O diálogo (abaixo), que se dá entre uma senhora e sua neta na extinta série Commander in Chief foi citado por Anita Sarkeesian em um de seus vídeos. Gostaria de dizer que a moça é conhecida tão somente por discutir em seu canal do YouTube, Feminist Frequency, diversas questões sobre a representação de gêneros e minorias na cultura pop. Gostaria muito. No entanto, sua aparição no Guardian, no Wired, no Salon e no Jezebel foi devida à trollagem em massa sofrida após ela pedir ajuda num site de crowdfunding para a produção de uma série de vídeos sobre estereótipos femininos em videogames.

 

– Olha, só porque isso importa para mamãe, não quer dizer que importe para mim. Quero dizer: não sou nenhum feminista. – Então, você não acredita que mulheres deveriam ter direitos iguais aos dos homens… – Bem, claro que sim. É só que… – Deixe-me sugerir, então, minha querida, que você pesquise a definição de feminista.

 

Algo que ela constantemente faz em seus vídeos é pedir aos roteiristas que criem personagens que sejam não só mulheres, mas seres humanos completos. E isso não se restringe a pedir filmes e seriados que passem no Teste Bechdel (ou seja, que tenham duas mulheres, que possuam nomes e que conversem entre si a respeito de outro assunto além de “homens”), mas inclui também a complexidade de caráter e a não submissão a preconceitos que prescreveriam como uma mulher deve agir.

Nesse sentido, a leitura de Jogos Vorazes não poderia ser mais satisfatória.

Para além do que Anita Sarkeesian afirma a respeito do livro (não teria muito a acrescentar), peguei-me pensando em quanto tempo fazia que eu não lia um romance infanto-juvenil com uma personagem feminina tão forte e com tamanha centralidade. Isso porque as primeiras opções que vêm à mente denotam um grau menor de protagonismo: Hermione, ainda que seja uma personagem que se destaca, tem um papel secundário na série Harry Potter; Violet, por mais que seja a melhor inventora do mundo, divide com Klaus e Sunny o protagonismo das Desventuras em série; Lyra, da série Fronteiras do Universo, a primeira que pensei que se manteria como único destaque de uma trilogia, perde espaço em A faca sutil para Will.

Pulando toda a questão Bella Swan, de Crepúsculo, – pelo simples não atendimento aos requisitos de força e complexidade da personagem –, causa genuíno entusiasmo que tantos adolescentes estejam lendo (e curtindo) uma história em que a mocinha não precisa ser salva, não se preocupa apenas com sua popularidade ou com o amor como única possibilidade de felicidade. Uma história em que a “mocinha” provavelmente ficaria ofendida por ser chamada assim.

Tendo lido apenas o primeiro volume da trilogia, espero que a personagem se mantenha assim nos próximos dois volumes. Ainda que, provavelmente, o triângulo amoroso tenha maior destaque nos pensamentos de Katniss a partir de Em chamas, creio ser possível que ela mantenha sua personalidade batalhadora e independente nos próximos volumes. Só lendo pra conferir.