A história da Polônia no século XX é uma história um tanto quanto amarga. O país, que no século XVI fora o segundo maior país da Europa – perdendo apenas para o Império Russo – nem sequer existia: seu território estava dividido entre a Rússia, a Áustria e a Prússia. Com a derrota do Império Austro-Húngaro e da Alemanha na I Guerra Mundial e a revolução na Rússia, a Polônia conseguiu recuperar sua independência, apenas para perde-la e ser arrasada durante a II Guerra Mundial. Voltou a existir depois disso, mas como estado fantoche: apesar de, em teoria, ser um país independente, as ordens vinham da URSS. Apenas em 1990 a República Polonesa tornou-se livre de fato.

De toda essa história trágica, o pior momento provavelmente foi a Segunda Guerra Mundial. A capital, Varsóvia, foi quase que completamente destruída pelos alemães. De um país conhecido pela tolerância, que abrigava a maior população judaica do mundo, tornou-se terreno para a construção de campos de concentração – que aliás, eram o destino tanto de poloneses quanto de judeus.

E é nesse cenário, repleto de medo e incertezas, que se passa a história de A Bela Senhora Seidenman, do escritor polonês Andrzej Szczypiorski. 

A história do livro é posta em movimento pela prisão da referida senhora Irma Seidenman, uma judia polonesa viúva de um médico radiologista, o dr. Seidenman – que morrera poucos anos antes da guerra. Com seus cabelos loiros e olhos azuis, Irma passou-se por polonesa, utilizando a identidade de Magdalena Gotomska, viúva de um oficial. Tudo parecia certo, até que um antigo conhecido, um judeu que escapa ao gueto delatando outros judeus para a Gestapo, a leva para os alemães.

O desenrolar-se da história dá-se com tentativas de livrar a senhora Seidenman de seu destino. Mas isso não é tudo: outras personagens acabam por se envolver na história, como um juiz, um comerciante, um jovem negociador de arte, um ex-bandido que sobrevive cobrando para levar judeus para a parte ariana da cidade e mesmo um jovem advogado judeu que, após escapar do gueto, decide voltar para lá e enfrentar seu destino.

Dono de um estilo sóbrio, quase seco, Szczypiorski nos conta a história de todas essas personagens, alternando o foco da narrativa a cada capítulo. Ele mostra não só o que lhes aconteceu durante a guerra, mas deixa que o leitor tenha relances do que a cada um deles no passado – além do que haveria de lhes acontecer no futuro.

Apesar das credenciais morais de Szczypiorski parecerem não ser das melhores – parece que ele tinha ligações com a polícia política comunista, e que possivelmente delatou o próprio pai para o regime – sua literatura é bastante interessante, entrando a fundo na tragédia compartilhada por judeus e por poloneses durante a guerra.