O amor escrito na ótica de 20 jovens autores através de 20 contos. Essa é a proposta de Flávia Iriarte e Daniel Russell Ribas, organizadores de A polêmica vida do amor. A palavra “polêmica” é usada em excesso na mídia e televisão, como algo que remete a assuntos delicados e escândalos. O livro não deixa de ser isso, com alguns contos que “tocam em feridas” sociais, mas a palavra ainda entra com muito do seu sentido original: Promover uma discussão e controvérsias.

Em cada conto, o amor surge de diferentes formas e papéis. Em um lugar, é o depoimento apaixonado de um personagem, em outro, é a falta dele que se torna o centro da história. Em torno de cada narrativa, a família, instituições, sociedade e lugares também são explorados.

Seria difícil dizer que, em meio a tantas formas e estilos de abordar o mesmo tema, eu tenha tido a mesma reação positiva ou negativa.  Diferente da opinião de Marcelino Freire, que fez a orelha do volume, não senti que a obra parece ser escrita por um mesmo autor, de forma que tudo se completa. Pelo contrário: por mais que, por exemplo, tenha passado por vários contos que se tratam de um depoimento que é um desabafo de um personagem com o leitor, cada um foi bem diferente do outro.  Ao mesmo tempo, de tão diferentes que são, acredito que falando um pouco mais dos contos que gostei, consigo dar uma noção do que é essa antologia. Em todo o resto, a apresentação de Marcelino Freire é diferente porque não é uma sinopse, e sim uma declaração aberta e apaixonada sobre a opinião do autor a respeito do livro, o que chama muito mais atenção e curiosidade para a leitura. O livro é uma pluralidade e um misturar incessante de vozes e opiniões. Diante dela, quatro contos me chamaram mais atenção do que tantos outros e alguns que não gostei.

“Machine Gun”, de Rodrigo Vrech, é o carnaval retratado por duas pessoas, homem e mulher, que ainda não se conhecem. Ambos descobrem sua sexualidade durante o feriado, cada um da sua forma. O texto é bem simples e com muita fluidez de pensamento, sem falar que a história é interessante por si só. O autor consegue vagar por um certo humor na fala inicial do personagem masculino, que é um “pegador” que não entende sua atração pelo amigo, até o drama íntimo da descoberta feminina e o final bastante bruto, quando ambos se encontram. “Machine Gun” mostra o amor recém descoberto de duas meninas e o disfarçado de admiração entre um homem e seu melhor amigo.

“Àquela que Passa”, de Joana Souza, é baseado em A une passante, de Charles Baudelaire. A autora não é a única do livro que escreve do ponto de vista do sexo oposto. No caso, conhecemos um personagem que se interessa à primeira vista por uma desconhecida na rua e resolve segui-la. É o amor ao desconhecido. Quando começa a conversar com seu objeto de admiração, existe uma súbita decepção e a vontade de não querer saber nada. Assim como “Machine Gun”, a autora consegue revelar um final surpreendente.

Scarambone, de Anna Beatriz Mattos, é a história de um amor inatingível, ou, melhor dizendo, uma relação com uma mulher durona que, em alguns poucos instantes, deixa um lado sensível e que pede proteção aparecer. “Havia algumas noites em que, trago após estrago ela se entornava e se expelia para um mundo suspenso, leve e sensível.”. No relato do relacionamento, a autora captura os instantes em que a personagem tenta desvendar essa pessoa com quem se relaciona. As brincadeiras com espaçamentos, tachados, letras maiúsculas e repetições de palavras funcionam bem no texto, que parece que teve cada frase pensada e muito bem articulada.

Já “All of the Ways”, de Jonas Abarral, mistura trechos da música de mesmo título do Interpol para contar a vida de um personagem que desde muito cedo percebeu sua paixão por pernas. Tudo soa muito natural na forma como o autor escreve: as observações detalhadas da infância do personagem que começava a desenhar qualquer pessoa ou animal sempre pela perna, a forma como ele descia sempre uma estação de ônibus antes do seu ponto só para observar as pernas das pessoas que corriam na ciclovia.

Difícil falar de quatro entre vinte que escreveram sem que isso soe um desmerecimento aos outros autores, mas qualquer leitura é pessoal, ainda mais quando a proposta é abordar um tema tão pessoal na vida de cada um. Acredito que cada leitor vai se identificar com textos diferentes, passar batido por uns tantos e até antipatizar com um ou outro. O livro é cheio de histórias e opiniões fortes, polêmico em todos os sentidos, como disse no início. E a polêmica, assim como o amor, gera essa diversidade de opiniões.

Título: A polêmica vida do amor
Organizado por: Flávia Iriarte e Daniel Russell Ribas
Preço: R$35,00
Páginas: 181

Autores: Antônio LaCarne, Joana Souza, Anna Beatriz Mattos, Cesar Cardoso, João Lima, Paula Cajaty, Roberto Pedretti, Roberto Robalinho, Rodrigo Vrech, Thiago Poggio Pádua, Valentina Silva Ferreira, Viviane Roux, Luciano Prado da Silva, Rafael Rodrigues, Aline Miranda, Jonas Arrabal, Paulo Vitor Grossi, Beatriz Castanheira, Marcelo Asth, Sidiney Breguêdo.

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