1.
Foi em janeiro quando o primeiro dono de restaurante do mundo teve a ideia de colocar uma primeira placa de aviso ao lado de uma porta de saída. Tímido porém ousado, estava tomado por esperança, renovação e vontade de gratidão na forma mais singela possível, essas coisas que arrebatam a gente na virada de ano. Teria sido publicitário se essa história começasse em março. Político se fosse em junho. Mas era janeiro, e o que restou foram variações das frases:

Valeu ai pela bufunfa, que era tiozão demais. Queremos te ver de novo, que era passivo demais. Espero que tenha gostado, que era romântico demais. Quem gostou faz barulho, que é melhor deixar pra lá. Até que “Obrigado, volte sempre”. Estava ali uma frase com afeto e um tanto de liberdade.

Um funcionário de posto de gasolina pendurou a placa e fez um desenho com canetinha amarela – mais tarde universal – pensando em preservar a melhor aparência dos clientes no vídeo: “sorria, você está sendo filmado”. E nenhuma perna mais ficou presa ou foi machucada no metrô, porque a partir dali os passantes veriam os riscos entre o trem e a plataforma demarcados por uma faixa amarela nas estações, presente cuidadoso de alguém que se importou. As lembranças de janeiro estão em todo lugar.

Janeiro é escolher alface no rodízio. Aviso de recebimento de mensagem é maio. Banjo, avião, abraço, romance, suco de abacaxi com hortelã, Rolling Stones, queijo gouda e labradores são genuinamente Janeiro. Vocês ainda não sabem, mas a máquina do tempo também foi inventada aí.


2.

Já dizia Drummond (ou ao menos disseram que ele disse), “quem teve a ideia de cortar o tempo em fatias (…) industrializou a esperança, fazendo-a funcionar no limite da exaustão”.

Que coisa bonita é ter uma nova chance. Pensar que “esse ano vai” e que as coisas podem ser diferentes.  Mas quanto tempo durou a sua fé, o seu axé, o seu Janeiro? O meu não deve ter passado de três semanas. Isso até a primeira refeição compulsiva com base em gordura e doce, a troca de farpas, a cervejinha na terça quando prometi deixar só pro fim de semana ou as mesmas noias de sempre. E ai eu volto a pensar no cara que criou o calendário. Quem foi que disse que esse modelo seria uma  boa ideia? Um artigo do New Yorker me deu um palpite:

“Primeiro de Janeiro – Ha! Isso é tão divertido de escrever. Estou empolgado.
Dois de Janeiro – Faz tanto sentido. 1000 dias por ano, divididos em 25 meses, 40  por mês. Por que ninguém pensou nisso antes?
Três de Janeiro – Recebendo um monte de elogios sobre o calendário. Um cara chegou pra mim e disse que ia organizar a vida inteira baseado nele!
Trinta de Janeiro – Pessoas realmente odeiam Janeiro e querem que ele acabe. Eu tentei explicar que é só um rótulo e que não faria nenhuma diferença, mas ninguém entendeu. Então eu contei a todos que seria o último dia de janeiro e que, daqui pra frente, todos os meses teriam 30 dias ao invés de 40.”

Será que não convém falar com o Senhor-dos-Calendários, para que ele faça uma nova adaptação aos nossos dias? Vale chegar lá e dar um toque: “ei cara, talvez seja o caso da gente mudar as coisas. A gente não tem paciência pra viver 365 com a mesma vontade. Nem um mês deu certo. Faça algo.”

Talvez o melhor mesmo fosse viver com um relógio sem bateria ou um calendário sem dias, apenas com fotos de corpos gostosos para admiração. Mas não vamos admitir que a nossa invenção de tempo foi uma cilada. Muito menos nos conformar que somos nós que temos que mudar, que seria a solução mais prática. Nós somos humanos, for God’s sake, tudo é que tem que mudar. O tempo não existia sem nossa mente doentia. Vamos com isso até o fim.

Vale lembrar que o calendário já teve 10 meses, ganhou mais por conta dos imperadores Julio César (Julho) e César Augusto (Agosto), mas nenhum deles está aqui pra reclamar ou arcar com isso agora.

 

3. 

Eis a minha ideia de tempo:  cada hora será um dia, cada dia será uma semana, cada semana será um mês. E cuide deles muito bem. Reveja o tempo gasto com dor de mágoa e falta de objetivo, porque uma abridinha na geladeira e já passaram 2 horas. Agora, um ano tem 4 meses e um restinho de semanas, que serão revertidos em feriados. Há de se comemorar toda virada de ano. E só se fica velho ao completar 12 anos. Todos os anos terão o nome de um animal, com exceção do ano do seu aniversário, que você vai poder chamar como quiser.

Aproveitamos os chineses e o dia 30 de janeiro, hoje mesmo, para já colocar essa regra em prática, com o Ano Novo Chinês. O ano do cavalo. O ano do galope.