A República Tcheca é mundialmente famosa por suas cervejas e por sua literatura.

Com o crescimento que o mercado de cervejas vem tendo no Brasil, acho que pelo menos a Budweiser  (a de verdade, não norte-americana) a maioria das pessoas deve conhecer. Considerando que essa coisa de cervejas importadas é algo para qual o público de nosso país tem se aberto apenas mais recentemente, acho que já é um saldo positivo.

Mas, como de praxe, a literatura acaba sendo preterida por aqui, e de todo o gigantesco universo literário que a República Tcheca possuiu, só uma ínfima parte foi publicada. E do que foi publicado aqui, ainda menos é conhecido. Eu diria que, basicamente, dois autores estão bem difundidos: Franz Kakfa e Milan Kundera. Kafka escreve em alemão, vou contar fora. Ficamos, então, só com Kundera.

É claro que existem outros autores de língua tcheca que saíram no Brasil. Bohuil Hrabal, Ivan Klíma, Václav Havel, Vladimír Škutina, Jaroslav Hašek e Karel Čapek, por exemplo. O problema é que, além de eles não serem muito difundidos, ainda é pouco: não só são poucas obras de cada um, muitas em edições esgotadas, quando existe uma infinidade de autores que são extremamente representativos no universo letrado tcheco e que inexistem no Brasil.

Vou fazer aqui um breve apanhado de algumas obras que, penso, não poderiam faltar nas livrarias de nenhum lugar do mundo – e que, no entanto, faltam por aqui. Limitar-me-ei, porém, a obras dos séculos XX e XXI e cujos autores sejam inéditos no Brasil.

Noc s Hamletem (Noite com Hamlet), de Vladimír Houlan– Houlan foi um dos principais poetas tchecos depois da Segunda Guerra. Utilizando imagens e linguagem obscuras em seus poemas, ele é um tanto quanto pessimista e enigmático – mas nem por isso menos hedonista. Cito esse livro, de 1964, apenas porque o poema que lhe empresta o título é, provavelmente, o poema em tcheco mais traduzido de todos os tempos. O que não tornaria, é claro, a publicação de outras obras – tanto poéticas quanto em prosa – menos interessante.

Život s hvězdou (Vida com estrela), de Jiří Weil– Phillip Roth considera esse livro um dos melhores relatos sobre a vida dos judeus sob a dominação Nazista. Baseado no que o próprio Weil passou durante a Guerra, o livro (e todo o resto de sua obra) foram banidos da República Tcheca durante os piores anos do comunismo, pois foi considerado subversivo demais pela sua riqueza reflexiva. Uma obra profunda e terrível, que se destaca em meio à infinidade de coisas escritas sobre o mesmo tema.

Půlnoční pacient (Paciente da Meia-Noite), de Egon Hostovský– Em uma obra carregada de influências expressionistas, um psiquiatra atende um paciente que só pode vir à meia-noite, pois seu emprego assim o exige: trabalha como espião. Hostovský, parente do escritor austríaco Stephan Zweig, constrói um universo confuso com uma linguagem igualmente confusa, em que busca refletir o estado em que o mundo encontrava-se durante a Guerra Fria.

Němá barikáda (Barricada muda), de Jan Drda– Apesar de Drda ter sido membro do Partido Comunista da Tchecoslováquia e de ter sido o diretor da União dos Escritores Tchecoeslovacos, seu livro pode ser encarado como uma crítica velada ao regime que dominava seu país. Em  Němá barikáda ele conta a história da resistência contra os invasores nazistas, em um mundo cinzento, opressivo e coletivizado.

Modlitba pro Kateřinu Horovitzovou (Uma oração para Katerine Horovitz), de Arnošt Lustig– Mais um judeu sobrevivente do Holocausto. Em Modlitba pro Kateřinu Horovitzovou, Lustig conta duas histórias paralelas: uma sobre alguns empresários judeus que são capturados e mortos pelos nazistas na ilha italiana da Sicília; a outra é sobre o destino de uma judia polonesa que, quando estava prestes a entrar na câmara de gás em Auschwitz, saca uma arma, mata um oficial nazista e tenta escapar.

Rok kohouta (O ano do galo), de Tereza Boučkova– Uma autora mais recente do que todos os outros que eu citei, Tereza Boučkova pertence ao que é conhecido como ‘literatura fato’ – um gênero próximo ao jornalismo literário, e que se tornou bastante grande na Europa Centro-Oriental pós-Guerra Fria. Em Rok kohouta Boučkova, conta sua experiência ao adotar uma criança cigana – levantando questões sociais e étnicas ainda bastante presentes naquela parte da Europa.

Osmý… čili nedokončený životopis (Oitenta… ou ainda uma bioagrafia não completa), de Ota Filip– Autor exilado desde 1974, que somente retornou ao país com a queda do regime comunista. Mais um adepto da literatura fato, narra suas experiências no exército tcheco – tendo sido enviado em missões punitivas, sua prisão depois da Primavera de Praga, seu exílio e seu retorno ao país.