Numa Europa semidestruída, o autor e vários companheiros de estrada viajam sem destino pelo Leste até a URSS, premidos entre as ruínas da maior de todas as guerras e o absurdo da burocracia dos vencedores.
Diferente da narrativa apresenta por Imre Kertész em suas novelas sobre o Holocausto e o horror de Auschwitz, onde afirma que nenhuma prosa, nenhuma história pode alcançar aquilo que foi uma das maiores atrocidades da humanidade; Primo Levi tenta ao máximo descrever e mostrar que aquele fora um período para ser lembrado, afinal apenas dessa forma é que o homem evitará cometer seus erros passados.
Tratando por essa óptica é possível perceber que após tantos momentos de sofrimento, tortura e angústia, e o anseio para voltar a ter uma vida normal, regressar à vida normal torna-se um fardo assombrado pelos fantasmas nazistas – os temores de um tempo que as chagas da alma são mais profundas e marcantes do que uma simples tatuagem com números.
Regressávamos mais ricos ou mais pobres, mais fortes ou mais vazios? Não sabíamos: mas sabíamos que nos patamares das nossas casas, para o bem ou para o mal, nos esperava uma prova, e aguardávamo-la com temor.
A tal Trégua do título é uma notada referência à transição do viver como um ser subdesenvolvido em Auschwitz e a normalidade do mundo pós-holocausto. Será que um homem é um homem após tudo que sofreu? Todos esses homens, mulheres e crianças (aquelas que tinham sorte) seriam mais fortes ou sequelados de um trauma que nunca seria entendido. Se algum dia disseram: que o único povo que não poderia ser analisado psicologicamente era dos irlandeses creio que os sobreviventes de um campo de concentração não poderiam ser analisados de forma alguma: espiritual, física ou psicológica – fragilizados e vazios.
Todavia, o mundo estaria preparado? As ruínas deixadas por uma guerra devem ser levantadas e todos os sobreviventes: soldados, chefes de estado, teriam que erguer um novo mundo e nesse novo mundo renasciam aqueles que foram as vítimas do começo ao fim dessa guerra: sem terra, sem esperanças
E como muitos escritores que viveram nessa época e tendem carregar as rememorações desse período, Levi nunca conseguiu se afastar do tom amargo e autobiográfico e essa obra, no auge do seu reconhecimento, é que ele desponta como uma testemunha que conseguiu, de maneira forte e linguagem arrojada, transformar a ficção em um relatório autêntico daquilo que era chamado de vida dentro de Auschwitz.
Nunca li Levi. Mas pareceu-me interessante. Apesar da divergirem no objetivo de escreverem sobre o Holocausto, ele e Kertész me pareceram semelhantes, de certa forma: esse medo, essa angústia de voltar ao mundo após sair de um campo de concentração que você disse existirem em Levi são o tema central de ‘Sem Destino’, do Húngaro.