Tive a oportunidade de ir a um lançamento da Não Editora aqui no Rio de Janeiro, onde os autores gaúchos participaram no nosso Clube da Leitura. Entre todas as visitas e autores e novos livros, e com o salário saindo só no dia seguinte, fica difícil escolher só alguns livros. Tive a chance de perguntar pra um dos autores:

“- Esse é o seu livro, não?

– É, um romance.

– Sobre o que?

– Um faroeste com zumbis.”

Estava falando com Antônio Xerxenersky, que foi simpático o bastante pra não comentar da minha cara de susto. Um faroeste com zumbis? Nunca assisti a um bom faroeste, e só me lembro de ter visto um filme de zumbis, na Sessão da Tarde e há um bom tempo atrás. E isso tudo junto em um livro?

Dei uma folheada e achei uma página meio estranha. “O que é isso?”. “Ah, nessa hora o computador do autor pegou vírus. O livro também é de um cara escrevendo um faroeste com zumbis. Mas, na verdade, acho que no fundo isso é tudo desculpa pra escrever”. E que desculpa. Mesmo não sendo fã dos faroestes e dos zumbis, não resisti à idéia de ver o que tinha sido feito com aquela desculpa pra escrever, e definitivamente não me arrependi.

A metalinguagem, o deserto, a areia, as referências, o medo e o tempo e os mortos que retornam à vida são ingredientes que, por mais que a primeira vista pareçam incongruentes, conseguem ser ligados sem exagero, e deixam entrever lá no fundo que nenhum deles é de fato o personagem principal da história, que gira em torno da rivalidade das famílias Ramírez e Marlowes na cidade de Mavrak. Mesmo se passando em um tempo no qual a importância era o que diziam os olhos, e não as palavras, o modo de usar as palavras de Xerxenersky dá conta do recado: capítulos diferentes com modos de descrição que podem ser lineares, ou com pensamentos enfrentando um ao outro, ou como quem vê de fora uma descrição de cena. E, em todos os momentos, com um quê daquela vontade de saber o que está se passando de verdade naquela cidadezinha esquecida no meio do deserto.

É um livro longo o bastante pra não ser lido de uma tacada só, mas infelizmente curto o bastante pra pensar que não deu pra passar tempo o bastante com ele. Dá vontade de mais. Dá vontade de explorar mais os porões da cidade e as estranhas relações de pais e filhos que vem desde o velho oeste e ainda estão pendentes – algumas relações que podem dar um choque maior do que a visão de um zumbi insano vindo em sua direção.

Por último, e essa é uma das qualidades que eu mais gosto em certos livros, ele tem um final que inquieta. Que quando você termina, parece que descobre um buraco que não havia lá antes, algo que faz com que você passe os próximos vinte minutos pensando no que é que aconteceu. Algo assim, talvez meio indefinido, talvez meio inquietante. Uma sensação talvez um pouco estranha. Como areia nos dentes.

Areia nos dentes – Antônio Xerxenesky
Não Editora
Páginas: 144
Preço: R$25,00
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