Dizem que ler nos ajuda a descobrir novos horizontes. Verdade, acredito. Uma ficção científica bem escrita nos faz entrar num novo mundo, de personagens bizarros, planetas e civilizações desconhecidas. E os romances históricos então? Diante de um livro, com diálogos rebuscados expressões distantes do nosso cotidiano, que nos ajudam a sentir como eram a época em que a história se passa, não tem como não sentir uma nova realidade. Sim, definitivamente, cada livro nos traz uma experiência nova, por mais clichê que isso soe.

Fica difícil falar do “Colecionador de Mundos” sem fazer essas correlações quase que imediatas, porque o livro é exatamente isso: Uma viagem. A intenção do autor, Ilija Trojanow, é não só nos fazer criar simpatia com personagem, ou gerar expectativa e querer resolver a trama. Muito mais do que isso, ele quer nos mostrar a grandiosidade e beleza dos lugares onde se passam as histórias. E devo dizer que faz isso com uma sensibilidade e capacidade de descrição raras, como por exemplo, na seguinte passagem:

Sempre que se aproximam de uma aldeia, trazem novidade. Mosquetes disparam para o alto, mesmo o mais exausto dos carregadores se controla e alia-se ao orgulho que irradia da caravana, observada por crianças e mulheres. Ao fundo, com certeza, também os olhos dos homens se voltam para ela. Nessas chegadas festivas, Burton tem a impressão de que todos montam uma encenação, assumem uma pose dramática que se esvai tão logo a caravana dá as costas à aldeia: os ombros caem, os pés pesam, o ânimo se arrasta pelo chão

A narrativa baseia-se na biografia de uma pessoa real, o viajante, explorador e escritor, Richard Burton. Isso não significa que a história fique presa a fatos reais, pois o autor cria personagens e situações fictícias para a trama. Acredito que somente a biografia de Richard Burton já é uma história impressionante, mas misturá-la à ficção para fazer um romance, certamente a deixa mais encantadora ainda. O próprio Ilija Trojanow é também um viajante e passou pelos lugares que relata no livro, trazendo mais da realidade e cultura dessas regiões, sem perder, porém, seu caráter de romancista. Trata-se da junção ideal entre a realidade e a engrenagem da magia do imaginário.

“O Colecionador de Mundos” vai passar por lugares como Índia, Arábia e África; Por lagos, mercados, praias e cabanas, como no trecho: “Zanzibar, a ilha, fora vítima de seu próprio porto. O recife abria-se numa muralha de corais, como um portal. Estrangeiros tinham apenas de recolher as velas, içar suas bandeiras. As velas eram remendadas e amarradas até a próxima partida.

Cada lugar vai trazer personagens novos e também aventuras, assim como as narrativas de Julio Verne, que embora nunca tenha viajado como Ilija Trojanow, também tem essa capacidade descritiva e encantadora, como no clássico “A Volta ao Mundo em 80 Dias”, em que o autor chega a passar pelos mesmos lugares que o romance de Trojanow, como no trecho que segue:

Mas o mar Vermelho é muito caprichoso e freqüentemente mau, como todos os golfos estreitos e compridos. Quando o vento soprava quer da costa da Ásia, quer da costa da África, o Mongolia, longa fuselagem a hélice, pego pelo vento nas laterais, balançava de um modo apavorante. Então as damas desapareciam; os pianos se calavam; cantos e danças cessavam ao mesmo tempo.

Com tudo isso, só tenho a dizer que o livro encanta, seja pelas aventuras, seja pela própria vida de Richard Francis Burton ou lugares fascinantes. Lê-lo não é só uma forma de viajar sem sair do lugar, mas também uma inspiração para ter vontade de conhecer.

Saiba mais sobre essa e outras obras no site da Companhia das Letras

TROJANOW, Illija. O Colecionador de Mundo. Tradução: Sergio Telarolli. 416 Págs.

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