Amos Gitai é arquiteto por formação e começou sua carreira de cineasta com um documentário sobre uma casa em Jerusalém. O espaço e, principalmente, o espaço de convivência entre judeus e palestinos é presença constante em sua obra e sem dúvidas seu tema mais recorrente.

Em Ana Arábia, seu filme mais recente, o diretor retorna a Israel após dois filmes produzidos na França e volta a olhar com distanciamento e delicadeza para o tema espinhoso. O longa é composto de apenas um plano sequência, de 82 minutos, durante o qual Yael, uma jornalista, passeia por uma espécie de favela nos arredores de Tel Aviv, conversando com os habitantes e buscando a história de uma sobrevivente do Holocausto que se converteu ao islamismo.

Gitai sempre utilizou planos longos, em Kipur eles servem para dar ao espectador a mesma sensação angustiante de espera que têm os soldados protagonistas e em Free Zone há um plano de treze minutos com Natalie Portman chorando. No debate após a sessão, ele confirmou sua predileção por planos longos e tempos de respiro. Segundo ele, não encher seu filme de cortes permite que o espectador reflita acerca do que vê, há espaço para a interpretação. Ele afirma que não se interessa pelo cinema entretenimento, mas por aqueles filmes que começam quando acaba a projeção, “os melhores filmes”, diz o cineasta, “são subversivos por natureza”.

Sobre o plano sequência de Ana Arabia ele diz ainda que buscou criar um único bloco, um bloco de coexistência entre judeus e palestinos, emular no tempo do filme o espaço representado. Sobre a relação entre cinema e arquitetura, ele diz que em ambos se requer o domínio da forma, há uma estrutura cinematográfica, como há uma estrutura arquitetônica, mas para que se passe da estrutura para a arte é preciso que essa forma esteja a serviço de um conteúdo.

Ele, por exemplo, tenta fazer com que seus filmes existam em um ritmo diferente do hollywoodiano porque o oriente médio, ele afirma, existe em um outro tempo. Para Gitai nunca haverá paz enquanto Israel negociar no ritmo ocidental, é preciso respeitar o ritmo da região.

Se podemos tomar seu filme como exemplo, o ritmo do Oriente Médio é lento, mas não arrastado, fluido, contínuo, sem cortes ou interrupções. Yael vaga pelas ruelas e casas sem nunca começar ou terminar uma conversa, elas apenas se emendam umas nas outras e são retomadas, minutos depois, como se nada tivesse acontecido. Os personagens falam para a jornalista, mas falam também para si mesmos, contam histórias de sua vida, refletem sobre relacionamentos, trabalhos, a questão Israel-Palestina.

Contudo, o filme nunca assume um tom abertamente político, mas a abordagem natural e um tanto conformada dos habitantes do lugar: comenta-se a questão como se comenta o tempo, ou o trânsito, algo lamentável, mas com o qual é preciso conviver. No final, Ana Arabia é de fato um manifesto pela convivência, mas como quis seu autor isso se imprime na forma.