O trânsito intenso de São Paulo é uma das maiores reclamações entre 10 de 10 motoristas que trafegam pela 23 de Maio, Av. do Estado, Marginal Tietê, Radial Leste e outras vias de grande movimentação da capital paulistana. Como motorista ocasional, o meu maior protesto vai de encontro direto com esses condutores reclamões, porque eles não abrem passagem para ambulâncias, um dos maiores desrespeitos que presencio. Ninguém coloca o veículo no meio fio ou avança um pouco na faixa de pedestre – ok, isso é infração, mas não permitir que a ambulância ultrapasse é omissão de socorro (doloso, se me permitem classificar). Ainda mais grave são os curiosos que adoram passar a 5 km/h só para averiguar se o motoqueiro está realmente ferido, ao invés de ajudar, ou quantas pessoas estavam dentro do carro que bateu no poste, ao invés de ajudar – “A curiosidade matou o gato”.
Quando viajei a Nova York a situação era totalmente oposta, nunca vi um Samu de São Paulo rasgar as ruas com as sirenes e o giroflex a tona como se estivesse em uma cidade deserta (lembra daquela sequência em Vanilla Sky, filme deprimente do Tom Cruise, em que a Times Square está vazia?) onde não existiam carros, ônibus, bicicletas ou pedestres e eu, ingênuo, acreditava que a alta velocidade e aquele monte de ambulâncias cheias de paramédicos com síndrome de Jesus Cristo era coisa de seriado da CBS ou de filme norte-americano. Ironicamente, quando um daqueles paramédicos descerem daquela espécie de furgão – repleto de adesivos escrito Paramedics, o nome do hospital (no caso o NYH) e diversos bastões de Asclépio nas janelas -, com luvas azuis, estetoscópio pendurado no pescoço, carregando aquelas malas azuis e verificando a pulsação de uma criança de uns onze anos que acabara de ser atropelada por um sedan, lembrei do Nicolas Cage em Vivendo no Limite (Bringing Out The Dead, 1999), de Martin Scorsese, filme que eu acho sensacional – e até hoje só o meu amigo de batalha cinematográfica Vébis Jr. concorda com a minha opinião -, com aquelas olheiras profundas e aquela cara de lunático de quem é assombrado pelas pessoas que perdeu, e pelos vivos também, nas ruas da Big Apple.
Por causa dessa cena (da rua, não do filme) fiquei fissurado com a ideia de me tornar um paramédico e motorista de ambulância – salvar vidas, ver sangue jorrando, pessoas estateladas no chão clamando por socorro com aqueles olhos vidrados de terror (deveria ter escolhido trabalhar no IML), braços e cotovelos deslocados, hemorragias internas. A fixação era tamanha que comecei a acompanhar séries médicas como Grey’s Anatomy, House e E.R., claro que todas essas séries para prender a atenção do público tem finais, muitas vezes, mirabolantes para usar como gancho das próximas temporadas. Ninguém quer apenas uma pancriatite aguda bilial ou tuberculose num season finale – isso só serve para metade da temporada -, tem que explodir o hospital, sequestrar o chefe dos cirurgiões, casais brigarem, pacientes pegarem fogo durante uma missão de resgate ou o personagem principal – ou seu par romântico – entram numa cirurgia de vida ou morte. Perdi o interesse pelo seriado Grey’s, onde já se viu a personagem principal ser a mais coadjuvante?, por E.R., que não tem graça sem os medicos originais, e só não perdi por House porque eu gosto do Hugh Laurie.
Contudo, quando comentei com a minha avó, enfermeira aposentada casada com um médico e mãe de dois médicos (meu pai é a ovelha negra, não quis vestir jaleco branco), ficou emocionada e por pouco não me convenceu a fazer medicina – lembrando que eu já era graduado em comunicação na época – junto dos meus tios. Um deles não satisfeito com a minha negativa me levou em alguns plantões e até me ensinou coisas bem úteis para socorrer alguém, coisas básicas para qualquer cidadão que queira, e deve, prestar socorro quando necessário como massagens cardíaca e respiração boca a boca (não aquela besteira que dizem ser primeiros socorros nas aulas teóricos do CFC), sutura e até aplicar vacina e retirar sangue.
Nem seriados, nem parentes e nem a possibilidade de dirigir costurando o trânsito num veículo equipado com seringas, giroflex, macas e kit de sutura fizeram eu seguir esse caminho da saúde (o mais apropriado seria resgate) e mesmo não sendo um medico, paramédico, enfermeiro, Hugh Laurie ou o Luciano, se algum dia você estiver numa ambulância a caminho de qualquer hospital de São Paulo e outras cidades, pode deixar que meu carro não será um obstáculo, primeiro porque qualquer pequena ajuda pode fazer a diferença (momento de clichê), segundo que acidentes não atiçam minha curiosidade e por último para não ser assombrado por junkies, motoboys ou quaisquer outras vítimas que queiram meu ectoplasma.
que sacanagem em não deixar passar, fiquei bem indignada que exista pessoas assim, não ter sensibilização por um doente para mim a pessoa é um monstro
Pips, obrigado!
Por me citar e pela atitude. 🙂
Merece um beijo- não meu, da Milla Jovovich.
Acho que muitos motoristas não liberam passagem para as ambulâncias por não acreditar que ali vai um alguém necessitando realmente de ajuda urgente. Ficam, os motoristas, naquela de “Esse cara ligou a sirene só pra fugir do engarrafamento e chegar mais cedo no hospital pra acabar o seu palntão”. O que, se me perdoem o dedo na ferida, pode ser bem verdade. Nesse país é mesmo cada vez mais difícil acreditar nas pessoas. Uma atitude assim não se justifica, evidente. Mas acho que explica bastante coisa. Enfim… Essa questão dá muito pano pra manga. Abs
bah…mas, na dúvida é melhor abrir passagem..essas pessoas não tem consciência?