Nos últimos tempos, ando entusiasmado demais com um gênero muito específico de filmes: giallo. Não muitos conhecem essas obras do cinema italiano que até hoje têm um caráter duvidoso, sendo ridicularizadas por uns e exaltadas por outros. Os motivos para isso são vários: desde os primeiros filmes, rodados na década de 1960, estabeleceu-se como parâmetro para sua criação a ficção pulp italiana. Os enredos não são, de fato, muito elaborados, com muitas falhas de coerência narrativa, porém a trilha sonora, a fotografia e a montagem das películas parecem querer exaltar a dramaticidade e o suspense que já havia nos livros.
O primeiro giallo teria sido La ragazza che sapeva troppo (1963), de Mario Bava, um dos diretores mais prolíficos do gênero. O título é uma clara referência ao clássico The man who knew too much (1956), de Alfred Hitchcock, provavelmente uma das figuras mais presentes no imaginário dos diretores da época. A diferença desse filme de Bava e dos seguintes em relação ao suspense britânico e hollywoodiano é justamente o fato de deixar um pouco de lado a trama em si para explorá-la mais audiovisualmente, talvez. A obra pioneira de Bava, ainda em preto-e-branco, já evidencia sua preocupação extrema com a fotografia, apesar dos baixos orçamentos da época, o que seria levado ao extremo em Sei donne per l’assassino (1964), como pode se perceber desde a abertura do filme.
Além da intensidade das cores, também se nota nessa apresentação dos atores a presença da trama do filme (assassinatos em uma casa de modelos) e da música-tema, de Carlo Rustichelli. É uma característica de vários gialli essa exploração intensa de trilha sonora, muitas vezes criada por grandes nomes como Ennio Morricone e Bruno Nicolai, que às vezes trabalhavam com instrumentação e vocais muito especiais em suas composições, como na trilha de La coda dello scorpione (1971). Muito do suspense desses filmes é construído por uma associação entre luz bem dirigida, música e montagem inusitada. Ainda que não fossem filmes autorais, voltados para a intensa distribuição na Itália e no mundo, muitas vezes com dublagens de caráter duvidoso, observa-se facilmente que várias obras foram muito bem dirigidas.
É claro que essa não é uma regra; não faltam exemplos de gialli cujo cuidado com a trilha sonora e a fotografia foi inútil devido a uma péssima direção de atores. Isso se torna mais impressionante quando lembramos do fato de que muitos diretores trabalhavam quase sempre com os mesmos atores, como Edwige Fenech, George Hilton, Carroll Baker, Anita Strindberg, Florinda Bolkan e outros. As mulheres em especial pareciam ser escolhidas apenas pelo potencial apelo erótico, já que a maior parte dos gialli apresentavam cenas de nudez frontal e sexo, o que os levou a serem censurados em alguns países quando o gênero se tornou mais conhecido fora da Itália.
Ao longo das décadas de 1960 e 1970, o giallo se estabelece no mercado cinematográfico, sendo que alguns diretores italianos como Sergio Martino, Umberto Lenzi, Dario Argento, Lucio Fulci e o próprio Bava passam a se dedicar exclusivamente ao gênero por um bom tempo. Algumas de suas obras, além das citadas, são ótimas representantes da época, com títulos enigmáticos como L’uccello dalle piume di cristallo (1970), de Argento, Tutti i colori del buio (1972), de Martino, Una lucertola con la pelle di donna (1971), de Fulci, e Perché quelle strane gocce di sangue sul corpo de Jennifer? (1972), de Giuliano Carnimeo. Apesar de todas as críticas a eles, acredito que podem surpreender vários por sua estética muito especial.
Gostaria de deixar somente um comentário sobre a origem do termo giallo, na Itália no começo do seculo 20 a editora Mondadori publicava seus romances policiais em edições com a capa amarela (giallo em italiano) assim com o tempo todo romance policial passou a ser chamado de giallo, termo que foi levado depois para o cinema.
E eu achava que essas frescuras eram só para os filmes Noir (o qual temos três textos sobre o assunto). Isso seria uma boa para fazer um apanhado sobre Noir e Giallo. 😉