Quando vi pela primeira vez o pôster de Minha Mãe é uma Peça pensei tratar-se de uma comédia italiana, especialmente porque o protagonista, um homem transvestido de mulher, se assemelhava muito ao ator Aniello Areno, de Reality – A Grande Ilusão, que curiosamente também aparece transvestido em uma cena.

Não conhecia a peça da qual o filme foi originado (aparentemente um sucesso que já levou mais de 1 milhão de pessoas ao teatro), e de Paulo Gustavo só sabia que era o novo comediante sensação da Globo, aparecendo em todos os programetes de fim de semana e ganhando programa em canal à cabo, mas sempre o achei estridente e forçado demais – como geralmente são os filhos do Zorra Total e afins.

Não que em Minha Mãe… Paulo não esteja estridente, mas é que no filme dirigido por André Pellenz sua estridência cabe na personagem e gera boas risadas. A mãe que ele personifica – inspirada em sua própria mãe, que aparece num vídeo hilário durante os créditos finais – é um grande exemplo do clichê em que às vezes a comédia (geralmente a comédia barata) se escora para garantir a risada do respeitável público.

Contudo, aqui cabe diferenciar o clichê do estereótipo: o último geralmente se baseia na rasa caricatura e resulta em personagens, a exemplo de outros humoristas e humorísticos brasileiros, que são burras porque são loiras, afetados porque são gays, bandidos porque negros e gente que fala errado porque é pobre ou corinthiana (ou os dois); já o clichê apreende os lugares-comuns da vida, os bordões que por osmose são repetidos pelas pessoas e comportamentos que são inerentes a uma classe/grupo específico: é clichê porque é real.

Sendo assim, Paulo constrói um bom exemplo de mãe clichê, mix de mãe judia (superprotetora), italiana (estridente) e brasileira (bruta, mas “por amor”), criando uma figura verdadeiramente hilária e com certa verossimilhança.

Dona Hermínia é uma mãe coruja e enlouquecida que ouve, pelo telefone, seus filhos a maldizendo. Humilhada (ou “puta da vida”, como ela, sempre desbocada, diria), no ápice de seu dramalhão-mexicano resolve abandonar a casa e sumir… até a casa de uma tia que mora no bairro próximo. Enquanto os filhos passam dias solitários, a mãe, “distante”, relembra o passado em que eles eram crianças. A partir daí o roteiro desenrola-se de forma esperada em lições de moral sobre relacionamentos, até um ápice caricatural em que tudo dá certo, tudo termina bem e todos são feliz para sempre amém!

Como era de se esperar, todos os spotlights estão virados para a performance de Paulo, que, experiente por outros papéis, se vira muito bem na pele de mulher, com vestido e enchimentos no busto, rebolando sem afetação, mas também sem nunca esquecer tratar-se de um filme de humor onde parte da graça está na evidência de se saber que aquela mulher na verdade é um homem.

Os outros personagens são bem menores e todas as participações especiais são esquecíveis: Herson Capri como o ex-marido atinge o ápice da má atuação, e Ingrid Guimarães repete aquela persona de modelo-afetada que fazia num quadro do Fantástico; apenas as cenas com Alexandra Richter, que faz a irmã de Hermínia, rendem bons momentos. Rodrigo Pandolfo e Mariana Xavier fazem os filhos. Esta última, bem mais que o primeiro, causa constantes momentos de vergonha alheia, não só pela péssima atuação, mas também porque boa parte do “humor” do roteiro volta-se à sua obesidade – tentei contar, mas foi impossível, as vezes em que ela é chamada de “gorda”, “baleia”, “buchuda” e derivados.

Novamente salta aos olhos que se trata de uma produção Globo Filmes, que insiste em repetir na tela grande o simplismo técnico das novelas, com takes insossos e cenários artificiais. O único feito técnico minimamente decente está na fotografia de Nonato Estrela, que mesmo não sendo toda originalidade, consegue direcionar boa iluminação aos elementos certos, dando um aspecto kitsch-de-Niterói que cai muito bem à comédia.

À parte do roteiro previsível, eu, cinéfilo-chato, fiquei observando a plateia em seus momentos de maior gargalhada. Compreendo que o Cinema, especialmente num domingão à noite, seja um ótimo momento para relaxar sem compromissos, rir em companhia de alguém querido por besteiras fáceis e rasteiras – como as tradicionais piadas com peido que desde que o mundo é mundo e que o Cinema é Cinema ocupam os filmes de comédia (e que me tiram dos nervos). Acredito, contudo, que pode haver um primor maior nas produções brasileiras, que já se mostraram capaz de resultados melhores, inclusive nos filmes d’Os Trapalhões que, olha lá, nem são tudo isso.

Antes do início do filme, a sessão de trailers mostrou o terrível prenúncio de mais uma bomba nacional: A Casa da Mãe Joana 2, de Hugo Carvana, que em poucos segundos conseguiu me dar urticária. Acabo de sair também de uma péssima experiência com Giovanni Improtta, do “entendido” em Cinema José Wilker, mas felizmente passei longe de Até que a Sorte os Separe, Odeio o Dia dos Namorados, e Vai que Dá Certo – depois tem gente que ainda discorda das críticas de Kléber Mendonça Filho.

O Auto da Compadecida (2000), Quincas Berro D’Água (2010) e O Bem Amado (2010) são bons exemplos de produções genuinamente nacionais e extremamente engraçadas, que respeitam o lugar que habitam e, por isso, foram construídas com linguagem e técnica de Cinema e não de TV.

No fim de Minha Mãe é uma Peça, um prenúncio: há mais por aí. O filme termina de forma aleatória, mas indubitavelmente abre espaço para uma continuação – que, sabemos, sem dúvidas virá dependendo do suce$$o nas telonas.

Assim, o Cinema nacional patrocinado pelos grandes conglomerados pega o caminho fácil, o trajeto sem curvas (e, portanto, sem muita originalidade) de uma trilha em que o sol brilha com bons retornos ao investimento. O público ri, mas nada ou muito pouco leva consigo da experiência cinematográfica, logo esquecendo a obra; já nós, crí-críticos e fãs mais exigentes, choramos ao ver o Cinema se transformando numa grande TV aberta brasileira com programação de domingo. Plim plim…