Através desse artigo dividido em três partes, irei escrever sobre a origem dos romances policiais até suas adaptações cinematográficas onde, de maneira brusca e nova, surgiu uma maneira de filmar que quebrou alguns paradigmas da indústria, os filmes noir. E na derradeira parte fazer um apanhado sobre a homenagem e inspiração, tantos dos romances quanto dos filmes, nos dias de hoje.

O romance policial surge quando casos policiais são retratados nas narrativas dos livros, antes dominados pelos romances de aventura, trazendo um grande mistério e uma solução lógica no seu desfecho, diferindo dos romances de aventura onde a luta entre o bem e o mal era o foco e quem ganhasse recebia o grande prêmio: uma fortuna ou condecoração. No romance policial esse prêmio seria apenas a solução do caso, sem grandes riquezas por trás ou um objetivo além, exceto como conseqüência do próprio caso, o que dificilmente acontecia.

De acordo com Paulo de Medeiros e Albuquerque (1979, p. 127) “[…] aquele que criou o primeiro detetive que resolva os casos com auxilio da inteligência e lógica, foi um americano: o pai do ‘policial’, Edgard Allan Poe.”.Poe é considerado o criador do romance policial, ou seja, o gênero surgiu na América do Norte, embora as narrativas de Poe sejam ambientadas em Paris. Mas logo depois foi exportado para a Europa (principalmente Inglaterra). Com o aparecimento de Conan Doyle e seu Sherlock Holmes, o romance policial definitivamente cruzou o oceano. Só voltaria a se firmar nos Estados Unidos tempos depois, e mesmo assim um pouco fraco por não trazer inovações e apenas adaptar nomes de contos “westerns” para a cidade grande.

O termo romance policial, de acordo com Paulo de Medeiros e Albuquerque, talvez não seja o mais adequado, pois nem sempre é um policial ou um membro da polícia quem resolve o mistério ou está presente em grande parte da narrativa. Nesse caso, romance criminal ou de mistério seria um termo mais correto. Dentro desse gênero foram surgindo diversos subgêneros, classificados por seu cunho narrativo; romance psicológico, os famosos thrillers americanos e assim sucessivamente. Gênero e subgêneros que acabaram sendo usados para adaptações cinematográficas ou televisivas. Depois de algum tempo os romances policiais foram se perdendo dentro do mundo dos mistérios e acabavam por criar aventuras policiais nas quais o mistério e a violência casam, tornando as narrativas, além de envolventes, excitantes. Esse período se deu no pós-guerra, quando os romances começaram a ficar mais “pesados”, não apenas criando narrativas violentas como também críticas. Essas críticas davam ao aparecimento de gangsteres nos Estados Unidos depois que foi declarada a Lei Seca. O contrabando de bebidas foi o que fortaleceu a máfia e assim abriu caminho para o subgênero de gangsteres e inspiração para grandes romances como “O Chefão”, de Mario Puzzo (que deu origem ao filme “O Poderoso Chefão” de Francis Ford Coppola, com Marlon Branco, Al Pacino, entre outros).

Os personagens desses romances, chamados de detetives, vêm de um leque rico de qualidades e defeitos que os tornaram únicos, como maneiras atípicas de trabalho, fugindo do usual que a polícia faz: levantar suspeitos e ligações. Esses detetives iam, além disso, tornando a narrativa interessante, mostrando o raciocínio rápido e métodos de trabalho seguidos de lógica e conhecimento. Um bom detetive tem que, além de ser inteligente e astuto, saber usar seus conhecimentos e suas observações peculiares para descobrir o assassino, o ladrão, o malfeitor de seu caso.

Podemos separar esses personagens em duas categorias: os frios e calculistas e os aventureiros. Para os frios, a vida de resolver mistérios é levada até a morte, sem apresentar dados pessoais sobre si mesmo e evitando romances. De acordo com Paulo de Medeiros e Albuquerque (1979, p.122) “[…] esses detetives que se tornaram famosos viviam sem amor, ou melhor, sem caso amoroso de qualquer espécie […]”. Nesses casos vemos Sherlock Holmes e Hercule Poirot, um dos detetives mais famosos da escritora Ágatha Christie, encabeçando a lista. Para manter um raciocínio claro e nítido nada pode atrapalhá-los, nem mesmo um amor. Interesses amorosos são retirados de suas tramas, assim como parentes e família. Em contraponto, para Albuquerque, esses personagens acabam sendo mais excêntricos, pois acabam tendo manias e vícios: Sherlock Holmes tomava tóxicos e Hercule Poirot era vaidoso e muito ligado a sua aparência. Nesse ponto os assistentes eram sempre aqueles que fortaleciam a imagem de impenetráveis e insensíveis de seus detetives, mostrando que o ponto fraco deles com certeza não era ligado a relações amorosas.

Do outro lado vemos os detetives que sempre tendem a ser visitantes no terreno do amor, transformando assim o romance em uma aventura, uma vez que existe um outro ser humano para se preocuparem, mas que muitas vezes têm ligação com o caso. Nesses casos os romances casuais (ou affairs) tornam-se pontos que podem atrasar ou comprometer o julgamento do detetive quanto ao caso, esquecendo de incluir a pessoa com quem está envolvido na lista de suspeitos. Esses perigos apresentados podem ser vistos nas aventuras de Mike Shayne, que, além de casado, ainda mantém relações com outras mulheres, ou até mesmo Sam Spade, de “O Falcão Maltês”, que embarca em uma aventura sexual. E por que não falar de James Bond, que a cada aventura está acompanhado de mulheres diferentes.

Na próxima semana: O surgimento dos filmes noir.

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