Mês passado, na minha última coluna, eu comecei a relacionar os sete pecados capitais com os diferentes tipos de leitores, mostrando como carregar cada um deles pode mudar uma leitura. Comentei sobre a preguiça, a gula e a avareza. A intenção desse artigo não era (e nem é agora) tentar “purificar” o leitor, mas sim pensar de forma reflexiva sobre vícios e atitudes que podemos ter no cotidiano que, se não ficarmos atentos, podem nos fazer perder uma boa leitura, ou o prazer de ler.

Sendo assim, agora pretendo falar um pouco sobre a ira, a inveja, a soberba e a luxúria. O primeiro deles talvez seja o mais fácil de explicar: Ira é um sentimento intenso de raiva e rancor que atinge o psicológico e pode causar até mesmo momentos de descontrole.

 É indicado e óbvio que você não leia nesse estado psicológico, a não ser que isso te acalme. Uma situação mais comum, no entanto, é o leitor que inicia uma leitura, mesmo que por vontade própria e não obrigação, mas por algum motivo, acaba não gostando da narrativa que está deparado. Quando isso acontece comigo, eu costumo seguir uma regra particular um pouco cruel, estabelecendo um limite seja de páginas ou capítulos a serem lidos. Se até a chegada desse momento a narrativa em nada me agradar ou sequer despertar curiosidade, desisto da leitura. Talvez essa seja uma decisão radical e eu sei que muitos acham que só é possível falar se um livro é bom ou ruim depois de ler ele por inteiro. O que eu quero dizer é que é permitido abandonar uma leitura. Se você está lendo por prazer e a história não te agrada, por que continuar a travar uma guerra consigo? Por que transformar isso em obrigação? Aos leitores mais pacientes, certamente será um prazer continuar a história e ver ela vai te fazer mudar de ideia, mas se você é do tipo “pavio curto” e só vai ficar irritado com a situação, o melhor é desistir.

Já a inveja e a soberba são pecados que, apesar de diferentes, se relacionam. O primeiro, a meu ver, é um sentimento movido pelo segundo. O soberbo não agüenta o fato de que alguém pode ser melhor que ele, isso afeta sua vaidade, e ele passa a sentir inveja e querer aquilo que acredita que o outro tem e ele não. Esses dois pecados existem nas pessoas que carregam o orgulho. O leitor soberbo, por exemplo, sempre acredita que entende mais de um assunto. Sua forte convicção e orgulho podem limitar novas experiências e conhecimento. Já o leitor invejoso pode até ser um pouco ingênuo: Da mesma forma que o leitor guloso, em certo aspecto, o leitor invejoso quer ler vários livros ao mesmo tempo. Ele quer ser tão ou mais conhecedor do que os amigos da rodinha de literatura. O problema é que ele entra nessa disputa, que só existe em sua cabeça, somente por orgulho e não necessariamente por prazer em desafiar seus limites e traçar metas de leitura. Tanto o leitor excessivamente soberbo ou invejoso não precisa realmente ler ou assistir aquele film: Ele só precisa demonstrar que o fez. Eles podem ter a coleção unicorn gold plus de todas as tirinhas do Calvin sem nunca ter encostado nelas.

Por fim, o último pecado (colocado propositalmente aqui), e eu sei que vocês estão esperando por ele: A luxúria. Eu deixei esse pecado por último não por achar ele o mais importante, mas sim porque fiquei um bom tempo pensando em uma relação entre ele e o leitor.  Eu poderia encerrar o assunto com meu humor duvidoso e dizer que o leitor que carrega o pecado da luxúria é aquele que vai adorar citar Freud, ler A Casa das Belas Adormecidas e O Complexo de Portnoy, no entanto, resolvi me arriscar em uma explicação um pouco mais estendida e possivelmente nonsense. 

A luxúria é tipicamente definida como  sendo o pensamento excessivo ou desejo de natureza sexual, ou ainda, mais genericamente, uma paixão excessiva do outro ao ponto de se assumir um caráter auto indulgente. Dessa forma, comparando literatura aos desejos carnais, o leitor luxurioso é aquele que só pensa em livros, procura fotos de pessoas com livros, tem o desejo absoluto de colocar suas leituras em dia e se sente muito bem ao ler. Qual o problema com esse leitor? Na minha opinião, nenhum.

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