A história da autora Xinran é de coragem. Nascida em Pequim ela se mudou para Londres junto com o filho e escreveu livros sobre as condições em que vivem as mulheres na China e também abordando temas polêmicos como homossexualismo, casamentos forçados, estupro, entre outros. Esse prisma criado por ela mostra como um sistema totalitário se choca com as mais antigas tradições que “evoluíram” com o passar dos anos.

Em Mensagem de uma mãe chinesa desconhecia, lançado pela Companhia das Letras esse ano, Xinran mostra seu talento para coletar os mais diversos depoimentos para construir o retrato do sofrimento e da opressão que as mulheres do país sofrem, dessa vez focando no problema populacional da China, onde mães não tem escolha. Se engravidam devem lidar com dilemas terríveis como vender suas crianças, abandoná-las e, uma das hipóteses mais chocante, matar.

O governo chinês e grande parte do seu povo prefere que as crianças do sexo masculino sejam preservadas e as do sexo feminino devem sumir. Para piorar o cenário existe a lei do filho único para controlar a natalidade e o crescimento das famílias. Em um dos depoimentos, uma mãe chinesa teve de dar quatro filhas para a adoção.

No ocidente sabemos das lendas de crianças chinesas que são dadas a adoção para o exterior, mas não é apenas isso, o livro traz dez depoimentos que mostram que não é a cultura de séculos que faz com que as mães dêem seus filhos, é o medo, a perseguição. A dor da separação é grande para essas mulheres que estão longe da covardia, elas são corajosas de ainda quererem um ser humano nascido e saudável viver. As filhas nunca conhecerem sua origem e essas tem sorte, pois não tiveram o destino de nascerem para morrerem – “resolver uma bebezinha” é o termo usado. Há outro termo usado pelo governo chinês chamado “Guerrilheiros do nascimento extra”, onde pais de meninas fogem de sua cidade – sem documentos, identidades ou certidões – para tentar ter seu primeiro filho homem.

O machismo é o principal catalisador dessas leis. Se a cultura fosse o único problema seria fácil mudar a cabeça de tantas pessoas? Afinal, o crescimento ecônomico da China não poderia alterar todos os índices de infanticidio? O controle total através do sexismo é o agente e o corte dos relacionamento entre mães e filhas são o alvo dessa violência através do medo e da obediência e “doutrinação”.

Fora os depoimentos e histórias, Xinran nos fornece diversos dados, através de um apêndice, para mostrar as crenças mais fortes encontradas em camponeses, as leis de adoção dentro da China, cartas de mães adotivas e índices de suicídio entre as mulheres.

Mensagem de uma mãe chinesa desconhecida não é apenas um informativo cheio de depoimentos piegas, é um retrato chocante e comovente sobre como uma cultura retrograda interfere no crescimento de um país, não economicamente, mas humanamente.