Para qualquer criança uma pequena descoberta como o nome de um inseto, o sabor de uma comida ou a diferença entre manhã e noite pode ser tão gigantesca quanto o tamanho do mundo. Aliás, mundo, grande parte das vezes, é algo que cresce e se transforma diante de olhos pueris. Em Quarto, de Emma Donoghue lançado pela editora Verus, Jack conta a história de seu gigantesco mundo: seu quarto. Não um quarto com dinossauros falantes que o levam para outro mundo, longe disso, é um simples quarto que divide com sua mãe e que tem tudo que eles precisam desde um vaso sanitário até uma televisão. De acordo com a mãe de Jack, aquele aparelho que exibe as aventuras de Dora não passa de um mundo de mentirinha.

Quando ouvi falar a primeira vez desse livro achei a sinopse cativante e me interessei, acreditei veemente que era um daqueles exemplares que passam batidos nas prateleiras e que poucas pessoas realmente vão atrás. Ao pegá-lo nas minhas mãos notei que fora do Brasil, o livro de Emma Donoghue é um tremendo sucesso de crítica e, após lê-lo, não vejo porque seria diferente. A narrativa prende e é difícil de explicar o porquê, muito provável que a realidade vista pelos olhos de Jack – tão sem mácula – contrasta com aquilo que está realmente acontecendo e que de antemão o leitor já consegue perceber que esse quarto é um cativeiro e nem as maiores verdades fantasiosas do menino de cinco anos podem nos afastar de algo tão pertubador.

O “Velho Nick” é uma peça chave para a história de Jack começar a perturbar. O menino dorme dentro do armário e durante a noite ouve a cama ranger, mas nunca consegue ter uma visão completa do velho – se é que é velho mesmo e se é que se chama Nick, pois sua mãe só se refere a ele como ele. Juntando todos esses elementos não é de se surpreender do que realmente se trata a história e como o mundo de Jack mudará drasticamente quando o plano de sua mãe finalmente der certo. O que há lá fora, a nova realidade, o novo mundo, será tão chocante e perturbador quanto o que o leitor apenas suspeitava dentro do quarto onde viviam mãe e filho.

Outro ponto interessante a ser levado em consideração é se realmente se consegue superar um trauma de anos e quais são os limites de crueldade que alguém consegue ultrapassar por sete anos. Acompanhar toda uma história de malevolência, estupros e sequestro pelos olhos de uma criança que não sabe o que está acontecendo é sim realmente chocante, porém é mais forte ainda o que se encontra do lado de fora.

Não é necessário dizer muito mais além disso, Quarto é uma experiência maravilhosa do começo ao fim, prende, emociona e tensiona o leitor ao limite e, para melhor ou pior, não é tão fácil de se ignorar que realmente parece o depoimento de um garoto de cinco anos, o que só torna a leitura ambivalente: prazeroza, mas aterrorizante.