A bibliografia de Bruno Schulz não é muito extensa. Na verdade, não é nada extensa: dois volumes de contos, Lojas de Canela e Sanatório, e uma novela curta, O Cometa. Teria pelo menos mais um romance, não fosse sua morte prematura, devido a uma disputa entre oficiais nazistas que acabaram por matar os ‘judeus pessoais’ um do outro. No entanto o pouco que Schulz deixou já o faz ser considerado como um dos mais importantes escritores do século XX, comparado muitas vezes a Kafka.

Em Sanatório, Schulz faz um registro fantástico de alguns episódios de sua infância que viriam a influenciar sua imaginação e levá-lo a recriar o mundo de modo mitológico. O livro é bem menos fiel à realidade do que seu antecessor, Lojas de Canela (cuja primeira publicação data de 1934, enquanto que Sanatório é de 1937).

Isso, no entanto, é propositado: enquanto o primeiro livro de Schulz eram remanescências de um verão de sua infância, o segundo parece ser uma série de reflexões poéticas a respeito do processo criativo e das atividades de escrever e lembrar.

Não é à toa, então, que os seu primeiro conto seja O livro, que trata justamente sobre os primeiros lampejos criativos da infância e de sua origem- um livro de ares místicos de qual todos os outros- inclusos aí a bíblia e os livros do próprio Schulz- derivam, e com o qual ele teria tido contato através de seu pai que, no entanto, mais tarde negaria ter qualquer conhecimento a respeito. E é esse livro que nos introduz A época genial que intitula o conto seguinte, em que uma era de imaginação e criação quase irrestritas nos são introduzidas.

Em todos os contos esse ar de uma época dourada da criatividade nos acompanha, em alguns momentos bastante de perto, em outros como uma lembrança distante que só pode ser evocada a muito custo e de forma confusa- mas sempre tocada pelas tintas da decadência.

Nem só de criatividade trata o livro, porém. Em Sanatório sob o signo da clepsidra– conto que dá origem ao título- Schulz nos leva até o sanatório onde seu pai esteve internado, uma estrutura autoritária e impositiva, à qual nem mesmo o tempo escapa.

Sanatório é parte substancial da obra de Schulz, não só por representar quase que metade dela, mas também por descrever- ainda que por caminhos tortuosos- como funcionava a criatividade de Schulz.

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