A literatura está cheia de relatos autobiográficos de prisioneiros das prisões russas na Sibéria. Desde Dostoiévisk com suas ‘Recordações da Casa dos Mortos’ até ‘Tudo o que Tenho Levo Comigo’, de Herta Müller, sem esquecermos de Aleksandr Solzhenitsyn em seus ‘Arquipélago Gulag’ e ‘Pavilhão de Cancerosos’ e nem de Grudziński e seu ‘Um Outro Mundo’.

Literariamente menos ambicioso mas nem por isso menos intrigante, é o livro ‘Caminho da Liberdade’ do polonês radicado no Reino Unido Sławomir Rawicz. Oficial da cavalaria polonesa durante as invasões alemãs e russas ao seu país em 1939, ele acabou preso pelos soviéticos e, acusado de ser um espião, foi enviado para a Sibéria, mas especificamente a prisão de Yakutsk- a menos de 500 km do círculo polar ártico.

O que torna sua história singular, no entanto, é o fato de não narrar a vida na prisão, e sim sua fuga. Uma fuga, espetacular, aliás. Fugindo dessa prisão no extremo norte do continente asiático, caminhou até a Índia, atravessando a Sibéria, a Mongólia, a China e o Tibet, tendo de cruzar o deserto de Gobi e os Himalaias.

Não o fez sozinho, é claro: junto com ele saíram mais seis homens aos quais se juntou uma garota, também fugitiva. Carregavam pouquíssimos pertences, os mais valiosos sendo um machado de cabo improvisado e uma faca, também improvisada. Sob condições desfavoráveis, porém, metade do grupo sobreviveu aos 6500 km de caminhada- até chegarem à Índia Britânica, quando foram, finalmente, salvos.

O livro, na verdade escrito pelo ghost writter Ronald Downing a partir dos relatos orais de Rawicz, clama ser baseado em uma história real. Em 2006, porém, surgiram dúvidas sobre a veracidade dos fatos- que, convenhamos, constituem uma história que pode ser facilmente vista como fantasiosa- a partir de uma reportagem da BBC, que, com base em registros da ex-URSS, mostrava que Rawicz fora liberto no Irã durante um programa de anistia dos prisioneiros poloneses.

Três anos depois a polêmica sobre a obra volta à tona, com as declarações de Witold Gliński, um veterano polonês da Segunda Guerra Mundial, que afirmou que a história de Rawicz é sim real, mas fora ele, Gliński, o verdadeiro protagonista da história.

Apesar (ou quiçá) por causa da polêmica, o livro voltou a vender bem (fora um best-seller quando lançado pela primeira vez, em 1956) e acabou transformado em um filme, por obra do diretor Peter Weir. O filme, lançado neste ano, se afasta bastante do livro em vários pontos, tendo um apelo maior ao público ocidental, apesar de manter mais ou menos o mesmo espírito.

Difícil dizer que é uma grande obra literária ou algo assim. Mas toda a polêmica envolvida e mesmo sua própria história o tornam um livro curioso e que é, no mínimo, divertido de se ler- apesar de todo o sofrimento narrado, experimenta-se uma sensação de aventura perene e pode-se até mesmo rir aliviado em alguns momentos.

 

Caminho da Liberdade

Slawomir Rawicz

tradução de Ricardo Gomes Quintana

320 páginas

R$ 49,90

 

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