Tony Bellotto é guitarrista da banda Titãs e desde 1995 se aventura na literatura. De lá pra cá publicou Bellini e a Esfinge, Bellini e os Demônios, Bellini e os Espíritos, BR 163Os  Insones e O Livro do Guitarrista. No Buraco, lançado pela Companhia das Letras agora em outubro, é seu livro mais pessoal, narrando a história de um guitarrista em crise de identidade.

Teo Zanquis chegou aos cinquenta anos de idade e está com a cabeça enterrada na praia de Ipanema – que descreve literalmente seu momento na vida: no buraco. Em meio a essa empreitada de avestruz ele ouve diversos desconhecidos conversando, sobre os mais variados assuntos, que o remetem a lembranças de sua trajetória: do começo de sua one hit band, das viagens, das drogas, dos sonhos e da decadência.

O personagem destila seu humor ácido para detonar as influências em sua geração e ao comentar sobre a indústria fonográfica; Teo mostra rancor às sanguessugas por trás da produção de bandas e ídolos de todas as épocas e, assim como a mídia em geral, os usa como material de lucro até esgotarem a fonte – incluindo os diversos revivals que ocorrem quando os anos 80 voltam a moda. Nessa mesma linha o ex-guitarrista disserta sobre as bandas do seu período, analisando o comportamento e traçando um comparativo da sua época de rockstar – e ídolo efêmero – até os conjuntos mais famosos que beiram os anos 2000.

Em sua narrativa ágil, assim como sua vida que passou muito rápido, ele descreve suas aventuras sexuais com duas ou três pessoas e até mesmo uma freira. Além de toda essa epopéia sexual, Teo demonstra um grande conhecimento filosófico e pop, misturando seu apreço por lendas da música como Jimi Hendrix, a influência de Pollack na sua técnica de guitarra e suas leituras como Schopenhauer. Aliás, em dado momento ele revela que sempre quis escrever um livro sem um tema específico.

(…) comecei a desenvolver a ideia de escrever. Ideia estúpida, concordo. Escrever pra quê? Ninguém lê.

É divertido seguir os pensamentos do personagem enquanto ele ouve alguém na praia falar sobre palavras com u, todas de cunho sexual, – e traçando um paralelo com a letra xis e os sinônimos para o órgão sexual feminino – tudo isso somado a citações literárias e linguisticas.

Xenxa, tem dó. Guimarães ginecológico? Puta que me pariu. Eu mereço. Você também.

E se por um lado existe toda uma análise do cenário em que esteve no auge, o personagem descreve seu presente: a falta de dinheiro, o descaso com as coisas, a procura de drogas – antes fáceis de conseguir – e seu relacionamento com a vendedora coreana de uma loja de discos chamada Lien. Ela e seu misterioso irmão – que carrega consigo um  conteúdo misterioso dentro de seu pen-drive (apelidado de cannoli) – transformarão a outra metade do livro em uma verdadeira queda em um abismo.

Se engana quem acha que Teo é um personagem amável, apesar da sua história cheia de conteúdo e passagens hilárias, há momentos em que sua personalidade é ambivalente e torna-se irritante quando sai de sua narrativa destrutiva e parte para a erudita, ele mesmo nota isso e se censura, ou quando descreve suas aventuras junkies mostrando que era apenas mais um no meio dos roqueiros oitentistas.

Hilário, ácido e comovente, No Buraco é crítico e emocionante, uma visão sobre o envelhecimento, esquecimento e o escárnio com o cenário pop e no mundo.

O Meia Palavra fez 10 Perguntas e Meia para Tony no mês de Julho, confira na íntegra aqui.

BELLOTTO, Tony. No Buraco. Companhia das Letras, 2010. 250 págs. Preço sugerido: R$ 43,00