Quiçá o que vou escrever faça com que os beatlemaníacos por aí torçam o nariz para mim- algo que certamente demorará a passar- mas para qualquer livro no qual, antes de começar, exista uma dedicatória do autor à John Lennon ou a qualquer um dos integrantes da banda, torna-se inevitável que eu comece a ler com um pé atrás.
Nada contra os Beatles, juro. É só que essa coisa de dedicar livros à ícones do rock ou, pior ainda, da contra-cultura me cheira à melodrama hippie. Nesse caso o nome Morangos Mofados e o fato de Caio Fernando Abreu ser um dos campeões de citações no Twitter, Facebook, Orkut e afins- acho que ele quase empata com a Clarice Lispector- também não ajudavam. Mas resolvi ir em frente e ler o livro: com as minhas expectativas, eu só tinha a ganhar.
E, realmente, ganhei. Dezenove contos bastante curtos- são apenas 158 páginas, dividas ainda com alguns interessantes extras- que me surpreenderam por não serem tão piegas quanto eu achava que seriam e também por não serem apenas variações sobre um mesmo tema, como eu cheguei a pensar que seriam.
São sim contos, primariamente, sobre o amor. Mas de um modo bastante sóbrio, ainda que sofrido. Nenhuma das personagens se lamenta à la Werther, nenhuma das personagens tem delírios românticos descabidos. São apenas pessoas comuns e tristes.
Pessoas que fingem receber ligações telefônicas para não parecerem tão solitárias, pessoas que sentem coisas que acreditam que não deveriam sentir, pessoas que sentem coisas que não gostariam de sentir e pessoas que acham que encontram quem gostariam de encontrar.
Impossível falar que se trate de uma obra-prima, mas Morangos Mofados é um livro interessante, bem escrito e carregado com uma espécie de melancolia rabugenta e esperançosa, capaz de manter qualquer idéia de melodrama afastada por tempo suficiente para que se termine um conto.
Como muitos da minha faixa etária que leram Caio, esse foi o primeiro livro dele que li. Na época, não é que não tenha gostado, mas incomodou a leitura a ponto de eu largar por tempo… depois o retomei e gostei. Leitura doída para quem era adolescente e tão melancólica como muitos dos personagens. Caio tem lugar carinhoso nos meus afetos literários, mas talvez por razões distintas das que o fazem campeão de citações nas redes sociais. E, sorry… não sei explicar isso muito bem.
Clarice é com C.
Eu tive uma fase bem Caio Fernando Abreu. Só que na minha época ele não era um chato de galocha no twitter, orkut e afins. Os primeiros que li dele foram naquela coletânea que foi proibida, por ser “obscena” (Os cem melhores contos brasileiros do século, se não me engano): “Linda, uma história horrível” e “Aqueles dois” (que, se não me engano novamente, está nesse Morangos mofados). “Aqueles dois” está entre meus favoritos, além de “Para uma avenca partindo”, um monólogo-fluxo-de-consciência que me comove sempre que releio.
Abraço!
Lembro de “Aqueles dois”, acho que está em Morangos mofados, sim.