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Liv Ullmann (Persona, 1966) é uma atriz norueguesa que durante anos foi musa suprema e amante de Ingmar Bergman, além de mãe de uma das filhas. do diretor Trabalhou como diretora em quatro longas-metragens. Ano passado deu o ar da graça no Brasil para um workshop na cinemateca de São Paulo e seu livro “Mutações” foi relançado.

A vida de atriz passa por transformações ou máscaras, assim como seus personagens? Liv Ullmann viveu diversas vidas nos filmes e peças que atuou. Intrínseca de mutações na sua existência a ajudaram construir seus personagens (verdades e sentimentos saindo através de personagens) e no crescimento como mulher e o quão difícil é assumir uma identidade feminina.

Todavia, iremos mergulhar no complexo do subconsciente de um artista nesse livro (que não pode simplesmente ser chamado de autobiografia). Nas quatro partes que dividem o livro seremos tragados pela experiência de medos, amores, sucesso e maternidade relatados de maneira sincera.

O amor descrito, após perceber que a guerra de egos entre Ingmar e ela era intensa, é quase perfeito. Nesse momento, um dos mais tocantes do livro, Liv descreve como começou a compreender o diretor sueco. Escreveu uma carta, um ano após o rompimento, contando uma pequena história, narrada em terceira pessoa, sobre uma mulher que observa seu amor crescer cada vez mais. Quanto mais ele se afasta, mais ela o conhece e consegue se libertar daquela afecção.

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“Aos poucos, dentro de si, despertou uma compreensão com relação a ele. Quanto mais ele se afastava dela, melhor ela o entendia – como se a distância lhe desse lucidez.
(…)

Tentou lembrar-se de como ela era, ao chegar à ilha, cinco anos antes.

Algo tinha sido esmagado, e algo tornara-se mais vivo. Passara por uma mutação.

E, quando a amargura, o ódio e o desespero tinham desaparecido, ela teve certeza de que experimentara o amor e se enriquecera.

Mas nunca conseguiria falar sobre aquilo.

Vira o interior de outra pessoa, e estava cheia de ternura pelo que descobrira.”

Os dois continuaram amigos e companheiros de trabalho, juntos fizeram “Cenas de um Casamento” e “Saraband”, duas produções que tratam do fim de um relacionamento (autobiográfico tanto para Bergman quanto para Ullmann).

Muitos descrevem a expressão de Liv Ullmann como angustiada, um rosto que transborda as dores, tristezas e anseios. Em determinada parte do livro, a própria atriz descreve que não existe estado de felicidade pleno.

Liv Ullmann

A forma como Liv descreve suas memórias carrega um tom nostálgico, de algo que não vivenciamos, como se estivesse ao nosso lado dizendo palavra por palavra que brotavam de seu pensamento. Evitando ao máximo um tom de diário.

“Mutações” trata de uma mulher não apenas frágil, não apenas atriz, não apenas mãe ou amante., mas de uma procura sobre sua identidade onde a palavra “apenas” não emprega significado dentre todas as vidas que se pode viver.

Este livro é dedicado a sua única filha Linn.

“Você compreende, querida Linn – lá fora, com as crianças, com quem você ri, e os jogos secretos que faz sozinha, e os perfumes e as cores e toda a beleza que ainda são seu mundo -, você compreende que eu não tenho nenhuma razão válida para não correr até você, aí fora, e viver sua vida?

Talvez seja o reino perdido da infância, que eu vivo constantemente te procurando.”

ULLMANN, Liv. Mutações. São Paulo: Editora Cosac Naify, 2008. 224 Págs. Preço sugerido: R$ 45,00.

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