-agente-a-serviço-de-sua-majestade ou mesmo sua canastrice irremediável fazem com que não consigamos nos livrar dele.
Agora nos cinemas brasileiros o ator ressurge na comédia dinamarquesa Amor é Tudo o Que Você Precisa, da diretora Susanne Bier, vencedora do Oscar de melhor filme estrangeiro de 2011, por Em Um Mundo Melhor.
Muito mais interessante do que o pôster ou título aparentam, a trama acompanha Ida (Trine Dyrholm, colaboradora da diretora em seu anterior e premiado filme), cabelereira que se recupera de um câncer de mama e que enquanto enfrenta a quimioterapia é traída pelo marido. Em meio a uma fase conturbada, tem que partir para o casamento da filha na Itália, mas no caminho tromba, literalmente, com o pai de seu futuro genro, um homem inicialmente muito desagradável.
Trine leva sua personagem com graça e coragem, atingindo uma sensibilidade que eu achava impossível em atuação na dura língua dinamarquesa. É difícil não se encantar por ela logo nos primeiros instantes, seja pelo jeitão desastrado, pelas roupas kitschs ou pela compaixão em relação a sua doença. Numa cena das mais corajosas, a quase cinquentona Ida mergulha no mar, nua, careca, mas ainda de uma beleza muito real, muito palpável, e esse é apenas um dos momentos em que o personagem de Brosnan e a audiência simultaneamente se apaixonam por ela.
A façanha em fazer de uma comédia romântica de plot comum, ambientada em cenário muito semelhante ao de Mamma Mia!, atingir um nível de qualidade tão interessante é, sem dúvidas, da direção e roteiro. Contudo, é o elenco que prende a audiência, assumindo os papéis com vitalidade, e formando um bom grupo de coadjuvantes. Os papéis exagerados e desagradáveis caem a atores que os assumem com naturalidade, assim como Trine brilha com sua Ida e Brosnan (ainda muito bonitão, embora barrigudo) surpreende com seu Philip.
Atuando em inglês em meio a um elenco dinamarquês (provavelmente por deficiência do ator e não do personagem), ele nunca pende para a arrogância, usa o charme em momentos certos, consegue ser engraçado e ainda revelar as profundas marcas de seu Philip viúvo e solitário.
As situações clichês do gênero estão presentes, com direito à personagem burrinha que solta uma gag atrás da outra e da boa e velha taça de champanhe atirada à face de um personagem chato. Ainda assim, o filme se mantém muito agradável, com espaços para surpresas e especialmente bom nos momentos de interação entre o elenco.
Susanne Bier, outrora efusiva colaboradora do movimento Dogma 95, de Lars Von Trier e outros nórdicos, aqui realiza uma obra que é um refrigério em sua filmografia. Mesmo caindo vez ou outra nas facilidades do gênero romântico, felizmente faltou-lhe calor humano para que descambasse à bobagem comum ao gênero. Em breve poderemos vê-la novamente em ação com Serena, projeto americano que reunirá a dupla de O Lado Bom da Vida (2012), Jennifer Lawrence e Bradley Cooper.
Já Pierce Brosnan tem projetos encaminhados com Emma Thompson, consta no elenco da adaptação de um romance de Nick Horbny, atuará com Owen Wilson e Michelle Monaghan e ainda tem um projeto de filme para a televisão (o novo meio queridinho do audiovisual americano). Talvez o melhor ator-B do Cinema atual, há algo sobre Pierce que não nos deixa abandoná-lo.