Vinho é uma bebida feita a partir da fermentação de uvas que figura no paladar dos povos há séculos (registros bíblicos e de outras religiões comprovam sua longevidade), considerado também uma bebida para ritos de passagem ou para pura sedução. Estou longe de ser um enólogo, mas consigo apreciar bons vinhos (ao meu paladar e de quem convive comigo) e assim resolvi começar esse artigo depois de umas aventuras entre a escrita e o vinho.

Valpolicella (Verona, Itália) – Um excelente vinho tinto feito com uvas secas. Ótimo para escrever histórias de amor com finais imprevisíveis: aonde o mocinho mata a mocinha ou ela o abandona pelo amigo ou ela não exista e seja fruto de sua imaginação. Serve para ler romances de Gabriel García Márquez em pequenas doses no final da noite. Vai bem também com Virginia Wolf ou Philip Roth.

Periquita (Alentejo, Portugal) – Pisado e envelhecido em ânforas de barro como nos tempos do Império Romano. Tem uma acidez e corpo bem acentuado, perfeito para escrever romances violentos com assassinatos a sangue frio, tortura e genocídio. Cormac McCarthy é ideal para ler acompanhado desse vinho português, exemplares como Meridiano de Sangue e Onde os velhos não têm vez tornam-se mais saborosos.

Danie de Wet Pinotage (África do Sul) – Direto, leve e desce pela garganta como água – simples assim. Excelente para escrever prosas curtas caracterizadas pela linguagem, crítica e conteúdo hermético/poético. Ler Mia Couto (Terra Sonâmbula), Adolfo Bioy Casares (A Invenção de Morel), Umberto Eco (O Pêndulo de Focault) e até mesmo James Joyce (Dublinenses).

Kaiken Ultra Malbec (Mendoza, Argentina) – O sabor frutoso e violento tornam esse vinho um exemplar surpreendente e familiar. Essa mistura de antíteses é ideal para escrever romances com um pé na realidade e outro no fantástico. Ironicamente é ótimo para acompanhar a leitura de um Cortázar, seja Histórias de Cronópios e de Famas ou A Volta do Dia em 80 Mundos. É bom companheiro para Sobre heróis e tumbas e Nós e o universo de Ernesto Sabato.

ÀN/2 Ànima Negra (Mallorca, Espanha) – Um dos melhores vinhos produzidos na Espanha, e muito saboroso, é classificado como exuberante. Escrever com esse vinho é uma batalha, ele requer requinte, boa prosa, estruturação perfeita e fluxos entre diálogos e parágrafos de forma quase musical e melodiosa, ou seja, talvez seja melhor comprar uma caixa para conseguir escrever um romance de peso. Para ler existem diversos romances: Os Detetives Selvagens (Roberto Bolaño), Desonra (J. M. Coetzee), Dia de Finados (Cees Nooteboom), O Inominável (Samuel Beckett), O Encontro (Anne Enright), etc.

Para vocês, existe algum vinho ideal para ler romances?