Procrastinação. Pro-cras-ti-na-ção. Proooocrastinação.

Você sabe o que é. Talvez já tenha assistido a um vídeo sobre isso. Procrastinação é, aliás, ver um vídeo (de gatinhos, que seja) em vez de fazer o que tem que fazer.

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Procrastinação é fazer uma xícara de café. É tomar sete xícaras de café solúvel por dia – não por necessidade da cafeína, mas por ser a única bebida quente que gosta de tomar pra combater o frio.

É pular de uma ideia para outra e desta para outra. Tipo pensar em uma coluna sobre abandono de livros grossos e mudar de ideia para uma sobre como foi bom ficar sem celular e conseguir ler romances inteiros no ônibus e pensar melhor, finalmente decidindo falar sobre caras usando vestidos. É decidir que estudará as relações entre Desventuras em série e Shakespeare no mestrado, depois ver como é melhor analisar a obra de Michael Cunningham, para então perceber que provavelmente falará mesmo é da narrativa labiríntica e da identidade fragmentada nos romances de Bernardo Carvalho – e, por fim, mudar de ideia.

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Procrastinação é ler um livro. É um “só dar uma folheada” que vira “um livro de 390 páginas que você devorou em apenas um dia”. É reler aquele livro favorito de poesia – “se brincar, dá pra ler em meia hora”, você garante a si mesmo. É não saber o que responder quando alguém fala que queria ter tempo para ler o mesmo tanto que você. (Adivinha? Eu deveria estar fazendo outra coisa em vez de ler.)

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É ordenar por cor a sua biblioteca.

Terapia é procrastinação. Procrastinação é emprestar um livro para o terapeuta (um romance sobre um psiquiatra que não viu algo básico, elementar, em seu paciente e que, depois de descobri-lo, somente após alguns anos, não consegue mais tirar aquilo da cabeça) e passar a sessão seguinte explicando que não está escondendo nada do que gostaria de dizer, que às vezes um livro de que gostei é apenas um livro de que gostei.

 

bigodeProcrastinação é deixar o bigode crescer. É mandar snaps de 5 segundos a respeito do cultivo.


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Se você resolve tirar um cochilo, está procrastinando. Mesmo que pra você seja impossível dormir durante o dia, mesmo que você não chegue a ficar aqueles 15 minutinhos de olhos fechados “só para descansar a vista” porque o seu cérebro resolveu descarregar todo um ano de preocupações (entre elas, a de não ouvir o alarme e findar ultrapassando os 15 minutinhos de olhos fechados) só para você se levantar e perceber que ainda faltam 6 minutos para o despertador tocar, mesmo assim você está procrastinando.

Procrastinação é não ser capaz de começar.

É checar o primeiro Gmail. E o segundo Gmail. E as notificações do Facebook. E as notificações do Twitter. E as curtidas recebidas no Instagram. E o que há de novo no Snapchat. Procrastinação é checar novamente o primeiro Gmail e perceber que criou um ciclo interminável para o seu transtorno obsessivo-compulsivo.

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Procrastinação é ter TOC. E tentar reconhecer padrões em tudo que vê, lê, ouve, sente. E tentar terminar toda santa coluna com uma lista com 3 itens, porque o número 3 é importante. (Assim como o número 7, mas como 3 é mais fácil que 7, então ficamos no 3 mesmo.)

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É fazer mais uma xícara de café.

Procrastinação é pensar que só porque escreveu a monografia inteira em 15 dias – há versões da lenda que juram que foi tudo em apenas 1 semana – será capaz de fazer o mesmo com a dissertação.

Saudade também é procrastinação. Ô.

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Procrastinação é “só conferir o primeiro episódio de um seriado novo de que todo mundo está falando” e findar vendo-o inteiro. É True Detective. É Sherlock. É Bates Motel, Hannibal, Orphan Black, Looking, Under The Dome, Orange Is The New Black, Breaking Bad, Walking Dead e Happy Endings. É ver se já saiu o novo episódio de Revenge para baixar e salvar na pasta homônima da área de trabalho, do jeito que mainha gosta. E, às vezes, ouvi-la discorrer sobre todas as reviravoltas da última temporada.

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Procrastinação é a espiral de desespero, aquele fluxo de ansiedade que o paralisa no meio de um exercício da academia ou o acorda no meio da noite com um único pensamento. Invariavelmente um palavrão.

É fazer oito coisas ao mesmo tempo e não terminar nenhuma delas. Exceto ver o gif do gatinho caindo.

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Ficar doente é procrastinação. Procrastinação é: fazer um exame após o outro; tomar medicação por via intravenosa; dividir os dias em períodos de 6, 8 ou 12 horas (e não esquecer os respectivos comprimidos); não conseguir se lembrar de um dia no último semestre em que não estivesse tomando algum remédio; ficar de cama. E ficar de cama o impede de escrever, o que aumenta o estresse por não cumprir o cronograma, o que afeta seu sistema imunológico de modo a aumentar a possibilidade de novas doenças. Voilá, mais um ciclo foi criado.

É pensar no Plano B, aquele que você achou ter jogado no lixo há anos. Ele continua à espreita. Enquanto você pensa em onde estará morando daqui a $ meses, também pensa no plano B. E o leva bem a sério, mesmo que ninguém o veja realmente levando-o a cabo.

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Procrastinação é tentar conciliar a agenda com a do melhor amigo para vê-lo nem que seja por apenas 45 minutos, enquanto come um mac’n’cheese, um hambúrguer de siri ou um bolinho ucraniano. Porque isso ajuda a não pirar. E porque quando ele começa a te comparar com Carmen Sandiego, a coisa está ficando preta.

Procrastinação é não ser capaz de terminar o que começou.

É pegar mais uma xícara de café.

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Três livros que me mandaram indiretas e, assim, me ajudaram a finalmente desempacar.
* A verdade sobre o caso Harry Quebert, de Joël Dicker1
* Aristóteles e Dante Descobrem os Segredos do Universo, de Benjamin Alire Sáenz2
* Caninos em família, de Kevin Wilson 3

  1. “Apavorado com as profecias de Douglas, pus-me a trabalhar feito um louco: começava a escrever às seis da manhã, nunca parava antes das nove ou dez da noite. Passava dias inteiros confinado no escritório, escrevendo sem trégua, sendo arrastado pelo frenesi do desespero, esboçando palavras, alinhavando frases e multiplicando as ideias para o romance. Porém, para minha grande lástima, não produzia nada de aproveitável.” Era exatamente o meu caso, até dois dias atrás.
  2. “Um dia, fiquei sozinho em casa e abri a gaveta. A gaveta com o grande envelope pardo com o nome de Bernardo. Quis abrir. Quis saber todos os segredos contidos ali.” Apenas o nome do autor que estudo. E o nome da pasta de documentos (no computador) em que não conseguia mexer.
  3. ” ‘Vai dar tudo certo’, disse Joseph. / ‘Será?’, indagou Buster. / ‘Você é indestrutível’, disse Joseph. / ‘Sou invencível’, corrigiu Buster. / ‘É insensível à dor.’ / ‘Sou imortal’, disse Buster, e desmaiou, na esperança de que, aonde quer que aquilo o levasse, fosse qual fosse o lugar, que fosse um bom lugar.” O personagem tinha acabado de levar um tiro de um canhão de batata no olho direito. Sem mais para o momento, Meritíssimo