A vida real de João Guilherme Estrella, nascido em bom berço do Leblon e convertido em personagem graúdo da vida bandida carioca, é a história de MEU NOME NÃO É JOHNNY, de Guilherme Fiuza (adaptado para os cinemais brasileiros em 2008 com Selton Melo no papel principal). Filho adorado pelos pais e jovem querido pelos amigos, João entrou pelos anos 80 buscando liberdade a qualquer preço, e desembarcou nos 90 como barão da cocaína pura na Zona Sul do Rio.
João Estrella era um típico jovem de classe média que viveu intensamente sua vida. Inteligente e carismático, ele tinha tudo, menos limites. Nessa pequena sinopse fica claro que a história de João Estrella é de mais um garoto mimado da Zona Sul do Rio de Janeiro com pais bancando suas loucuras. Longe disso. Na narrativa de Guilherme Fiuza vemos que apesar de ser uma pessoa sem limites, João Estrella está longe de ser apenas mais um viciado-mimado.
Diferente de aventuras junkies, nas quais o personagem principal passa por situações loucas e quase surreais, aqui vemos um menino de classe média que pela própria criação aprecia sua liberdade. Nesse ponto vemos que há ambiguidade na falta de limites de João Estrella, não é por ele cometer loucuras pelas drogas, mas essa ilimitação reflete sua paixão pela liberdade, pela vontade de estar com os amigos, com a família (em uma época onde os costumes e laços familiares perderam sua força) e de poder desfrutar de tudo a todo momento.
A narração elegante e sem solavancos, evitando partir para um lado piegas, é o grande trunfo de Fiuza para engrandecer a simpatia que seu personagem principal esbanja. O típico “malandro carioca” ganha novas proporções com João Estrella, capaz de conquistar e agradar a todos e mostrar que nunca foi um mau caráter ou bandido, mas uma pessoa que escolheu algo ilegal para se sustentar. Isso é tão real que João nunca acumulou um patrimônio com essa atividade ilícita (hoje João é produtor musical).
Entrelaçando a história da personagem principal com fatos históricos brasileiros, vemos um retrato da classe média alta do Rio de Janeiro. Isso mesmo, a trama da obra, baseada em fatos reais costurados com ficção, reconstrói os tempos que o Rio de Janeiro vivia no final dos anos 80 e começo dos 90: crises financeiras, transição de um governo ditatorial para democrático, o fim da censura e as pessoas em meio a esse turbilhão de mudanças.
E não é apenas por conta de ser filho de ex-bancário, nascido em berço de ouro, que João teve grandes oportunidades, ele se deixou levar pelo que aparecia em sua frente, de aspirante a músico a viciado em cocaína e em seguida a barão do tráfico. Quando chega o momento de sua redenção, umas das partes mais hilárias do livro, vemos que o personagem era vítima de si mesmo e de tudo que a vida o proporcionou, ou seja, livre árbitro.
Eu não esperava muita coisa quando peguei o livro, mas me surpreendi. Gostei da falta de cronologia de Fiuza na narração, acho que isso deu uma humanizada no livro. Ele falava do que interessa no momento de maior importância dessa coisa. E outra: não conseguimos culpar João. Ele não é vilão, ele não é bandido. Fiuza faz o leitor simpatizar totalmente com João. Ele nunca fez mal a ninguém, a não ser a si mesmo. Assim como o usuário faz mal a si mesmo.
Agora também estou curiosa para ler a biografia de Bussunda que ele escreveu.
Parabéns ao blog pela parceria com a editora Record!