Antônio Xerxenesky é um porto-alegrense nascido no fim de 1984. Publicou o livro de contos Entre (Fumproate/Ed. Movimento) e outras narrativas curtas em antologias e revistas. Seu conto O desvio (publicado em Ficção de Polpa, vol. 1) foi adaptado para a tevê por Fernando Mantelli em 2007. Areia nos Dentes é seu primeiro romance.

01. Como surgiu a idéia para Areia nos Dentes? Além de se inspirar em faroeste (chega até a citar Sérgio Leone), de onde surgiu a idéia de somar o velho Oeste Mexicano com Zumbis?

Em primeiro lugar, foi uma maneira de unir dois gêneros fundamentais na minha formação de cinéfilo, o western e o horror. Mas não é uma ideia, digamos, original. Ela surgiu de um videogame. Dá para acreditar? Bom, para quem me conhece dá, pois só um radical defensor dos videogames como forma de expressão artística. Teve um jogo que muito me marcou: Alone in the Dark 3. Faroeste com zumbis. Realmente não existe originalidade nesse mundo!
Mas, claro, isso é só a superfície. Usei essa premissa sensacionalista como um veículo para que eu pudesse expressar algumas inquietações paralelas, no caso, o drama da “necessidade de matar o pai”. Ao colocar um conflito freudiano no meio de um faroeste spaghetti acabo brincando com as fronteiras em alta e baixa cultura, que sempre foi um dos meus projetos como escritor.

02. Você gostaria de ver seu livro adaptado para as telas? Se, sim, quem seria o diretor?

Pois, não sei se o livro renderia uma boa adaptação para o cinema. Há muita metalinguagem e artifícios literários que funcionam apenas na narrativa literária. Se alguém fosse adaptar para o cinema, gostaria que o diretor fizesse uma adaptação muito infiel, mais calcada nas imagens do que no texto. De brasileiros, acho que apenas o Mojica faria um trabalho interessante. De estrangeiros, poxa, são tantos. O Danny Boyle e o Alex de la Iglesia fariam trabalhos incríveis, pois estão acostumados a trabalhar com o cinema de gênero – hibridizando e pervertendo os gêneros.

03. Quais seus filmes de Zumbis favoritos?

Dos clássicos, acho que a obra fundadora “A Noite dos Mortos-Vivos” do George Romero é imbatível. Gosto muito também do “Fome Animal”, do Peter Jackson, “Zombie” do Fulci, e, dos que desrespeitam as regras clássicas dos zumbis, sou fã de “Extermínio” do Danny Boyle.

04. O que significa ser editor para você?

Uma oportunidade de publicar e ajudar muitos novos escritores legais que não receberiam uma edição decente se não fossem editoras independentes como a Não Editora.

05. Qual o critério de uma editora independente para a seleção das obras que publica?

A Não Editora não possui regras fixas ou um eixo temático definido. Gostamos de publicar coisas muito diferentes, de um romance de fortes tons realistas a um livro de contos fantásticos. Tornamos nossa falta de homogeneidade estilística e temática um símbolo da nova geração literária, que abarca escritores produzindo obras muito, muito diversas.

06. O que chama a atenção pra algo novo ser considerado bom, ou pelo menos, publicável?

Novamente, não há algo especial que nos salte aos olhos. Eu, pessoalmente, gosto de sentir que o escritor, além de escritor, é um grande leitor. Isso se sente na prosa, em cada linha escrita.

07. Quais dicas você daria a um escritor iniciante? Escrever, no Brasil, vale a pena?

Vale a pena em que sentido? Financeiro? De jeito nenhum. Pelo glamour? Mais fácil tentar o Big Brother. Quem escreve deve escrever porque sente vontade, pulsão criativa, sei lá. A única dica possível para um escritor iniciante é que leia, leia muito, e não só os clássicos e obras que todos já aceitam como boas. Ler literatura contemporânea, do Brasil, do Japão, seja lá da onde for. E não só literatura: filosofia, sociologia, física. Que leia. Todo material intelectual é útil para escrita, tudo ajuda a formar o escritor. Claro, experiência de vida também é importante, mas essa é outra história.

08. Quais livros da contemporaneidade, que geralmente são ignorados, poderiam se tornar clássicos no futuro (visando o cenário dos últimos quinze anos)?

Eu não me interesso muito pelos livros de hoje que certamente se tornarão clássicos. Há livros do Saramago e do García Márquez que com certeza serão canonizados, e esses dois escritores não me dizem quase nada. Mas, por outro lado, não consigo pensar em nenhum autor ignorado que eu seja fã. Meus favoritos todos receberam um bom reconhecimento da crítica: Roberto Bolaño, Enrique Vila-Matas, J.M. Coetzee, Thomas Pynchon, David Foster Wallace… Talvez não virem leituras obrigatórias do colégio, mas são bem lidos e possuem ampla fortuna crítica, ainda que fora do Brasil.

09. Qual o último livro que te tirou o sono? Por que? E qual o último livro que te deu sono?

Diário de um Ano Ruim, do J.M. Coetzee. Sempre foi moda dizer que o relevante da literatura é a forma, que interessa apenas a estética, e eu muitas vezes concordei em silêncio com isso. O choque de ler esse romance-ensaio do Coetzee é que é um livro com muito o que dizer. Me tirou o sono e me fez rever algumas posições.
Já livro que me deu sono… Ih, é até vergonhoso confessar, mas não consegui ler “Os anéis de saturno” do Sebald. Chatice sem limites.

10.O que você pensa sobre o download gratuito de livros (como o Neil Gaiman costuma fazer com os dele vez ou outra)? Que relação você vê entre internet e as editoras independentes?

Poxa vida, esse assunto é complicado. Não tenho ilusões de que o livro-papel continuará existindo e vendendo por muitas décadas. Mas, por enquanto, se tratando de editoras publicando livros online, a questão ainda é complicada no sentido de que quase ninguém no país tem leitor de e-books, e muitos detestam ler na tela do computador. As grandes editoras daqui tampouco estão publicando online, ou seja, você não vai ler o livro novo do Bernardo Carvalho no seu iPhone. A impressão que dá, por enquanto, é que textos que saem apenas na internet não possuem muito mérito artístico, como se a seleção, por não ter dinheiro envolvido, fosse mais relaxada. E talvez até seja, já que é muito mais fácil publicar um livro online do que no papel. Não sei, ainda não tenho muitas opiniões definitivas sobre o tema. Acho que é o futuro, mas um futuro ainda distante da nossa realidade.

Meia: “Se eu fosse Clint Eastwood, atiraria…”

Em todos os “inimigos do literário”. Todos aqueles que, como diria Vila-Matas, são pessoas “achatadas pela realidade”. Incapazes de se comover com ficções, com narrativas, preocupados com um mundo prático e utilitário. Nossa, seria um fuzilamento.

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Meia Palavra agradece Antônio pela imensa atenção que deu para nós.

Os créditos da foto são para André Hilgert.

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