‘1984’ não é apenas mais um livro sobre política, mas uma metáfora do mundo que estamos inexoravelmente construindo. Invasão de privacidade, avanços tecnológicos que propiciam o controle total dos indivíduos, destruição ou manipulação da memória histórica dos povos e guerras para assegurar a paz já fazem parte da realidade. Se essa realidade caminhar para o cenário antevisto em ‘1984’, o indivíduo não terá qualquer defesa. Aí reside a importância de se ler Orwell, porque seus escritos são capazes de alertar as gerações presentes e futuras do perigo que correm e de mobilizá-las pela humanização do mundo.

Luciano: Paranóia. Totalitarismo. As duas palavras básicas para definir 1984, à primeira vista. Mas Orwell fez mais do que escrever o que qualquer idiota sabia. Fez um previsão que é assustadora justamente por não ser exata: é o quanto nossa realidade tangencia o mundo regido pelo Grande Irmão e gerenciado pelo partido- um mundo em que não existe individualidade, não existe privacidade e no qual não se pode confiar sequer nos próprios filhos- que assusta. A previsão de Orwell paira como uma sombra no mundo pós-moderno, sempre um futuro possível e um passado palpável, e é por isso que 1984 ainda continua atual- 61 anos depois de sua publicação e 26 anos depois de seu título.

Liv: Mais um livro da série: “você precisa ler isso antes de morrer”. Pare com qualquer tipo de preconceito com a sinopse e dê uma chance a novos aprendizados sobre a sociedade e a sua realidade. É uma leitura excelente, envolvente e empolgante. E você encontra uns motivos bem interessantes para não gostar de Big Brother. *insira um trocadilho aqui*

Kika: Pense num tempo em que não se pode confiar nos livros, jornais, programas de TV. Imagine um Ministério cujo principal objetivo seja alterar os registros do passado. Agora imagine que você é a única pessoa que se deu conta disso. Essa é a atmosfera de 1984, a obra prima de George Orwell. Do Big Brother à novilingua, 1984 é uma obra claustrofóbica; na qual cada passagem dá motivo para reflexão sobre passado, presente e futuro, sobre o perigo da censura, sobre a ditadura do pensamento. Quer um exemplo? no mundo de 1984, nada era expressamente proibido…

Izze: Considero que o mais assustador de 1984 sejam os jovens: crianças que denunciavam os pais por suspeita de estarem “pensando” contra O Partido. Algo assustador, onde não havia uma “ordem”, qualquer um poderia sofrer dessa acusação por recusar algo à uma criança. 1984 é um livro sobre um futuro que, ao pensarmos bem, possui mais coisas em comum com o nosso mundo do que se pode imaginar. Na verdade, são fases pelas quais nosso mundo passou, mas elevadas ao extremo: autoritário, inseguro, mentiroso. Não há passado, e parece que também não há futuro. E a tecnologia, que aqui vemos como libertadora, lá mantém a desorientação orientada, e a desinformação bem informada. Não tem como não se assustar ao ler 1984.

Lucas: O programa Big Brother não tem esse nome a toa. A referência do título surgiu nesse livro, onde o Grande Irmão a todos vigia e faz com que cada passo que a pessoa dê esteja devidamente registrado e que as autoridades da distópica realidade de 1984 saibam exatamente onde andam e o que fazem as pessoas. A tensão da constante vigilância do Grande Irmão e todo o estudo do funcionamento do Estado e de seus mecanismos de controle, monitoramento, organização e punição fazem de 1984 uma obra clássica, daquelas obrigatórias mesmo. O método de escrita de Orwell decanta os elementos da história e da História até seus caracteres mais básicos, porém basilares; revelando, do mais simples ao mais complexo, as entranhas da sociedade totalitária, elevada a um nível superior pela introdução de tecnologias que eram escassas na época da publicação do livro (1949), mas que se tornam cada vez mais cotidianas em nossos dias. Ou seja, se não bastasse o panorama que ele traça acerca do totalitarismo e da relação do Estado com a sociedade, Orwell “profetizou” várias mudanças que aconteceram e acontecem a cada dia.

Pips: A segurança é um método para controlar as massas? Hoje em dias todos os lugares são equipados com câmera para termos o sentimento de segurança. Todavia, até quando esses serão as nossas armas de defesa e não de aprisionamento? O Grande Irmão tudo vê e tudo sabe, ele controla cada movimento e todas as pessoas fazem parte de uma grande máquina do estado. Cada uma representa a engranagem que faz o sistema funciona. Mas até quando? A história humana prova que o totalitarismo tem de ser sangrento e repressor. Porém, se você já nasce dentro desse organismo não sente a diferença ou não sabe o que é liberdade. A obra 1984 previu o que muitos achavam que seria uma fantasia – um ficção científica. Em tempos atuais onde admirar pessoas presas dentro de uma casa – vigiadas 24hrs por dia – é uma forma de entretenimento, podemos perder nossa liberdade. Antes a de autonomia, depois a de expressão, até o livre árbitrio se exitinguir e ficarmos presos em um cárcere estatal que soa como privado, ou seja, sua sensação de segurança nada mais é do que a sentença de que nada é seu, e Deus, existente ou não, tornou-se um homem que diz zelar pela conduta e bons modos, mas apenas quer que você faça parte do seu mundo onde pensar não é opção.

Tati (blog Vá Ler um Livro): Winston Smith tem o complicado papel de modificar dados e jogar os reais em um “incinerador da memória” e assim alterar a história e a literatura para fazer com que o Partido Ingsoc tenha verdade absoluta. “Uma sociedade perfeita”: é essa a ideia que é passada à população.

Televisões como vigias (como se fossem câmeras que é possível ver e ser visto), propagandas controladoras, literatura alterada e todo o resto dão uma visão á sociedade de que nada está errado. Winston que, inclusive, é membro antigo do partido, começa a sentir a pressão da falta de liberdade e a erroneidade de transmitir pensamentos que obrigatoriamente se tornem verdade onipotente para a população. Não se pode falar mal do governo, não há privacidade e há até uma nova língua. Controlar os atos, a fala, o passado e a construção da sociedade faz com que até seus futuros pensamentos sejam controlados.

Podemos dizer então que Orwell escreveu um livro que, mais que uma crítica política da sua época, é paradoxalmente atemporal. “Mil novecentos e oitenta e quatro” foi escrito em 1948, apenas dez anos depois da invenção da televisão (e dois anos antes da mesma chegar ao Brasil). Há rumores, inclusive, que seu título foi pensado para mostrar o quanto a narrativa pode ser localizada em qualquer espaço e tempo.

Aliás a narrativa não é muito diferente da atual denominada “indústria cultural”: uma cultura convertida em mercadoria que, por sua vez, é fruto da sociedade capitalista liberal. E esta sociedade, que impõe o uso de um indivíduo real como um indivíduo de estatística (que representa uma massa e não um ser único), também sofre pela alienação causada pelo sistema que criou. Nessa “indústria cultural” há, como um todo, um conformismo social por meio da padronização de comportamentos, criando assim necessidades superficiais e transformando o homem em apenas consumidor do que lhe é mostrado, dirigido e disciplinado. Essa é a história do livro ou da sua realidade?

Saiba mais sobre essa e outras obras no site da Companhia das Letras

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