Tolstói em seu célebre romance Anna Karenina começa escrevendo que ‘todas as famílias felizes são iguais, ao passo que as infelizes o são cada uma a sua maneira’.

Não tenho certeza se existe alguma relação com o romance do escritor russo, mas essa certamente parece ser a tônica da HQ Assunto de Família, de Will Eisner.

Americano filho de imigrantes judeus, Eisner construiu, nessa história, uma das famílias mais infelizes que poderiam ser pensadas. E, por isso mesmo, algo único.

Com o pretexto da festa de aniversário do patriarca, agora completando 90 anos, incapaz de se comunicar de preso a uma cadeira de rodas devido a um derrame, Eisner cria um verdadeiro show de horrores.

Horrores esses que nada mais são do que segredos, remorsos e mentiras, que nos são explicitados de forma lenta e delicada, dentro da mente das personagens- ou de forma violenta, em suas interações. Horrores esses que são assustadores na ficção e que são mais assustadores quando se imagina que poderiam ser reais.

Não se pode dizer que o final seja surpreendente. Mas não acho que foi esse o objetivo do autor. Eisner era um escritor demasiado inteligente para se deixar cair tão facilmente nas armadilhas do clichè. Acredito que o final- que, como eu disse, não surpreende, mas que também não é totalmente óbvio- tem seus motivos, e que dá força para todo o resto da obra.

Os desenhos são típicos de Eisner, simples mas ainda sim bastante ricos; e a disposição dos quadrinhos aparenta ser anárquica porém obedece o melhor andamento possível da ação. As cores são especialmente adequadas para o tema, parecem com as de uma foto em sépia- com sombras carregadas e com uma quase ausência de brancos puros.

Talvez ‘Assunto de Família’ não seja Eisner em sua melhor forma, mas mesmo assim ainda é uma grande HQ.

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