Se existe algo que a Irlanda tem aos montes são escritores que são louvados por sua qualidade literária e que, em seu tempo, causaram controvérsia. Oscar Wilde e James Joyce são provavelmente os melhores exemplos, mas obviamente estão longe de serem os únicos.

Brandan Behan é um nome que não pode ficar de fora de uma lista um pouco mais extensa. Nascido em 1923, estudou só até os 13 anos de idade, quando largou a escola para tornar-se pintor de paredes- imitando seu pai, Stephen Behan. Sua família era composta basicamente de operários bem educados e inclinações republicanas, e ele cresceu em um ambiente que misturava grandes nomes da literatura e ativistas políticos- entre os quais seu tio Peadar Kearney, que escreveu o hino nacional irlandês.

Educado em inglês e irlandês, desde cedo teve grande contato com a literatura- quando criança seu pai lia livros de Zolà, Galsworthy e Maupassant para Brendan e os irmãos e sua mãe o levava em passeios literários pela cidade. Aos 14 anos publicou seus primeiros versos, na revista Fianna: the Voice of Young Ireland.

Essa revista pertencia ao grupo Fianna, o braço jovem do Exército Republicano Irlandês- o IRA. Nessa mesma época, Behan iria se juntar ao grupo. Aos 16 anos, em 1939, ele embarcara sozinho em sua primeira missão- ainda que não autorizada: explodir o porto de Liverpool.

E é sobre essa primeira missão- ou melhor, sobre seu malogro- que trata Borstal Boy: os ‘borstals’ são prisões juvenis do Reino Unido, dedicadas a reformar os jovens considerados como mais perigosos e problemáticos.

Quando começa-se a ler, Behan, porém, não parece lá muito perigoso. Um adolescente tímido e um tanto quanto ingênuo- quiçá até um pouco idiota se considerarmos que foi esse o rapaz que tentou entrar na Inglaterra com documentos falsos e explosivos em nome do IRA.

À época que ele é preso, dois outros irlandeses presos pelas autoridades inglesas acabavam de ser condenados à morte por terem conseguido fazer algo semelhante ao que Brendan pretendia. Isso o enche de medo e o faz perceber que, por mais nacionalista que seja, não está disposto a morrer pela Irlanda. Não sabe ainda, porém, qual será seu destino: aguarda julgamento em uma prisão comum, ainda que separado dos presos adultos e em regime diferenciado daqueles já condenados.

Logo no começo de seu grande passeio pelo sistema prisional inglês- que, invariavelmente, acabaria em um borstal devido à sua idade- ele conhece Charlie e Ginger, dois jovens ingleses que seriam seus companheiros por muito tempo, e os quais ele passaria a preferir em detrimento de seus compatriotas.

Os dois, a propósito, são talvez os grandes responsáveis por atenuar a visão política de Behan- ele percebe que as diferenças maiores existem nas classes sociais mais altas e que aqueles que vivem em condições ruins são bastante parecidos, seja na Inglaterra ou na Irlanda.

Isso, obviamente, não é suficiente para fazer com que Behan abandone seus ideais. Ele continua sendo orgulhoso de ser irlandes e republicano, e continua opondo-se de modo feroz à coroa inglesa. Chega mesmo a ter atritos com a Igreja Católica- na forma de um padre que ameaça excomungá-lo se ele não abandonar o IRA.

O diálogo dele com o padre, aliás, é um dos pontos altos do livro. Mas de um modo geral todos os diálogos são: dramaturgo, Behan era um mestre ao expor a tensão e o furor de sua obra através das palavras ditas ou silenciadas por seus personagens.

Borstal Boy é um livro sobre política, mas também é um livro sobre uma espécie de ritual de passagem- um ritual, porém, pelo qual se passa à força e em território inimigo. É certo que mostra um certo amolecimento do radicalismo anti-inglês de seu autor, mas também fortalece suas tendências republicanas irlandesas e, mais do que isso, à liberdade.

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