Júnior saiu de casa, largou emprego e família e volta a morar com o pai em um apartamento. No caminho para seu novo/velho lar Júnior é assaltado, perdendo identidade e o pouco dinheiro que lhe restava – se tornando um indigentes. Junto com o pai vive a inquilina Bruna, uma estudante que passa o dia fora revezando seus horários com trabalho e faculdade. A rotina de Júnior se resume a refeições, idas ao bar da esquina e cigarros.

A arte de produzir efeito sem causa, livro de 2008 marca a estreia do autor Lourenço Mutarelli em sua nova editora, a Companhia das Letras, narra um ambiente claustrofóbico que se fecha mais ainda quando o protagonista começa a avaliar sua sanidade e a realidade na qual foi parar.

Um dos traços típicos de Mutarelli é acrescentar um texto dúbio em seus romances, quanto mais nos aprofundamos ou conhecemos a psique de seus personagens, mais duvidamos do que nos é apresentado no começo, ou seja, duvidamos da nossa própria interpretação. No texto está claro: Júnior é um fodido ou, na verdade, ele está fodido da cabeça? Os motivos reais da sua separação, as suas impressões sobre o ambiente em que vive agora e as obsessões que despertam dentro de sua mente, tudo se desenrola e se enrola criando um ciclo autodestrutivo.

Para “auxiliar” o leitor, Mutarelli lança a cada capítulo desenhos misteriosos: ora um cubo dividido em vários quadrados ora uma círculo que lembra uma mapa astral. Logo em seguida os desenhso retornam com mais detalhes  – sinais esses que não fazem sentido, talvez para nosso personagem ou para algum psicólogo/psicanalista. Enquanto esses desenhos povoam às páginas, Júnior lança números de série aleatórios e nomes de partes de um carro quando analisa o ambiente em que está e as pessoas com quem convive.

Conviver não seria a palavra exata quanto mais o tempo passa mais Júnior se afunda em sua apatia e seus pensamentos – entrecortados entre sua lembranças e seu presente automático. Júnior se torna mais recluso e fechado (tanto quanto o ambiente) quando misteriosos pacotes chegam à residência, todos relacionados a mensagens sobre a morte da esposa do escritor William Burroughs ((William Burroughs foi um escritor beat, um dos seus maiores sucessos é Almoço Nu, ele matou a mulher em 1951, alegando ser um acidente)) .

A paranóia cresce e o personagem começa a duvidar sobre a verossimilidade das pessoas com quem convive, todas soam como cópias mal-feitas da realidade (se é que essa sempre existiu). A psicose crescente de Júnior simboliza o título do livro, até então misterioso, o que é um efeito sem causa? De onde surgiu a falha das faculdades mentais de Júnior ou a realidade dele é tão deturpada quanto quer que acreditemos? As situações “cotidianas” tomam proporções ainda maiores, culminando em retratos absurdos que ilustram e focam as obsessões do personagem. Ao avançar na leitura, podemos perceber que Júnior precisa se concentrar para descobrir o nome de coisas mundanas tentando fazer ligações óbvias como “serve para comer”, “parece comprido”, etc.

A causa misteriosa quebra todo o ambiente criado por Mutarelli, ou seja, ele nos sufocou e focou em um personagem delirante, em um ambiente fechado e hostil durante páginas e páginas. O autor estaria fugindo de um caos para uma explicação simplista e naturalista? Não, como primeiro livro de Mutarelli descrito na terceira pessoa (Nada Me Faltará é composto apenas por falas e O natimorto é narrado em primeira pessoa), o narrador nos mostrou tudo o que tinha em palavras – inclusive na abertura do livro -, mas não fomos atentos o suficiente para separar realidade e fantasia.