Um homem para quem, aparentemente, abandonar o quarto é um suplício. É lá seu refúgio, em um mundo eternamente escuro e invernal, onde mesmo uma manhã de verão é apenas um preparativo para a decadência presente em seu exato oposto. Um burocrata, pouco afeito à vida social e adoentado.  Não se trata de uma personagem (como não imaginar tal figura em um conto de Kafka ou um romance de Dostoievski?), mas de uma pessoa real: o poeta romeno George Bacovia.

Enquanto viveu foi considerado um poeta menor, encaixado no simbolismo e lá esquecido. Só depois de sua morte é que foi resgatado e passou a ser considerado um dos grandes nomes da poesia romena do século XX – e de todos os tempos.

Plumb, palavra romena para Chumbo, é o título de seu primeiro livro e, também, o título dessa antologia bilíngue (romeno-português) que abarca todos os momentos de sua obra. A edição que tive a oportunidade de ler foi publicada em 1983 pela editora Minerva, na capital romena Bucareste – traduzido por Micaela Ghițescu e com um prefácio de Marian Popa.

Se uma antologia que tenta ser tão abrangente tem a desvantagem de incluir relativamente poucos poemas de cada um dos livros publicados pelo autor, a vantagem é que a evolução formal e temática dos poemas é facilmente verificável. Se nos primeiros poemas podemos, quase que com perfeição, identificar os principais aspectos de um simbolismo à francesa, o avançar cronológico leva a recortes mais modernistas e, em alguns momentos, francamente opostos ao que existia no começo: as formas tornam-se mais voláteis, as imagens mais cruas.

Algumas coisas, porém, são constantes. Desde o começo pode-se sentir certa inquietação do eu lírico do poeta, o que se torna mais patente nos poemas escritos depois da Segunda Guerra Mundial. Algumas imagens – como o Outono e a chuva – aparecem de maneira quase obsessiva, repetidas em toda a obra de Bacovia.

O livro, infelizmente, não é fácil de se encontrar: consegui esse exemplar em uma biblioteca e não o encontro em nenhum outro lugar. O que é uma pena, já que Bacovia é um dos maiores poetas de língua romena e o romeno, justamente, é o parente mais distante e esquecido do português – o que de modo algum significa que não existam semelhanças e influências mútuas tanto nos idiomas quanto nas literaturas desses dois (ou mais, se dividirmos da justa maneira as áreas em que o português é a língua dominante) universos linguísticos e culturais.