Truman Capote escreveu inúmeros contos, além da novela Breakfast at Tiffany’s (Bonequinha de Luxo), mas talvez sua obra mais polêmica e arrasadora tenha sido “A Sangue Frio”, publicado em livro pela primeira vez no ano de 1966 (antes, em 65, apresentados em capítulos na revista “The New Yorker”).

O livro conta a história de um trágico evento que ocorreu em Holocomb (Kansas), em 1959: Uma família de quatro membros, sendo mãe, pai e dois filhos, foram brutalmente assassinados por duas pessoas.

Um dos muitos debates que a obra gera é o limite entre o ficcional e o documental. O livro foi tido pelo autor como um “romance de não-ficção” e, no mínimo, trouxe originalidade ao jornalismo. Baseado em reportagens, entrevistas e convivência que Capote teve com os habitantes da cidade, o autor dispensou o uso de gravador e usou sua hábil memória para construir essa narrativa.

A estrutura na qual o texto se desenvolve tem uma grande semelhança com a ficção. Truman Capote mostra aspectos psicológicos e narra momentos da família Clutter antes do assassinato, desde idas à igreja, desejos dos filhos, momentos à mesa e até a depressão na qual a Sra. Clutter sofria. Os “personagens” são tão bem detalhados e conhecidos pelo autor que chegam a parecer mesmo inventados. O que torna a obra brilhante é justamente o fato de não terem sido. O autor não conheceu nenhum dos Clutter’s em vida, mas narra-s tão intimamente que parecem terem sido criados por ele mesmo.

Assim como a família Clutter, os assassinos, Richard Hickock e, em especial, Perry Smith, também são muito bem retratados. Capote conheceu ambos e os entrevistou. No livro, até mesmo a infância deles nos é apresentada. Ainda existem todos os moradores da cidade, que nunca antes haviam vivido momento parecido. Capote revela medos, ironias e todos os tipos de sentimentos das pessoas descritas nas linhas do livro.

É bom lembrar também que o autor chegou à Holocomb e iniciou suas investigações um mês após os assassinatos, quando o trauma e feridas da população ainda eram recentes e, certamente, depoimentos muito mais acalorados e vivos.

Para alguns, o fato do autor não ter feito nenhum tipo de apontamento ou gravação faz com que a obra perca um pouco de sua veracidade, mesmo que não perca sua importância e não tenha aberto as portas para o New Journalism. A minha opinião sobre o assunto é bem simples: Com registro ou sem, um documentário ou texto jornalístico sempre carrega uma opinião e uma pretensão. Temos os fatos e então temos a nossa realidade sobre eles. E mesmo que o autor tenha, de fato, tido relações sexuais com um dos assassinos, ou que tenha dado maior importância a alguns fatos e deixado outros de lado, não seria um gravador ligado que mudaria tudo.

A Sangue Frio não é apenas a descrição de um assassinato. A brutalidade e violência não são o que torna o assunto tão fascinante ao leitor, mas, muito mais do que isso: O livro aborda a psicologia humana, sentimentos, frustrações e todo tipo de impulso que nos faz agir. Não é a forma como os dados foram registrados que importam, mas sim como as observações e análises de Capote geram um texto interessante, capaz de ligar fatos e ser fiel a um acontecimento.

Autor(es): Truman Capote
Tradução: Sergio Flaskman
Páginas:438 pág.
Preço: R$ 59,50

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