Allen Ginsberg tornou-se conhecido como um dos poetas mais importantes da Geração Beat. Sua poesia crua e nem um pouco sutil, cheia de experimentações formais e com um conteúdo nada regrado criou um ruído que tornou-se uma das coisas mais audíveis da poesia de língua inglesa do século XX.

Poucos sabem, porém, que a veia poética vem de casa: seu pai, Louis Ginsberg era, além de professor universitário, poeta. É certo que não alcançou o sucesso de seu filho, mas só o fato de ele ter sido um homem de letras certamente lança um interesse maior sobre a relação dos dois.

E para tal a editora Peixoto Neto recentemente lançou um livro capital: Negócio de Família traz uma seleção da prolífica correspondência entre essas duas importantes gerações dos Ginsberg.

Organizadas cronologicamente por Michael Schumacher (que, obviamente, não é o da fórmula 1) e com tradução de Camila Lopes Campolino, o livro explicita a relação entre Allen e Louis, que se mostra conflituosa em vários pontos – desde a preocupação de Louis com as más companhias do filho (nomes como Jack Kerouac, William Burroughs e Gary Snider, entre outros) e discordâncias quanto ao estilo de vida tresloucado de Allen – e bastante calorosa em outros – Louis preocupa-se em arranjar dinheiro para que Allen possa dedicar-se a escrever, além de mostrar óbvio orgulho pelas realizações artísticas dele.

Mas, por mais que esses pontos biográficos sejam importantes, acredito que o grande atrativo seja perceber as escapadas da relação dos dois para fora do âmbito pai-e-filho: quando comportam-se como poetas comentando o trabalho de um colega. Críticas e elogios coexistem lado-a-lado, assim como a percepção de que suas obras tomam caminhos bastante diversos.

Louis era um entusiasta das novas formas que surgiam, apesar de desaprovar o conteúdo sexualmente explícito, alusões à drogas e o uso de palavras de baixo calão. Ele é fiel a esses princípios ao opinar sobre a obra de seu filho. Allen, por outro lado, não deixa de elogiar os bons poemas de seu pai, nem de falar que alguns outros não fazem sentido algum.

Não se pode deixar de lado ainda o modo como as cartas explicitam as relações de Allen com outras pessoas, como seus colegas beats e a própria mãe. Por vezes ele recorre ao pai em busca de auxílio emocional, o que, visto sob olhos críticos, lança uma luz sobre alguns de seus poemas.

Como todo livro de correspondências, Negócio de Família pode tornar-se maçante para um leitor que não seja suficientemente interessado no assunto em questão. Porém para estudiosos ou entusiastas de Ginsberg, é um livro certamente essencial.