A República Islãmica do Paquistão é um jovem país- sua fundação data de 1947- bastante contraditório. Ao mesmo tempo em que é uma das economias que mais crescem no mundo (com um PIB aumentando 7% ao ano entre 2004 e 2007) e uma potência nuclear, no mês passado uma mulher foi condenada à morte por blasfemar contra o Profeta Maomé.

É nesse cenário ainda um tanto confuso- oscilando entre o avant-garde e o tradicionalismo- que o jovem escritor Daniyal Mueenuddin ambienta os contos de seu debut “Em outros quartos, outras surpresas”, lançado no Brasil pela Companhia das Letras.

São oito contos, todos eles orbitando ao redor de K. K. Harouni, remanescente de uma burguesia latifundiária quase feudal, que está em seus últimos estertores, sendo rapidamente substituída pela burguesia urbana e industrial. Indo desde empregados diretos até parentes distantes, todos nas histórias estão ligados a esse senhor decadente- e são influenciados pelas mudanças em seu estilo de vida.

“Nawabdin, o eletricista” é o conto que abre o livro, e um dos que merecem destaque. Em 2008 foi selecionado por Salman Rushdie para a coletânea ‘Best American Short Stories’. E o conto pode ser visto como uma síntese da alma da obra: Nawabdin é o eletricista de uma das propriedades de K. K. Harouni, e sua subsistência depende do poderoso latifundiário- mas ao mesmo tempo Nawabdin está aprisionado por esse modo de vida que desintegra-se rapidamente.

Os outros contos seguem todos no mesmo espírito, história de oportunismo, amor e frustração, mas, principalmente, histórias sobre mudança. Em certo sentido as comparações que Mueenuddin recebeu, com o russo Anton Tchekhov, são verdadeiras, já que ambos tratam da mesma espécie de desconstrução de um mundo que assentava-se sobre sua própria estabilidade.

Mueenuddin mostrou ter um vigor literário raro em escritores mais novos, e um estilo já bem orientado, embora ainda exista espaço para amadurecimento, especialmente no sentido de afastar-se de Tchekhov- não no sentido da temática, mas na forma.

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